Plenária da Frente Brasil Popular chama para luta contra privatizações em MG

Debate foi transmitido online e apontou que direitos básicos como saneamento, água e energia elétrica à serviço do lucro é uma violação de direitos humanos
Foto: Reprodução

Por Íris Pacheco
Da Página do MST

A Frente Brasil Popular denunciou na última terça-feira (28) o projeto privatista e desumano do governador Romeu Zema (Novo), aliado de Bolsonaro (sem partido), em debate transmitido em sua página no Facebook. Na pauta, as privatizações da Cemig, Codemig e Copasa, em Minas Gerais, e o impacto negativo que terão para a população mineira, conforme denunciado pelas organizações e movimentos populares que têm realizado lutas e denúncias para tentar frear esse processo.

Segundo Gilberto Cervinski, dirigente nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), desafios estão colocados frente a essa realidade de ofensiva do capital sobre os recursos naturais. O contexto de extraordinária crise do capital financeiro internacional se agravou com a pandemia, com a ofensiva da direita e de governos anti populares que buscam novas oportunidades de lucro para as elites.

“O capital não vai construir novas obras de produção, o que ele disputa nessa situação é o que existe, que está nas mãos das estatais, essa é a ofensiva que disputam hoje. A conquista de novos mercados, que podem ser as privatizações das estatais ou pode ser a privatização de uma nova mercadoria, o caso da água, da educação, do SUS, que não tinha sido transformada em mercadoria, sob propriedade privada do capital”, comentou.

Nesse sentido, Liliam Daniela, do MTD MG, denunciou os impactos para o povo mineiro: “Quando se privatiza esses serviços é a população mais pobre e trabalhadora que sofre com os impactos. E isso se dá em três elementos: encarecimento desses serviços, precarização dos serviços e o trabalho em si, os terceirizados. Quem ganha os piores salários é essa parcela da população”, afirma.

Jefferson Silva, do Sindieletro – MG, comentou como o governo já vem diminuindo a participação do Estado dentro destas empresas, omitindo assim seu papel em fomentar o desenvolvimento do estado junto a iniciativas públicas e estatais, principalmente neste setor, que é a fonte de energia mais barata. De acordo com ele, é preciso “usar essa fonte de energia como alternativa, que é limpa, para garantir o desenvolvimento do estado”, apontou.

Ainda criticando a privatização da estatal elétrica, Jefferson salientou que “Romeu Zema mentiu para o povo mineiro dizendo que ia vender para gerar concorrência. Privatização não gera concorrência, privatização é custo em todos os sentidos. O que Romeu Zema está fazendo é enganar o povo, pois não tem argumentação que propicie qualquer vantagem para o consumidor”.

O projeto de privatização é um ataque à soberania nacional e aos direitos do povo mineiro e faz parte das ações do governo Bolsonaro, que no último dia 15 de julho, sancionou a lei 14.026/2020 estabelecendo um novo marco regulatório para o saneamento básico do país e facilitando assim a privatização do setor.

Conforme aponta um estudo do Instituto Transnacional (TNI), centro de pesquisas com sede na Holanda, de 2000 a 2019, 312 cidades em 36 países reestatizaram seus serviços de tratamento de água e esgoto. Entre elas, Paris (França), Berlim (Alemanha), Buenos Aires (Argentina) e La Paz (Bolívia). O processo de reestatização de empresas públicas ganhou fôlego especialmente do ano de 2009 para cá, quando foram registrados mais de 80% dos 884 casos mapeados. Ou seja, indo na contramão do mundo, o Brasil caminha para a privatização de empresas públicas brasileiras importantes para serviços tão necessários e que se relacionam diretamente com a soberania do país.

Em Minas Gerais, o governo Zema segue a cartilha de Bolsonaro e aproveita a pandemia para avançar na privatização da Copasa, Cemig e Codemig. Nesse sentido, Eduardo Pereira, do Sindágua, trouxe elementos importantes de análise sobre como esse processo de atendimento à população está diretamente ligado ao desenvolvimento humano de cada território e porque devemos nos preocupar com esse cenário.

“É uma falácia dizer que privatizar vai melhorar a vida do povo. Nosso estado é muito grande e com uma desigualdade muito grande, temos cidades com um IDH super alto versus cidades do norte de minas, por exemplo com um IDH super baixo. E quando você olha o IDH versus a renda per capita percebe que a desigualdade é muito maior. Então, quando a gente fala em privatização do saneamento é uma preocupação grande. Com a privatização, ao invés de acontecer a universalização do saneamento, vai ocorrer a precarização do serviço”, afirmou.

Além disso, há um elemento pouco divulgado, mas super importante nesse cenário, que é o gerenciamento e recuperação de mananciais por meio do Programa “Pró Mananciais”, que há várias décadas implementa ações de proteção e preservação ambiental com o objetivo de recuperar os recursos naturais das bacias hidrográficas sujeitas à exploração com a finalidade de abastecimento público.

No cenário nacional e até mesmo mundial, entramos no que tem sido chamado de ‘mercado das águas’. Com a escassez global de recursos ambientais, cada vez mais se acirra a corrida das multinacionais em torno desses recursos brasileiros, se transformando em alvo de cobiça dos setores de bebidas engarrafadas, do agronegócio e de mineradoras, gerando conflitos diversos.

A dirigente do MTD MG Liliam Daniela demarcou também a importância desses serviços essenciais como direito da classe trabalhadora: “Não é mercadoria, só para quem pode pagar”. Além disso, trouxe para reflexão o debate de soberania. “Soberania a partir da vida concreta do povo é uma pedagogia que nós, movimentos, temos que assumir. A pauta dos serviços essenciais não são só dos sindicatos ou dos trabalhadores que estão nessas empresas, elas impactam diretamente a nossa vida. Temos este desafio pedagógico de fazer com que a soberania seja um exercício permanente, não uma palavra difícil que visualizamos só lá no debate dos recursos naturais. É um pertencimento”, ressalta ela.

Desde a década de 1990, documentos da Organização das Nações Unidas, como a Agenda 21 e a Carta da Terra, já alertavam o risco da disputa pelo controle dos recursos hídricos ser o maior motivador de guerras futuras.

Seja no tratamento das águas que saem das torneiras ou no controle dos mananciais, rios e lagos, o capital estrangeiro tem nadando de braçada no Brasil, agora cada vez mais facilitado pela política de morte do governo Bolsonaro e seus apoiadores. É o caso do Projeto do senador Tasso Jereissati, que determina um novo marco do saneamento básico e pelo PL 495/2017, que cria o Mercado de Águas, facilitando a venda de outorgas entre empresas para explorar rios e fontes, fortalecendo a trilha de um movimento global no qual a água tornou-se fonte de lucro primária.

Liliam denunciou essa manobra: “o marco regulatório do saneamento é uma tragédia do ponto de vista de quem mora nas periferias e de política urbana. Metade da população brasileira não acessa serviços adequados de saneamento. Qual empresa privada vai prestar esse serviço? Como essa privatização vai gerenciar isso?”.

Há dez anos, ONU declarava acesso a água e saneamento como direito humano. No entanto, essa resolução não é realidade na vida de milhões de brasileiros e a perspectiva de se avançar para efetivar esse direito se torna cada vez mais distante.

*Editado por Luciana G. Console