Seminário discute 31 anos da Constituição de 1988 e denuncia desmonte de direitos

Debate aconteceu Escola Nacional Florestan Fernandes na manhã deste sábado (5), durante o Festival Sigmaringa Seixas
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Direitos constitucionais estão ameaças com políticas adotadas pelo governo Bolsonaro / Foto: Bárbara Vida

Do Brasil de Fato

Há 31 anos, em 5 de outubro de 1988, era promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil. A “Constituição Cidadã”, como foi batizada por Ulysses Guimarães, então deputado federal e presidente da Assembleia Nacional Constituinte, foi concebida no processo de redemocratização de um país que havia acabado de deixar para trás os 21 anos sombrios da ditadura militar.
 

A importância do ordenamento jurídico fundamental para a garantia do Estado Democrático de Direito, assim como as lacunas históricas para sua implementação efetiva, foram os temas do seminário “Brasil na Constituição Federal de 1988″, realizado na manhã deste sábado (5) durante o Festival Sigmaringa Seixas. O evento acontece ao longo deste fim de semana na Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), em Guararema, interior de São Paulo. 
 

Construído pela Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Associação de Amigos ENFF, Sindicato dos Advogados de São Paulo (SASP), Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e Grupo Prerrogativas, o Festival homenageia o advogado e deputado constituinte Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, figura de destaque no enfrentamento à ditadura militar e na construção da democracia.  
 

Durante o debate sobre o aniversário da Constituição, os integrantes da mesa analisaram a atual conjuntura política do país e a ameaça explícita à democracia protagonizada pelo governo conservador de Jair Bolsonaro. 
 

Gisele Cittadino, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) e membro da ABJD, pontuou as fragilidades na garantias dos direitos previstos na lei brasileira, que nunca foram efetivamente assegurados para a grande maioria da população. 
 

Esse processo, segundo ela, é o resultado de políticas pensadas pela classe dominante, para a classe dominante. 
 

“Aqui no Brasil há a lógica da guerra, de se destruir aqueles que se opõem ao projeto das elites. Todos os nossos adornos políticos foram revoluções pelo alto. Acordos políticos costurados pelas elites políticas, acordos que ignoram inteiramente as camadas populares”, afirmou.
 

Luta pela terra
 

Consagrada pela Constituição de 1988, a Função Social da Terra e a desapropriação para fins de reforma agrária, assim como a população camponesa como um todo, estão ameaçadas pelas políticas de Bolsonaro.
 

“A vontade deles é revogar a função social da propriedade, conquista importante de 1988. Eu tenho dito que é reconstruir a Lei de Terras de 1950. Olhem o nível que o bolsonarismo está chegando. Querem privatizar mais de 300 milhões de hectares de terra da Região Amazônica para entregar para o agronegócio”, denunciou João Paulo Rodrigues, da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST).
 

Ele alertou ainda que a reforma trabalhista e a previdenciária – em tramitação no Senado – afetam diretamente as condições de vida dos camponeses. “Vai criar um caos no campo. Vai desorganizar toda a vida do campesinato e toda a luta histórica contra a pobreza. Teremos uma nova etapa do êxodo rural”.
 

Em sua fala durante o debate, Rodrigues elencou outras medidas que também estão entre as principais “maldades” do governo. Entre elas estão o corte de políticas públicas para o campo, como o crédito rural e o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), a liberação de armas no território rural, a autorização acelerada de novos agrotóxicos, a privatização dos recursos naturais dentro de áreas indígenas e a paralisação da demarcação de terras das populações tradicionais. 
 

Na avaliação de Ronaldo Pagotto, advogado e membro da Consulta Popular, só a organização popular poderá frear a retiradas de direitos.
 

“O Brasil sempre foi o país da promessa. Esse país do futuro nunca chegou para a ampla maioria [da sociedade]. Essa luta para a construção desse país entra no debate de um projeto nacional. Que Brasil é esse que precisamos e queremos construir? Temos que ter essa ideia. Se ela não for construída por nós, vamos assumir a ideia plantada pela classe dominante, lacaia, anti-nacional, motivadas pelos interesses externos”, disse. 
 

O legado de Sigmaringa Seixas
 

A luta do advogado Luiz Carlos Sigmaringa Seixas, homenageado pelo Festival, se perpetua como um grande exemplo e inspiração para os movimentos populares. Na década dos anos de 70 e 80, sua atuação junto aos tribunais do regime militar foi determinante na vida de sindicalistas, estudantes e presos políticos que, mesmo perseguidos, se dedicaram à defesa absoluta da liberdade e da justiça social.
 

Maria Luce de Carvalho, viúva de Sigmaringa, esteve presente no seminário sobre a Constituição Cidadã, que abriu o evento. “Foi uma bela e verdadeira homenagem a esse homem que foi Sigmaringa. Meu companheiro, pai dos meus filhos, um homem de luta. Quero, sobretudo, agradecer esse espaço de luta e resistência”, declarou. 
 

Segundo a organização do Festival, a perspectiva é que o evento aconteça anualmente, sempre na data que marca o aniversário da Constituição Cidadã, reunindo movimentos sociais, sindicais e organizações jurídicas. 
 

*Com informações de Larissa Gould

Edição: Geisa Marques/ Brasil de Fato