Cacau e chocolate agroecológico: conheça a produção que cresce no norte do país

Produzido em comunidades indígenas, assentamentos e quilombos, o cacau se transforma em chocolate de alta qualidade
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Amêndoas de cacau fermentado e torrado, as chamadas nibs de cacau / Pixabay

Por Luciana Console
Do Brasil de Fato

 

O Brasil é um dos maiores produtores de cacau no mundo e é no Norte e no Nordeste que se concentram as plantações da semente, cujo principal derivado é o chocolate. Mas não é qualquer chocolate. A produção do alimento na forma agroecológica aumentou na região nos últimos anos. Só no sul da Bahia, são cerca de 40 marcas de chocolate artesanal e agroecológico.
 

A produção do cacau no assentamento Dois Riachões, localizado no Baixo Sul do estado, é um exemplo disso. O produtor Luciano Silva conta que antes de ser ocupada pelos agricultores, em 2007, a região funcionava como plantação de cacau na forma convencional. Após o trabalho inicial de desenvolvimento agroecológico no local, os agricultores se articularam com outros produtores da agricultura familiar e assentados da reforma agrária e criaram a Rede de Agroecologia Povos da Mata. Comunidades indígenas e quilombolas também fazem parte da Rede, que atua na certificação orgânica dos produtos. A produção do cacau agroecológico começou a partir daí, em 2016.
 

“A gente tem um trabalho com o cacau agroecológico certificado, ele tem a certificação do Orgânico Brasil, que é a participativa, tem a Ecocert, que é internacional e nós somos a primeira fortaleza de cacau cabruca no mundo reconhecida pelo movimento Slow Food, que é um movimento internacional que trabalha com alimentos bons, limpos e justos e que valoriza as comunidades da produção tradicional e de alimentos sustentáveis”.
 

A coordenadora do Movimento Slow Food na região Nordeste, Revecca Tapie, explica que a plantação da semente na forma agroecológica é conhecida como cabruca, que significa “abrir a mata”. A técnica consiste em plantar os cacaueiros no meio da floresta em completa harmonia com a Mata Atlântica, de forma que não seja necessário o uso de pesticidas para controle de pragas. Neste sentido, o modelo também foi responsável por restaurar a produção de cacau na região, que sofreu uma grave crise nos últimos anos devido a infestação da vassoura-de-bruxa, praga comum nesse tipo de plantação.
 

Além do cultivo do cacau na forma cabruca, diversas marcas da região compram a semente como matéria-prima para a produção de chocolates de qualidade, puros e que não prejudicam o meio ambiente, conta Revecca.
 

“Este processamento tem sido à partir de 60% que é o cacau puro, não tem adição de leite. Tem muitas iniciativas que já não usam mais a lecitina de soja, porque ela já vem com o reflexo de agrotóxico. Então tem produtor que está usando a lecitina de girassol ou açúcar de coco”.
 

Apesar da qualidade, Revecca explica que o grande desafio é a competição com as grandes marcas, principalmente devido ao valor mais elevado do produto agroecológico. A saída encontrada pelos produtores foi promover a diferença entre os chocolates e a conscientização sobre a qualidade do cacau totalmente puro. A Slow Food entra nessa parte, com projetos locais, como é o caso do Fortaleza Slow Food, na Bahia.

Luciano explica que a união entre os produtores nas cooperativas também é outro fator de grande importância para manter a produção agroecológica funcionando e garantir competitividade e espaço no mercado.
 

“A gente compreende que se a gente fazer uma escala maior de produção de produtos agroecológicos, a gente consegue baratear cada vez mais esse produto, porque a gente vê que a alimentação saudável é um direito das populações. É um direito que o povo trabalhador deve ter para consumir este produto, então a gente faz um produto diferenciado e de forma coletiva a gente vai criando mecanismo para que esse produto não encareça no seu processo, nem na produção nem no transporte e comercialização”.
 

Segundo Luciano, a Rede de Agroecologia Povos da Mata busca sempre novos agricultores na região para somar na cooperativa e aumentar o desenvolvimento agroecológico do cacau nos territórios ameaçados pelo agronegócio.
 

A conscientização também entra quando o assunto é a escolha do comprador. O agricultor afirma que o cacau que eles produzem não é vendido para as multinacionais e nem passa pelos chamados “atravessadores”, pessoas responsáveis por intermediar a venda.
 

A marca AMMA é uma das que trabalham com o cacau cabruca, assim como o chocolate Terra Vista, do Assentamento de mesmo nome. A Cooperativa da Agricultura Familiar e Economia Solidária da Bacia do Rio Salgado e Adjacências (COOPFESBA) é responsável pelo Bahia Cacau. Além dessas, diversas outras marcas compram o chocolate orgânico das cooperativas.

 

*Edição: Michele Carvalho/ Brasil de Fato