Arquiteto do Massacre de Felisburgo é condenado a 195 anos de prisão

Calixto andava com cheques em branco assinados por seu primo Chafik, mandante do massacre, para fazer todos os “negócios”
BdF [32].jpg
Defesa do arquiteto do massacre de Felisburgo tentou argumentar em nome da tradição, família e propriedade – Foto: Geanini Hackbardt

Por Geanini Hackbardt
Da Página do MST

Calixto Luedy, ex-policial, foi a júri popular na segunda-feira (13), no Fórum Lafayete, em Belo Horizonte. Ele foi responsável por contratar pistoleiros, fazer ameaças aos trabalhadores rurais e comandar a chacina que deixou 5 mortos e 12 feridos no acampamento Terra Prometida, município de Felisburgo, em Minas Gerais.

Além dos assassinatos, ele também foi condenado por atear fogo na escola e nas casas das famílias acampadas. Calixto passou mais de dez anos foragido da polícia até ser preso em 2015, em Aracaju (SE).

Durante o interrogatório, Calixto Luedy Filho negou qualquer participação nos crimes. Disse que estava em Aracaju na data do massacre e que não era proprietário de “nenhum palmo de terra naquela fazenda”. Calixto também afirmou que estava doente, no entanto, não houve nenhuma comprovação dos álibis apresentados.

O julgamento

A defesa de Calixto insistiu na inocência do réu. Seus três advogados navegaram em oratórias extensas e cínicas diante de uma plateia de mais de 200 Sem Terra e 10 integrantes da família do criminoso. Em meio aos discursos, fizeram uma boa defesa da tradição, família e propriedade. Um deles declarou que havia se casado com uma integrante da família Luedy e que tinha “o dever de manter o nome da família limpo”. Em outro momento, passagens da bíblia foram recurso para insinuar que Calixto seria condenado injustamente como Jesus Cristo.

“Agora as coisas vão melhorar, por que as leis serão cumpridas na defesa da propriedade privada”, afirmaram, fazendo alusão às declarações criminosas do atual presidente do Brasil. Toda a defesa se embasou em negar as investigações da polícia, os depoimentos e autos do processo, que comprovavam a participação direta de Calixto no massacre.

Já a acusação feita pelo Ministério Público utilizou os depoimentos, que reiteravam o papel do réu como articulador e executor do massacre. “Aqui a questão não é se alguém é de esquerda ou de direita, se é Sem Terra ou não. Houve um crime, temos inúmeras provas dos culpados e há leis que precisam ser aplicadas”, destacou o promotor Christiano Gonzaga, durante o julgamento.

O promotor ainda complementou: “É bom que a gente explique terra devoluta é terra pública, e não pode haver nenhum tipo de discussão em relação à posse. Na verdade, o que havia ali era uma grilagem, estamos falando de grileiros de terra. E os Sem Terra estavam ocupando a terra para a reforma agrária, não era nada de invasão, enfim, de crime”, afirmou.

Um dos coordenadores do acampamento na época, Jorge reiterou a participação de Calixto em seu depoimento. “Alguns estavam encapuzados, outros não. O Calixto, inclusive, estava na frente e o Adriano mais atrás. Ele estava de cara limpa”, relembrou. Nos depoimentos, os próprios pistoleiros contratados por Calixto e até seu primo e mandante, Chafik, o acusaram de arquitetar o massacre. Segundo eles, Calixto andava com o talão de cheques do primo, com folhas assinadas, para fazer negócios.

Adriano Chafik foi condenado a 115 anos de prisão em 2013 e continua preso. Washington Agostinho da Silva, pistoleiro, cumpre pena de 97 anos de prisão. Em 2014, Francisco de Assis Rodrigues de Oliveira e Milton Francisco de Souza também foram condenados, ambos a 102 anos e 6 meses de reclusão. Admilson Rodrigues Lima, outro pistoleiro, faleceu durante a apuração do crime. Ainda faltam nove réus a serem julgados.

Entenda o caso

A Fazenda Nova Alegria foi ocupada em maio de 2002, por cerca de 230 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). A ocupação foi realizada para pressionar o governo a desapropriar as terras que não cumpriam função social.

Chafik, suposto proprietário da fazenda, entrou com uma liminar de despejo na justiça. Porém o antigo Instituto de Terras de Minas Gerais (ITER) decretou que 567 hectares pertenciam ao Estado.
Adriano Chafik Luedy e seu primo Calixto Luedy passaram dois anos ameaçando e coagindo as famílias Sem Terra. Após ter o pedido de despejo negado, eles começaram a planejar o massacre e, em 20 de novembro de 2004, Dia da Consciência Negra, eles executaram seus planos. Foram assassinados Iraguiar Ferreira da Silva, 23 anos; Miguel José dos Santos, 56 anos; Juvenal Jorge da Silva, 65 anos; Francisco Ferreira Nascimento, 72 anos; e Joaquim José dos Santos, 48 anos.

Atualmente o acampamento resiste no mesmo local e produz alimentos saudáveis que são comercializados na região. Maíra Gomes, que presenciou o massacre e viu o pai ser baleado, lembrou aos presentes: “Se a gente deixa a terra e desiste da luta, então estaríamos dando o que eles queriam quando pensaram todo o massacre. Por isso é tão importante continuar o acampamento e por isso a gente resiste”.