Pará: Milícias armadas e a ameaça no campo

Financiamento de grupos armados está diretamente ligado ao aumento de crimes contra Sem Terra no estado

 

Por Maura Silva
Da Página do MST

 

Não é de hoje que os conflitos por terra no Pará chamam atenção. O estado lidera o número de assassinatos agrários no Brasil.

Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ao todo, até o fim de 2017, o país registrou 45 massacres e mais de 200 mortes, em 32 anos. Só no Pará ocorreram 26 massacres com 125 pessoas assassinadas.

No meio desse cenário um novo tipo de crime chama atenção devido as recentes prisões e condenações, é o financiamento de milícias por latifundiários.

O caso do  fazendeiro José Edmundo Ortiz Vergolino, mandante da Chacina da Fazenda Ubá, ocorrida em 1985, no município de São João do Araguaia, no sudeste do Pará é um exemplo do uso histórico desses grupos armados no estado.

Na ocasião, oito trabalhadores rurais, entre eles uma mulher grávida, foram covardemente assassinados. 

Vergolino, que já ocupou o cargo de prefeito de Marabá nos anos 60, foi preso e condenado a 152 anos de prisão no dia 24 de janeiro. Anteriormente o fazendeiro  já havia sido  preso e cumpriu pena em 2006, no presídio de Marabá, no entanto, teve prisão domiciliar concedida. No ano seguinte, em 2007, teve liberdade provisória concedida pelas as Câmaras Criminais Reunidas.

Milícias 

A condenação de Virgulino aconteceu no mesmo dia em que pecuaristas fizeram uma manifestação em Marabá cobrando mais rigor contra as ocupações de Sem Terra. Dias antes, uma operação de combate à milicia no Pará foi realizada pela  Polícia Civil. No total, foram expedidos pela Justiça 23 mandados de prisão preventiva para o combate à grupos armados e milícias.

Para o deputado estadual Carlos Bordalo (PT) que acompanha de perto as investigações, a atuação do estado, pelo menos nesse primeiro momento, é de enfrentamento às milícias.  

“Eu considero que as novas atitudes do governo paraense tem sido animadoras. Esses grupos criminosos não são mais estado paralelo, eles já estão misturados com a estrutura do estado. E eu saúdo as últimas operações que culminaram em prisões e condenações,  mas é revelador o quanto os movimentos populares estão em risco. Quando falamos criminalização, isso não é apenas uma mera formulação jurídica. A criminalização se manifesta em descobertas como essas que estamos vendo. Esse tipo de grupo é o mesmo da chacina de Pau d’Arco, que aconteceu em 2017, são agentes do estado, usando aparatos do estado, contratados por latifundiários para ameaçar, coagir e até matar”, afirma.

Bordalo também chama atenção para os interesses na região que, segundo ele, vão muito além da terra. Eles têm interesse na desapropriação do solo e também subsolo.

“Essa região é de muito minério, hoje em dia, os conflitos no sudeste paraense, em especial, têm como mote principal não a terra, mas o subsolo para extração. Esse é o caso da fazenda Santa Lucia, no que ficou conhecido como a chacina de Pau D&”39;Arco. Nos cabe ficar vigilantes e exigir do estado investigação e monitoramento dessa situação. Não pode ser tolerável que alguém possa agir fora da lei, que se utilize de práticas criminosas para afrontar o estado de direito, contra trabalhadores e trabalhadoras rurais que vivem em situação tão frágil e de vulnerabilidade. Ainda mais agora em um período em que a flexibilização do porte e uso de armas será garantido”, concluí. 

 

Na mesma linha, a CPT afirmou em nota que: “há muito, as entidades da sociedade civil com atuação voltada ao monitoramento e acompanhamento de conflitos fundiários no campo vêm denunciando publicamente a atuação de milicianos financiados por latifundiários, com objetivo de aterrorizar a vida de trabalhadores/as rurais, sobretudo, aqueles que se encontram em situação de acampamento ou em ocupações nas áreas rurais no sudeste do estado; região que concentra o maior número de conflitos e assassinatos no campo no Pará e no Brasil”.

A entidade também anunciou que um dossiê completo dos recentes casos envolvendo ações de grupos paralelos será enviado para o Conselho Nacional de Defesa dos Direitos Humanos (CNDH), Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) e para o Secretário de Segurança Pública do Pará (Wallame Fialho Filho), entre outros, requerendo o monitoramento do inquérito e da ação penal que será aberta para julgamento dos crimes praticados por milícias.