Produtores protestam contra crise do leite, em Porto Alegre

Mobilização pede anulação de Instruções Normativas do governo federal
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Os produtores relatam que as instruções obrigam mais investimentos, enquanto a produção continua desvalorizada. Foto Leandro Molina

 

Da Página do MST

 

Cerca de 1000 produtores de leite do Rio Grande do Sul realizam, desde às 7h da manhã desta terça-feira (15), um protesto em Porto Alegre pela anulação das Instruções Normativas 76 e 77 do governo federal. A ação, que também pauta a insatisfação com o preço do leite pago aos agricultores, ocorre na Superintendência Regional do Ministério da Agricultura (Mapa), no Centro Histórico da capital.

A fim de chamar a atenção da população para o problema, os trabalhadores rurais, oriundos de várias regiões do estado, trouxeram ao pátio do Mapa faixas, cartazes, caixas de leite e vacas. Eles ressaltam que não são contra medidas que controlem a qualidade do leite. No entanto, alegam que essas normativas, publicadas em novembro de 2018 pelo governo federal, inviabilizam a produção dos pequenos e médios produtores. As normas especificam os padrões de identidade e qualidade do leite e estabelecem várias alterações na forma de produzir, coletar e armazenar o produto.

Preocupação com a temperatura do leite

Uma mudança que mais preocupa é a temperatura máxima permitida para o leite chegar ao estabelecimento industrial. Com as novas regras, caiu de dez para sete graus. Essa alteração ignora a realidade daqueles que moram em locais distantes e o tempo de viagem necessário para transportar a matéria-prima dessas propriedades até a indústria.

“Em Piratini, por exemplo, o caminhão faz 180, 200 km para chegar à indústria. O leite não chega com menos de 8 graus no inverno e a temperatura aumenta no verão. Com as normas antigas nem produtor, nem consumidor tiveram problemas”, observa Adelar Pretto, da Cooperativa de Produção Agropecuária Vista Alegre (Coopava).

Novas regras geram abandono da atividade

Os agricultores explicam que, na prática, as novas regras eliminam os pequenos em favor dos grandes, pois os produtores que não se adaptarem sairão do mercado num curto tempo. Também há previsão de que o problema atingirá o consumidor, que em função do monopólio da indústria poderá pagar mais caro pelo litro de leite nos supermercados.

Os produtores relatam que as instruções os obrigam a fazerem mais investimentos para se adequarem, enquanto a produção continua desvalorizada, e aumentam o número de desistentes da atividade. Eles acrescentam que o abandono já ocorre de forma acelerada nos últimos anos no RS. De acordo com a Emater, em 2015 havia 198 mil produtores de leite. Já em 2017 foram contabilizados 19 mil a menos.

Economia dos municípios

O RS é um dos estados que mais produz leite. Porém, parte da produção está concentrada nas mãos dos grandes produtores. É justamente essa concentração que prejudica os pequenos e médios agricultores. Dados do Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) revelam que até 2017 a produção ocorria em 491 dos 497 municípios. Portanto, é essencial para a economia local e estadual, responsável por 2,81% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Sindicato da Indústria de Laticínios do RS.

Além da agricultura familiar, os assentamentos da Reforma Agrária também são responsáveis por parte da produção. Cerca de 6 mil famílias assentadas no estado produzem mais de 120 milhões de litros de leite ao ano.

O preço do leite pago ao produtor também gera um grande descontentamento e desestimula a produção. Na maioria dos municípios o preço do litro gira em torno de R$ 1,00, conforme preço de referência. No entanto, se gasta praticamente o mesmo valor para produzir. Ou seja, não sobra quase nada no bolso do agricultor.

Audiência pública e reunião com o governador

A mobilização na superintendência do Mapa reúne produtores ligados ao MST, Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Federação dos Agricultores na Agricultura Familiar (Fetraf) e Federação dos Trabalhadores na Agricultura no RS (Fetag).

Houve também pela manhã uma caminhada até a Assembleia Legislativa. No Teatro Dante Barone participarão de uma audiência pública para debater os problemas oriundos das Instruções Normativas 76 e 77 e discutir a insatisfação com o preço do leite.

O evento, proposto pelos deputados estaduais Edegar Pretto, Jeferson Fernandes e Zé Nunes, do PT; Elton Weber (PSB); Edson Brum (MDB); e a subcomissão do leite da Câmara Federal, também reunirá técnicos do setor e representantes de cooperativas e de instituições públicas.

Deputados e produtores pretendem entregar ainda hoje ao governador Eduardo Leite (PSDB) um documento com uma síntese da audiência, cobrando o envolvimento do governo gaúcho diante dos problemas enfrentados na cadeia produtiva do leite.

 

*Editado por Wesley Lima