Encontro do MST no DF e Entorno reafirmou trabalho de base e formação política em seus territórios
Por Janelson Ferreira
Da Página do MST
Terminou neste sábado (14) o 22º Encontro Estadual do MST do Distrito Federal e Entorno. Durante 3 dias, cerca de 200 militantes Sem Terra da região debateram as principais questões que guiarão as ações do Movimento no próximo ano.
Foram realizadas diversas reflexões deste ano de 2019, marcado por ser o primeiro ano do mandato presidencial de Jair Bolsonaro, que já realizou diversas ameaças ao MST. Temáticas como a Reforma Agrária Popular, trabalho de base nas periferias do DF, processo de formação política entre as famílias acampadas e assentadas e as formas que o patriarcado violenta a vida das mulheres foram o centro das discussões no Encontro, que começou na última quinta-feira (12).
Para Geraldo Gasparin, da direção nacional do MST, os adversários políticos da esquerda impuseram a ela uma derrota estratégica no último período, e não só eleitoral. “Nossos adversários trouxeram para o centro da luta de classes uma batalha ideológica, de um novo modelo de sociedade”, afirma Gasparin.
Segundo ele, uma das crises que a esquerda vive é organizativa, pois os instrumentos políticos e organizativos existentes atualmente não respondem aos desafios da classe trabalhadora. “Democratizamos o acesso à universidade, mas não elevamos o nível de consciência da classe trabalhadora, e a consequência disso foi o golpe”, explica, ressaltando ainda o papel do trabalho de base nas periferias das grandes cidades. “A proposta de retomada do método de organização social não pretende inventar nada, mas resgatar processos de trabalho e formação de base que o Movimento já fez na sua história”, destaca.
Nas últimas eleições presidenciais, em 2018, Bolsonaro foi vencedor em todas as zonas eleitorais do Distrito Federal. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, o atual presidente superou 70% dos votos em regiões como Samambaia, Taguatinga e Santa Maria, todas localizadas na periferia do DF. Enquanto isso, Fernando Haddad recebeu sua maior votação na Zona Norte, uma das áreas com maior nível de renda do DF.
De acordo com Eneide Rocha, do setor de formação do MST-DF e Entorno, a disputa ideológica deve apontar saídas para os desafios atuais. “Temos que compreender os temas atuais que são mais estruturantes dentro do MST, mas também da sociedade em geral, num cenário em que a formação política e o trabalho de base sejam elementos estratégicos”, reflete Rocha.
“Temos que resgatar a memória de luta das famílias assentadas”, afirmou Geraldo Gasparin. Para ele, a militância precisa ser um marco e um fermento para o povo em direção ao socialismo. “O sentido do trabalho de base é enraizar a luta na alma dos povos”, finaliza.
Machismo na sociedade
No segundo dia do Encontro, a mesa sobre as consequências do patriarcado na vida das mulheres trouxe para a plenária as formas com que o machismo se reproduz nas mais diversas esferas da sociedade. Para Lucineia Freitas, do Setor de Gênero do MST, a violência contra a mulher busca formar corpos dóceis, que se submetam a todo tipo de exploração. “Há uma tentativa de criar uma cultura do medo como forma de controle social, pratica esta que existe desde a Inquisição, quando queimavam mulheres nas fogueiras”, explica Freitas. “A gente vai ter que enfrentar no cotidiano o patriarcado e o racismo se quisermos fazer a luta pela terra e pela Reforma Agrária Popular”, afirmou.
Sabrina Mendes, do Setor de Produção do MST-DFE, avaliou a reprodução do machismo e do racismo em áreas da reforma agrária. “Não podemos nos conformar com a violência contra as mulheres e o racismo em nossas áreas”, destacou Mendes, que ainda relembrou que a violência e a repressão são estruturantes no capitalismo.
Em 2019, segundo dados da Secretaria de Segurança Público, a cada 13 dias uma mulher foi vítima de feminicídio no Distrito Federal. Entre todos os casos registrados, 84% deles ocorreram na residência da própria vítima.
Ato político reuniu apoiadores do MST
No último dia da atividade, um ato político com organizações parceiras do MST o fim do 22º Encontro Estadual. Um dos presentes no ato, Kleytton Moraes, presidente do Sindicato dos Bancários do DF, afirmou que a luta do Movimento Sem Terra feita no campo consegue alcançar até a cidade. “O MST serve como um farol para as lutas no Brasil e na América Latina”, destaca Moraes.
Rosilene Corrêa Lima, da diretoria do Sindicato dos Professores do DF, relembrou o momento de criminalização que a esquerda sofre hoje no Brasil. “Hoje há uma criminalização da política e daqueles que lutam por justiça, mas não existe justiça social sem Reforma Agrária”, afirma. Para ela, tanto a luta pela terra quanto a educação passam por momentos delicados com o governo Bolsonaro. “Assim como a terra, a educação também é um alimento para o povo”, reflete Rosilene.
A deputada federal Erika Kokay (PT-DF) também esteve presente no ato político e destacou a importância da luta pela reforma agrária na história do Brasil. “No fundo, a direita tem muito medo do MST, por isso quer criminalizá-lo. Mas não vão conseguir, porque este Movimento resiste: resistiu a Eldorado dos Carajás, e continua resistindo”, ressaltou Kokay. De acordo com a deputada, querem tratar os movimentos sociais com bala, como se o latifúndio fosse mais importante que a vida. “As cercas do latifúndio cercam os sonhos e a própria esperança e o MST traz nos seus passos o amanhã que querem nos roubar”, finaliza.
Plano nacional de reflorestamento é lançado no DF
Durante o Ato Político do Encontro Estadual, foi lançado o Plano Nacional “Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis”. O Plano lançado pelo MST segue uma linha histórica que sempre alinho o tema da questão ambiental com o debate de reforma agrária no Brasil. Barbara Loureiro, do Setor de Produção do MST, explica esta relação. “Enquanto o latifúndio sempre ficou marcado pela destruição da biodiversidade, a reforma agrária sempre foi vista como uma solução, a partir do uso mais racional do solo, como no assentamento Canudos, em Goiás, que possui a maior área de reserva de cerrado na região da Grande Goiânia”, exemplifica Loureiro.
Esta perspectiva histórica se soma a um contexto político após a crise econômica de 2008, momento em que se verificou um acirramento da crise ambiental, com aumento da exploração dos bens naturais. Além disso, o governo Bolsonaro inaugura um período no Brasil de crimes ambientais e destruição da legislação ambiental.
O objetivo do Plano Nacional é plantar 100 milhões de árvores em 10 anos. De acordo com Bárbara Loureiro, a defesa da natureza está conectada à Reforma Agrária Popular proposta pelo Movimento. “Nós partimos de somente uma posição de denúncia, para uma postura ativa de cuidar dos bens comuns como a água, a terra, a biodiversidade, os minérios, tornando nossos territórios ilhas de proteção da natureza”, afirma Loureiro. Segundo ela, para além do reflorestamento, há o objetivo de desenvolver sistemas produtivos com árvores, gerando soberania alimentar e renda para as famílias. “O plano tem foco nos territórios do MST, envolvendo nossas cooperativas, associações, escolas, centros de formação, mas também busca envolver a sociedade como um todo”, explica.
*Editado por Fernanda Alcântara