“Eles têm a sensação de que a violência contra nossos corpos é algo legitimado”, diz presidenta da ABGLT

Simmy Larrat acredita o maior desafio da escalada de violência que o Brasil vive hoje é não se encastelar em seu próprio medo
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Para Simmy Larrat o maior desafio da escalada de violência que o Brasil vive hoje é não se encastelar em seu próprio medo

 

Por Nadine Nascimento
Da Página do MST

 

Registros de violações contra negros, mulheres e pessoas LGBT  têm crescido desde o caso emblemático do capoeirista Moa do Katendê, esfaqueado e morto no início do mês por dizer que era contra o candidato do PSL à presidência.

A jovem de 19 anos que usava uma camiseta do movimento “EleNão que foi agredida por três homens em Porto Alegre; o estudante da UFPR (Universidade Federal do Paraná) com boné do MST que foi agredido por um grupo que gritava “Aqui é Bolsonaro!”; a travesti esfaqueada por cerca de cinco homens no Centro de São Paulo, enquanto gritavam “Bolsonaro” e “ele sim”; são alguns exemplos da escalada de violência que presenciamos no país no último período.

“Eles passaram a ter a sensação de que a violência contra nossos corpos é algo legitimado. Essas pessoas não acreditam que estão violentando alguém, elas acham que estão eliminando o mal da sociedade. Nós que somos ‘ousadas’ demais por achar que podemos andar livres nas ruas”, pontua Simmy, presidenta da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), enquanto participava do IV Curso LGBT Sem Terra. 

Em sua opinião, o principal desafio da população LGBT, com o avanço do fascismo, será “não se encastelar por causa do medo e conseguir avançar no processo organizacional”.

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Disputa de sociedade 

Nascida em Belém do Pará, Simmy foi a primeira travesti coordenadora-geral de Promoção dos Direitos LGBT da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República durante o governo de Dilma Rousseff. Ela coordenou também o programa Transcidadania, na gestão Fernando Haddad na prefeitura de São Paulo, que foi o maior programa da América Latina específico para a população de travestis e transexuais. 

Em sua opinião, os direitos da população LGBT dos quais o PT diz ter assegurado, como no caso do programa Transcidadania, são políticas públicas frágeis que podem ser retiradas “num piscar de olhos”, e por isso a importância de, em um governo Haddad, os direitos serem assegurados através de legislações.

Segundo a presidenta da ABGLT, a direita não consegue negar os avanços dos governos petista e, portanto, passou a utilizar o discurso moral para disputar o eleitorado. “Eles [a direita] perceberam que uma disputa moral polarizaria a sociedade, e estão conseguindo fazer isso. E não é só uma disputa moral, ela vem acompanhada de uma tentativa de acabar com os direito sociais, de privatizações, de entrega de nossas riquezas ao capital estrangeiro. Todo um pacote de retrocessos e a legitimação da violência”, analisa.

A “pauta moral” a que Simmy se refere está relacionada a temas como o “Kit Gay”, apelido dado ao projeto &”39;Escola sem homofobia&”39;, que foi amplamente utilizado na campanha de Jair Bolsonaro contra a candidatura de Haddad. O objetivo do projeto, que não foi implementado, é oferecer formação aos professores para lidarem com os direitos LGBT e o respeito à diversidade entre os jovens e adolescentes. De forma alguma propunha “sexualizar as crianças” e “ensinar a ideologia de gênero nas escolas do Brasil”, como afirmava Bolsonaro.

Para Simmy, o PT conseguiu realizar avanços sociais importantes, mas não soube fazer a disputa da sociedade e, por isso, enfrenta dificuldades eleitorais atualmente. “Nós levamos tudo para os acordos, abandonamos as periferias, que são ocupadas pelas igrejas neopentecostais. A gente não disputou politicamente a sociedade. Não conquistamos corações e mentes”, avalia. Para ela, quando o candidato da extrema-direita diz que irá trazer de volta os valores de família e a segurança para o país, é que conquista o respaldo para seu discurso de ódio.

*Editado por Maura Silva