Após 20 anos de Expressão Popular, que desafios estão colocados na batalha das ideias?

Ação Literária resgata trajetória da editora e reúne movimentos e organizações populares
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Em duas décadas, a Expressão já publicou mais de 600 títulos. Foto: Claudio Kbene

Por Wesley Lima
Da Página do MST

Feira de livros, debates, apresentações culturais e diversas exposições para todos os públicos e idades marcam a realização da Ação Literária Expressão Popular. O evento, que acontece no Armazém do Campo de São Paulo, é uma iniciativa da editora Expressão Popular em comemoração aos seus 20 anos de existência “Na Batalha das Ideias”.

As atividades tiveram início nesta última sexta-feira (11) e se estendem até domingo (13), com uma programação que conta a história da editora. Exemplo disso, foi a mesa de debates que apresentou os desafios na atual conjuntura.

Mesa debate os desafios da luta de classes na história literária. Foto_Claudio Kbene.jpg
Mesa debate os desafios da luta de classes
na história literária. Foto: Claudio Kbene

O debate foi mediado por Carlos Bellé, da coordenação política da editora, Rosana Fernandes, da coordenação política e pedagógica da Escola Nacional Florestan Fernandes, pelo advogado e membro da direção nacional da Consulta Popular Ricardo Gebrim e o pensador marxista brasileiro Michel Löwy.

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Acompanhado por movimentos e organizações populares, que contribuíram na construção da Expressão Popular, desde 1999, o debate apontou o acesso a literatura e ao pensamento revolucionário, puxado por clássicos do marxismo, como ferramentas fundamentais para avançar na “formação de consciência” dos trabalhadores.

E essa discussão não fica apenas no papel. A editora, que hoje possui livreiros espalhados por todo país, comercializa livros a preços populares, garantindo realmente que trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade possam ter acesso a produção intelectual com o objetivo de compreender e incidir na luta de classes.

Aonde tem Expressão tem processos revolucionários

De acordo com Ricardo Gebrim, essa mesma perspectiva foi adotada em processos revolucionários no decorrer da história, apontando a Revolução Russa e a Cubana como exemplos históricos que ensinam muito sobre a construção de editoras e a importância de se trabalhar com a formação de consciência.

Ricardo Gebrim, da direção nacional da Consulta Popular. Foto_Claudio Kbene.jpg
Ricardo Gebrim, da direção nacional da
Consulta Popular. Foto: Claudio Kbene

Sobre a Revolução Russa, ele conta que foi a primeira experiência de transição para o “Socialismo” e essa experiência que se “mantem viva com tantas marcas e importância histórica” se preocupou com propagação do pensamento marxista.

“Evidente que essa experiência conformou um legado bastante contraditório, bastante complexo, principalmente, durante todo processo de tradição estalinista, que traz um complexo de problemas em torno da liberdade de criação de debate, do pensamento, das ideias. No entanto, ela traz junto consigo um poderoso movimento comunista internacional, que foi ao seu tempo, um verdadeiro exército mundial, que se colocava de forma invencível com uma grande capacidade de propagação de ideias e de ações”, explicou.

“Com isso, se proliferaram muitas editoras por toda parte do mundo. Editoras que divulgavam o pensamento marxista e um conjunto de autores do pensamento revolucionário.”

Sobre o processo de transição revolucionária em Cuba e sua tradição em toda América Latina, Gebrim apontou o esforço de propagação do pensamento através da constituição de editoras na pequena ilha, mas “grandiosa Cuba”.

Para ele, cada experiência, cada avanço e conquista trouxe junto a distribuição de livros e do pensamento mais sistemático e continua: “Por isso, para nós sempre foi um sonho construir uma editora que tivesse esse perfil e que pudesse contribuir com esse papel revolucionário”.

Nesse mesmo contexto, Michel Löwy, um dos primeiros autores de livros a serem publicados pela Expressão Popular, ressaltou a atualidade do pensamento de Che Guevara, assassinado há 52 anos. “Se mata um revolucionário, mas não se matam suas ideias, elas continuam sendo lidas e discutidas até hoje”, afirmou.

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Löwy é um dos primeiros autores da Expressão Popular. Foto_Claudio Kbene.jpg
Löwy é um dos primeiros autores da Expressão Popular. Foto: Claudio Kbene

Diante da riqueza do pensamento de Che e suas experiências práticas vividas no continente Latino-americano, Löwy destacou a concepção humanista da revolução, apresentada no centro da qual está a vida humana, a solidariedade e a fraternidade internacional, com base no que chamamos de internacionalismo.

“O socialismo e o comunismo não são só sobre distribuição de bens, é uma ética que busca superar as alienações e construir outro tipo de relação humana, em oposição ao capitalismo que explora os trabalhadores, transformando-os em mercadorias”, explicou.

Por isso, pontuou três dimensões importantes onde se articulam a construção do socialismo, fazendo menção ao papel da editora na atual conjuntura: “O socialismo precisa se articular de maneira prática na perspectiva da consciência, da ética, numa dimensão combativa, e da solidariedade”.

Ao olhar para esse recorte e a perspectiva continental, Löwy conectou esse pensamento a elaboração de José Carlos Mariátegui La Chira, que foi um escritor, jornalista, sociólogo peruano, que se destacou como um dos primeiros e mais influentes pensadores do marxismo latino-americano. Inclusive, “Che Guevara se dedicou a leitura do Mariátegui para entender a luta de classes no continente”, comentou.

Formação política e ideológica

Em duas décadas, a Expressão já publicou mais de 600 títulos. Suas publicações abarcam mais de 30 segmentos, entre eles, a agroecologia, estudos de gênero, artes, clássicos da política, história, economia, filosofia e educação.

Durante sua trajetória foram integradas ao trabalho da editora mais de 300 colaboradores, para indicação e análise de textos, cessão de direitos autorais, trabalhos de revisão, tradução e diagramação. É nessa organização que os desafios se ampliam a partir do trabalho da editora.
 

Rosana Fernandes aponta os desafios da batalha das ideias. Foto_Claudio Kbene.jpg
Rosana Fernandes aponta os desafios
da batalha das ideias. Foto: Claudio Kbene

Rosana Fernandes, destacou que a Expressão Popular é um instrumento de formação política e ideológica da classe trabalhadora. Para ela, a editora precisa avançar no processo de formação dos trabalhadores e para isso, é necessário articular a luta dos movimentos e organizações populares que a constrói, com a luta contra a alienação dos trabalhadores na atual conjuntura.

Segundo Fernandes, essa alienação se apresenta em cinco dimensões: social, política, religiosa, econômica, cultural e intelectual. Por isso, precisa ocupar espaços de disputas, como a alimentação saudável, a dimensão cultural na sociedade, as escolas, na perspectiva da batalha das ideias, na comunicação, no trabalho de base, com foco nas periferias, e por último, mas não menos importante, na formação política e ideológica.

“A formação deve contribuir na implementação da estratégia da classe trabalhadora. Precisa formar para luta de classes. Deve contribuir na elaboração teórica, na produção de conhecimento e compreender as contradições que estão colocadas. O acesso ao livro é o primeiro passo para isso.”

“Essas questões precisam estar alinhadas a mística revolucionária e a formação de intelectuais orgânicos, como aponta Antonio Gramsci”, complementou Fernandes.

Ação Literária

Assim como em São Paulo, a Ação Literária Expressão Popular realiza mais de 70 atividades em 17 estados brasileiros, onde todos os livros serão vendidos com desconto e serão acompanhados por debates e atividades culturais.

 

*Editado por Yuri Simeon