Levante de Soweto: um dia para não esquecer

Que o levante estudantil da África do Sul seja inspiração para debatermos e tirarmos ações em relação ao nosso Soweto diário
Mbuyisa Makhubo carregando o corpo do jovem de 13 anos, Hector Pieterson, morto no massacre de Soweto, em 1976. Foto: Sam Nzima

Por Augusto Juncal
Da Página do MST

Quando os estudantes da Africa do Sul começaram seus protestos em 2015, um cartaz dizia “Pensei que tínhamos tido essa conversa em 1976”. A frase se referia ao levante estudantil que ocorreu em Soweto no dia 16 de Junho de 1976. O fato histórico ficou conhecido como o Massacre de Soweto, para o qual estatísticas não oficiais calculam em torno de 700 jovens assassinados e 4.000 feridos, como resultado da brutalidade policial do Apartheid.

Hoje, o dia 16 de Junho é o Dia da Juventude na África do Sul e feriado nacional. E nesse período, o debate sobre as lições a serem aprendidas pelos jovens sul-africanos de hoje, é grande e profundo. Afinal, o que mesmo mudou na vida desses jovens desde 1976 até hoje? A existência do Movimento Estudantil FEES MUST FALL já nos responde isso.

Porém, maior que o próprio massacre, é a história do levante em si mesmo. Mais do que a história de um massacre, Junho de 1976 é a história do protagonismo dos jovens negros sul-africanos e de sua consequente importância nos rumos da luta contra o Apartheid.

Até então o movimento libertador protagonizado pelo ANC (Congresso Nacional Africano) cambaleava. Estava fraco, moribundo. A prisão de Mandela e mais outros 10 líderes, tão grandes quanto Mandela, tinha sido um golpe no desenvolvimento da luta no país.

Nesse período de pouca ação, surge a voz de outro grande líder, Steve Biko, com o Movimento da Consciência Negra. São as ideias de Biko que alimentaram a revolta, mas também a coragem que levou os estudantes de Soweto ao seu levante. Inclusive, a prisão de Biko, que o conduziu à sua morte, foi na ação de sair de seu confinamento para evitar um novo levante e um novo massacre. Biko é preso a caminho dessa reunião.

Importante dizer que não foi um levante improvisado, feito no calor da revolta, houve um processo organizativo anterior ao dia 16. E que a brutalidade do regime não se deu só no dia do levante/massacre, mas que continuou nos dias subsequentes na caça dos jovens que sobreviveram.

Um caso icônico é o do jovem Mbuyisa Makhubo que aparece na famosa foto carregando o corpo morto do jovem de 13 anos, Hector Piertersen. Mbuyisa, como muitos outros jovens na época, foi perseguido e ameaçado, sendo obrigado a fugir da África do Sul. Seu último contato com sua mãe, que morreu em 2004, foi através de uma carta em 1978. Ele estava então refugiado na Nigéria. Nada se sabe dele até hoje, embora sua foto percorra o mundo.

O Apartheid como regime de governo caiu. O governo negro do ANC assumiu a África do Sul desde 1994, com a eleição de Nelson Mandela como o primeiro presidente negro. Mas hoje, 26 anos depois, os estudantes negros da África do Sul precisam se questionar: será possível  ter que conversar ainda sobre isso? A luta dos jovens de Soweto continua necessária ainda na África do Sul pós Apartheid, pois as condições concretas da vida da imensa maioria do povo negro mudaram muito pouco. E o racismo e seu apartheid continua dentro das universidades.

Que o 16 de junho da África do Sul seja nossa inspiração para pensarmos, debatermos e tirarmos ações em relação ao nosso Soweto diário, onde nossos jovens negros são massacrados as cada 26 minutos.

*Editado por Luciana G. Console