União e solidariedade: organizações doam 12 toneladas de alimentos no sudoeste do PR

Entidades e movimentos de 18 municípios se uniram nas doações para quilombolas e indígenas da região
Campanha de solidariedade doa 12 toneladas de alimentos no Paraná. Foto: Geani Paula

Por Setor de Comunicação e Cultura do MST-PR 
Da Página do MST

A solidariedade e organização popular do campo e da cidade se transformaram na doação de 12 toneladas de alimentos nesta quinta-feira (21) na região sudoeste do Paraná. A ação é resultado de uma campanha de solidariedade em que foram doados alimentos produzidos por agricultores familiares, atingidos por barragens, assentados e acampados de 18 municípios da região. 

As doações foram destinadas a mais de 400 famílias da comunidade quilombola Adelaide Maria da Trindade Batista, do município de Palmas, e da Reserva Indígena de Mangueirinha. As comunidades tradicionais lutam pelo reconhecimento de seus territórios. Nesse período de pandemia, muitas famílias ficaram sem trabalho.

As cestas montadas por voluntários expressaram a diversidade e fartura de produção da agricultura familiar, responsável por 89% dos estabelecimentos rurais e uma das principais bases da economia regional. Roupas e produtos de higiene também fizeram parte dos itens doados. A iniciativa resultou da mobilização do Fórum Regional das Organizações e Movimentos Populares do Campo e da Cidade do Sudoeste do Paraná e outras organizações sindicais, populares e estudantis da região. 

Paulo Czekalski, presidente do Fórum, explica que parte dos alimentos foram doados e parte comprados diretamente dos produtores e produtoras e das cooperativas de agricultores, com recursos levantados pelas entidades. “Foi uma corrente que ajudou quem está precisando desse alimento nesse momento de dificuldade, mas também teve a comercialização e a doação daquele produto que estava excedente. Por isso é uma campanha de solidariedade e não de caridade”, destaca. 

Entre as 22 entidades que atuaram na ação estava também o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Para Bruna Zimpel, integrante da direção estadual do MST e acampada na região, a ação unitária expressa a força da aliança entre a classe trabalhadora do campo e da cidade. Ela também explica a simbologia da ação. “Para nós, a solidariedade é um valor e um princípio que cultivamos no dia a dia. Desde o início da pandemia, entendemos que doar os frutos do nosso trabalho e da nossa luta é o melhor que podemos fazer pelo povo que já sofre com a fome”. 

Doações também ocorreram nesta sexta-feira (22). As famílias do MST doaram cerca de duas toneladas de alimentos em ação com participação dos acampamentos 7 de Setembro e São Francisco de Assis, do município de Renascença, e os assentamentos João de Paula e Eduardo Raduan, de Marmeleiro. Neste mesmo dia, famílias do assentamento Eli Vive, localizada no Distrito de Lerroville, em Londrina, distribuíram mais de uma tonelada a moradores urbanos da região. 

As doações do MST do Paraná chegaram à marca das 100 toneladas de alimentos doados ao longo de toda a pandemia. Foram duas mil e duzentas marmitas em Curitiba e 400 máscaras de tecido no interior do estado. O envolvimento de agricultores e agricultoras Sem Terra cresce a cada semana, com 28 acampamentos e 36 assentamentos de 39 municípios já tendo participado de iniciativas de doação. O MST de todo o Brasil está em campanha permanente de solidariedade e já doou mais de mil e duzentas toneladas de alimentos.

Foto: Bruna Zimpel

Partilha dos frutos da terra e da luta 

Cleusa Camargo Scheffer, agricultora e moradora do acampamento 7 de Setembro, de Renascença, doou mandioca, batata-doce, legumes e uma diversidade de alimentos colhidos da sua roça. Ela conta que as doações são o resultado do trabalho das famílias integrantes do MST, muitas vezes discriminadas pelo poder público e por setores da sociedade. 

“Queremos que o pessoal, principalmente as autoridades, olhem a gente com mais carinho, porque alguns enxergam os Sem Terra e o movimento como uns baderneiros. Nós não somos isso. Somos produtores e com amor doamos e somos solidários, porque a gente se comove com o sofrimento das pessoas e vamos continuar ajudando”, garante a camponesa Sem Terra. 

Os alimentos colhidos por Cleusa fizeram parte das cestas que chegaram na Reserva Indígena de Mangueirinha. Ali, vivem 614 famílias das etnias Guarani, Kaingang e Xetá, em 16.800 hectares já demarcados e que também estão nos municípios de Chopinzinho e Coronel Vivida. “A gente só tem a agradecer por vocês estarem vendo a nossa situação e correndo atrás pra nos ajudar”, diz João Santos Luiz Carneiro, 62 anos, cacique da aldeia. 

Para a população indígena, que antes tinha no artesanato a principal forma de sustento, a pandemia se transformou num período de dificuldade de garantir o alimento dentro de casa. No entanto, para além da luta pela sobrevivência neste período de crise política e de saúde pública, o povo da comunidade precisa resistir às ameaças ao território. “Eles [fazendeiros] estão entrando devagarzinho ao redor da aldeia. O que estamos precisando é reaver os marcos”, explica o cacique, que também ressalta que o Ibama deve fazer vistorias na área logo após o fim da quarentena. 

Outra parte dos alimentos arrecadados foram destinados às famílias do quilombo Adelaide Maria da Trindade Batista, que vivem no bairro São Sebastião do Rocio, município de Palmas e há anos lutam pelo reconhecimento de seu território. Nesse período de pandemia, muitas famílias ficaram sem trabalho.

Para a matriarca da comunidade Maria Arlete, esses alimentos vão auxiliar muitas famílias que estão sem emprego nesse período.  “Ficamos felizes em poder ajudar e as famílias e elas vão ficar satisfeitas com nossa ação. Todos vão ficar contentes!”, exclama ela. 

Heranças da resistência camponesa 

O sudoeste do Paraná está entre as regiões do estado com maior índice de estabelecimentos rurais nas mãos da agricultura familiar. E não foi por falta de tentativa de impedimento dos interesses dos latifundiários. A Revolta dos Posseiros é o episódio da história da região sudoeste que marca a vitória dos colonos contra companhias de terras grileiras dos governos estadual e federal. O ápice dessa luta ocorreu em 1957, mas sua herança frutificou a agricultura camponesa e inúmeras formas de resistência. 

O Fórum Regional das Organizações e Movimentos Sociais Populares do Campo e da Cidade do Sudoeste do Paraná também é herdeiro daqueles colonos e colonas corajosos que enfrentaram jagunços na década de 1950, além das tantas iniciativas de resistência que constroem a história da região.

Ao longo de 20 anos, o Fórum Regional tem ampliando a participação e a articulação com as organizações da cidade, buscando fortalecer o elo urbano e rural na perspectiva da luta unitária. O desenvolvimento social, político e econômico sempre estão no horizonte. 

*Editado por Luciana Console