Lembre-se de mim de vez em quando

É importante conhecer Che Guevara, um homem de carne e osso que atravessou seu tempo histórico deixando como legado uma práxis transcendental.

Por Judite Santos*
 

Passados 52 anos de sua morte, ainda é difícil falar ou escrever sobre Che Guevara sem destacar a grandiosidade de um homem que atravessou seu tempo histórico deixando uma práxis transcendental.

Precisamos desmistificar Che Guevara nas suas diferentes facetas. O guerrilheiro, o radical, o revolucionário das causas do Terceiro Mundo, o herói, etc. Che Guevara foi tudo isso, sem dúvida, mas foi também um ser humano comum, de carne e osso, de sentimentos, capaz de aprender e ensinar com o curso do movimento histórico. Che nos representa a essência da humanidade!

Quando conheceu Fidel Castro no México, havia recém de saído da Guatemala, após um golpe de Estado naquele país centro americano. Naquela época, Che acreditava que o país com as melhores condições para uma transformação revolucionária na América Latina era a Guatemala. Esta análise foi frustrada, após o golpe de junho de 1954, em que a CIA destituiu o governo progressista de Jacobo Guzmán impondo décadas de repressão sangrenta.

Em umas das noites de julho de 1955, por intermédio de Raul Castro, Fidel e Che se encontraram pela primeira vez e conversaram incansavelmente. Deste encontro brotou uma irmandade e cumplicidade que durou para o resto das suas vidas. Nesta mesma noite Che Guevara se tornou um expedicionário do Iate Granma, ali selou junto com Fidel o compromisso de lutar pelos povos do mundo e que, após triunfada a Revolução Cubana, deveria seguir seu caminho. E assim o fez quando expressou em sua carta de despedida a Fidel, em 3 de outubro de 1965, “nos novos campos de batalha, levarei a fé que você me ensinou, o espírito revolucionário do meu povo, o sentimento de cumprir o mais sagrado dos deveres: combater o imperialismo onde quer que eu esteja, isso reconforta e cura qualquer lágrimas”.

Che sempre foi um internacionalista convicto, desde a sua juventude, como já sabemos bem. Em sua trajetória pela América Latina desvendou e denunciou as mazelas do capitalismo periférico. “E é impressionante como o Che encarnou em sua personalidade virtudes humanas diversas. Ele mesmo se autodenominou um aventureiro, mas não é possível que um aventureiro coloque para si, tamanha responsabilidade e sacrifício pela emancipação da humanidade” como nos disse  Armando Hart.

Ainda na Guatemala, em dezembro de 1953, conheceu a sua primeira companheira, a Hilda Gadea, que pouco escutamos falar, uma revolucionária peruana que se encontrava exilada, foi ela quem introduziu Che aos círculos políticos.

No livro, “mi vida con el Chê” se encontra o testemunho desta historia de amor e revolução. Hilda Gadea, militante e dirigente peruana do APRA (Alianza Popular Revolucionaria Americana), narra a sua vida ao lado de Che e seu processo de definição política durante sua estadia na Guatemala e no México, período em que começa seus estudos sobre o marxismo-leninismo e colocar em prática a ação revolucionária. Apesar de não sabermos muito sobre esta história, Hilda teve um papel importante nas opções políticas de Che, pois era uma grande dirigente revolucionária com muito mais experiencia e esperteza que ele. Com Hilda, Che se casou e tiveram a filha Hildita.

Em Cuba, nos meses finais da guerra de guerrilha, Che conheceu Aleida March com quem compartilhou tarefas revolucionárias em Santa Clara em uma das suas maiores gestas que foi o descarrilhamento do trem blindado. Esta ação coroou o Chê como Comandante do Exército Rebelde, tarefa que já vinha desempenhando desde a Sierra Maestra.

Após o triunfo revolucionário de 1959, Che Guevara se divorcia de Hilda e se casa com Aleida no qual tiveram 4 filhos, Aleida, Camilo, Celia e Ernesto.

No livro “evocación”, Aleida March, relata sua trajetória junto ao Che, desde que se conheceram, nos presenteando com a apresentação de um Che mais íntimo e familiar, um Che que também escrevia cartas de amor e que revela sua ternura.

O livro nos dá a ideia de um homem em completa humanidade, de facetas que não conhecemos conjugando o ser revolucionário com o pai, esposo e amigo. E claro, também com as suas contradições como homem na dimensão da vida privada.

“Aleida March resgata Che da imensidão divina para trazê-lo conosco, materialmente de novo, ele descansa no chão em que pisamos todos os dias para que o brilho do sol o faça suar como o mais comum dos mortais, e ela nos convida a referendar suas palavras: “lembre-se de mim de vez em quando” (periódico Granma, 11 de julho de 2014).

Che Guevara, cumprindo seu compromisso de lutar por justiça e libertação da humanidade, foi para o Congo em 1965, empreender uma revolução que não estava em condições preparada, por isso não foi exitosa, ao contrario, foi um fracasso como podemos ler no seu próprio “Diário do Congo”.

Então regressa a Cuba e clandestinamente começa os preparativos para empreender a luta guerrilheira na Bolívia. Estando nesta frente de batalha entre 1966 e 1967, Che e o incipiente exercito guerrilheiro na Bolívia, criaram as condições básicas para enfrentar a complexidade da situação. Faltava água e alimentos, o que exigia uma quota imensa de sacrifícios.

Foram 11 meses enfrentando situação hostil até chegar na Quebrada del Yuro, em 8 de outubro de 1967 onde foi capturado pela CIA e o exército Boliviano. No dia seguinte, foi assassinado na escolinha de La Higuera, lugar onde passou as ultimas amargas 24 horas de sua vida, até ser cruelmente assassinado.

Após ser assassinado Che Guevara foi levado para a pequena cidade de Valle Grande, onde se deu a conhecer ao mundo a noticia do seu assassinato. Durante 30 anos os restos mortais do Che ficaram desaparecidos, somente em 1997, seu corpo foi encontrado aos arredores de um aeroporto militar desativado e foi levado de volta para Cuba, onde repousa junto com outros heróis cubanos num belo e místico mausoléu na cidade de Santa Clara.

Mi única:

“Aprovecho el viaje de un amigo para mandarte estas letras, claro que podían ir por correo, pero a uno le parece más íntimo el camino &”39;paraoficial&”39;. Te podría decir que te extraño hasta el punto de perder el sueño, pero sé que no me creerías de manera que me abstengo. Pero hay días en que la morriña avanza incontenible y se posesiona de mí. En navidad y Año nuevo, sobre todo, no sabes cómo extraño tus lágrimas rituales, bajo un cielo de estrellas nuevas que me recordaba lo poco que le he sacado a la vida en el orden personal […].

De mi vida aquí, poco interesante se puede decir, el trabajo me gusta pero es excluyente y a veces un poco cansador. Estuudio, cuando me queda tiempo y sueño en algunos instantes; juego ajedrez, sin contrincantes de categoría y camino bastante. Voy perdiendo peso, un poco de añoranza y otro del trabajo.

Dale un beso a los pedacitos de carne, a todo el resto y recibe el beso preñado de suspiros y otras congojas de tu pobre y pelado

Marido”.

– Fragmentos da única carta que Aleida pode receber enquanto o Che liderava a guerrilha na Bolivia em 2 de dezembro de 1966.
 

*Judite Santos é do Coletivo de Relações Internacionais do MST.