Mulheres Sem Terra constroem resistência na quarentena com apoio e autocuidado

Em momentos de pandemia, assentamentos reformulam medidas de organização, solidariedade e cuidados com a saúde
Colheita da camomila pelo coletivo Raízes da Terra. Foto: comunicação MST

Por Flora V. Faria 
Da Página do MST

Em um período tão difícil para o mundo, em que é preciso adaptação à novos modos de convivência para superar a pandemia da COVID-19, os acampamentos e assentamentos do  MST se propõem a manter a produção de maneira a garantir a saúde de todos os trabalhadores, por meio da Quarentena Sem Terra. A doação de alimentos para que diversas famílias possam atravessar este período delicado também é uma das ações deste momento. Pensando, nisso os coletivos do sul de Minas têm replanejado seus meios de produção.

No assentamento Santo Dias, o plantio orgânico de sementes, de pimenta e dos cerca de mil pés de tomate , utilizados na produção de molhos e reprodução de mudas, tem acontecido pelas mãos de apenas algumas famílias. Anteriormente à pandemia, a atividade era realizada por muito mais pessoas.

Já o coletivo de mulheres Raízes da Terra, do assentamento Nova Conquista, o plantio da camomila e outras plantas medicinais ligadas à fitoterapia tem sido realizado em três grupos, com dias de trabalho alternados para evitar a aglomeração. Para Débora Vieira Borges, integrante do coletivo: “Nesse momento, tem sido muito importante manter a organização e união das mulheres, tanto para dar continuidade em nossos projetos e contribuir com os acampamentos na prevenção da pandemia, quanto para o apoio nos problemas da alma”, compartilha.  

É interessante ressaltar que a camomila, plantada pelo coletivo Raizes da Terra, é muito relacionada ao Sagrado Feminino e ao autocuidado. Em diversas culturas, a planta era consagrada aos deuses da Sabedoria e da Justiça. A camomila é originária da Europa e está presente na medicina natural de diversos países.

O coletivo existe desde 2011 e hoje é composto por  30 mulheres organizadas nos setores e direção do Movimento. Débora lembra que a iniciativa nasceu à partir das demandas que foram surgindo com o andar dos processos da luta pela Reforma Agrária.

“No começo, nos dividíamos em setores como educação, formação, produção e saúde. Depois, veio a necessidade de gerar autonomia e renda para as mulheres. Já haviam as atividades da saúde, então juntamos esse saber para gerar renda”, explica ela.

A cultura ancestral do poder das plantas perpassa gerações, mas com o apagamento da sabedoria feminina e popular, muito desses conhecimentos se perderam. Coletivos feministas resgatam essa sabedoria amparando o empoderamento, a autonomia e a ressignificação do ser mulher.

“Cada dia é um processo de formação. Depois de certo tempo vamos entendendo e fazendo juntas e à partir dos resultados práticos, vamos aprofundando o objetivo do coletivo, os princípios das ervas, o conhecimento das nossas ancestrais, a confiança uma na outra, etc.”, completa Débora.

Diante de uma pandemia em que se questiona o valor da vida do trabalhador e da trabalhadora, o cuidado e a força ligada à mulher, que restaura a saúde, ampara com sabedoria e zela pela justiça, são muito necessários.

Religar-se à esta força ajuda na prevenção dos impactos diretos e indiretos dessa pandemia. É preciso cuidar de si e do próximo. É neste momento que se acentua a necessidade de uma nova relação com a saúde, o cuidado, o trabalho, o coletivo e o meio ambiente.

*Editado por Luciana Console