Governos devem contemplar “os mais necessitados”, diz Arcebispo de Curitiba

Dom José Antônio Peruzzo celebrou missa e ajudou na distribuição de parte das 2 mil marmitas doadas na capital do Paraná neste 7 de setembro

Entrega de marmitas no Jardim Santos Andrade, em Curitiba. Foto: Joka Madruga

Por Setor de Comunicação e Cultura do MST-PR
Da Página do MST

Na data em que se comemorou o “Grito de Independência” do Brasil, 550 marmitas não foram suficientes para atender a demanda por comida em uma única praça no centro de Curitiba (PR). Trabalhadores informais e pessoas em situação de rua formaram filas para receber as quentinhas distribuídas gratuitamente pela ação Marmitas da Terra, como parte da 26ª edição do Grito dos Excluídos, nesta segunda-feira (7). 

A ação ocorreu na Praça Tiradentes, em frente a Catedral de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, onde Dom José Antônio Peruzzo, Arcebispo Metropolitano de Curitiba, celebrava uma missa para um público presencial reduzido e com transmissão ao vivo. Mobilizações de rua acontecem anualmente no 7 de setembro por iniciativa de movimentos populares e sociais. Neste ano, em formatos alternativos para evitar novas contaminações pelo coronavírus, os atos tiveram como tônica a crítica ao governo Bolsonaro e a defesa da vida em primeiro lugar na definição de políticas públicas. 

Em frente às escadarias da igreja e ao lado do marco de fundação de Curitiba, o arcebispo lembrou os muitos contrastes sociais que já marcavam o Brasil no ano da Independência, 1822. Segundo Dom Peruzzo, as desigualdades se aprofundaram ao longo dos séculos em decorrência de sistemas econômicos injustos. 

“São quase 200 anos e os contrastes e a desigualdade aumentaram. A situação é inquietante, há muita gente que antes não tinha fome e agora está com fome por não conseguir suprir suas mesas. Há causas sim, e elas são diretas e imediatas. É resultado de sistemas econômicos iníquos”, afirmou o Arcebispo. 

Dom Peruzzo defendeu a priorização da população mais vulnerável nas políticas públicas dos governos. “O Brasil está com milhões e milhões que precisam muito mais do Estado e dos governos do que outros […]. É preciso maior sensibilidade por parte de todos, não apenas de autoridades políticas, mas dos políticos é justo esperar que suas palavras, seus gestos e suas decisões contemplem os mais necessitados primeiro”, enfatizou. 

As políticas adotadas pelo governo Bolsonaro vão na contramão do que propõe o Arcebispo. No dia 1º de setembro, o governo anunciou a redução do auxílio emergencial de R$ 600 para R$ 300 a partir deste mês, se estendendo por quatro meses. Bolsonaro também vetou a maior parte dos pontos do Projeto de Lei 735, que socorre agricultores familiares durante a pandemia. Por outro lado, favorece o agronegócio com a chamada “Lei do Agro”, Medida Provisória (MP) 897, que cria facilidades para o acesso a crédito e financiamento de dívidas de grandes produtores rurais, entre outras benesses. 

A demanda crescente por marmitas no centro e na periferia da capital do Paraná dão sinais do aprofundamento da crise pela qual o Brasil atravessa. É o que relata Mirelle Gonçalves, integrante do MST e da coordenação da ação Marmitas da Terra. “A gente tem visto na rua muito mais crianças, famílias, pessoas sem um teto pra morar […]. Na periferia também temos visto uma situação extrema de insegurança alimentar, onde a população não tem acesso a emprego, não estão conseguindo o mínimo pra se manter vivos, que é a alimentação”. 

No final de maio, o número de brasileiros desempregados chegava a 9,8 milhões. 

Até a primeira semana de agosto, mais de 12,5 milhões de pessoas estavam desempregadas – um aumento de 28,6%, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A informalidade também é a realidade para  27,9 milhões de brasileiros. 

Diante das mais de 127 mil mortes por Covid-19 e do aumento dos índices de desemprego e miséria, a militante do MST classificou a postura do governo Bolsonaro como desumana. “A gente vê que a vida não está em primeiro lugar pra essa política de governo. Nós queremos cobrar que a vida esteja em primeiro lugar e reforçar que todas as vidas importam. A população precisa de terra, trabalho, participação e alimentos para ter vida digna”. 

Junto como a cada marmita entregue nestes dias, vai também a mensagem de denúncia da desigualdade. “A gente faz uma campanha de solidariedade, mas também fazemos um protesto para que isso mude e para que a gente tenha um governo que olhe para toda a população, coisa que não acontece hoje”, explica Alexandro Guilherme Jorge, presidente do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina (Sindipetro PR-SC), entidade integrante da ação de solidariedade. 

5 mil marmitas em um mutirão contra a fome 

“Diante de quem precisa, não existe outro argumento a não ser a partilha.” Foto: Jade Azevedo

Ao final da celebração realizada na Catedral, o Arcebispo Dom Peruzzo participou de parte das entregas das refeições e abençoou os alimentos, em frente às escadarias da igreja. 

“Isso é linguagem de partilha. Diante de quem precisa, não existe outro argumento a não ser a partilha. Os que têm maior sensibilidade por essa urgência certamente têm mais sensibilidade à causa do senhor Deus, é por isso que eu estou aqui para abençoar”, disse o membro da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), se referindo às pessoas e entidades organizadoras da doação de marmitas. 

As refeições foram produzidas pela ação Marmitas da Terra, realizada por cerca de 70 voluntários e voluntárias, integrantes de coletivos, movimentos e mandatos de esquerda, por iniciativa do MST.  Com apoio do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina (Sindipetro PR-SC), serão distribuídas 5 mil marmitas na periferia de Curitiba e região entre os dias 7 e 9, como parte do Grito dos Excluídos. 

Entrega de marmitas vila Monte União, em Almirante Tamandaré. Foto Ednubia Ghisi

Na segunda-feira, além das refeições entregues no centro da cidade, outras 1.450 foram distribuídas nas comunidades Portelinha, Jardim Santos Andrade e Vila Formosa – local onde um núcleo de associações de moradores organiza uma cozinha comunitária já em funcionamento todas às quintas-feiras. 

Nesta terça-feira, as marmitas foram entregues a 2 mil pessoas das comunidades Tiradentes, 29 de Março, Nova Primavera e Dona Cida, da Cidade Industrial de Curitiba (CIC); Nova Esperança, em Campo Magro; e Monte União, em Almirante Tamandaré. A ação termina nesta quarta com a entrega de mil marmitas para pessoas em situação de rua do centro de Curitiba, famílias do Sabará, na CIC, e para a Vila Santa Cruz, de Araucária. 

Botijões de gás, doados pela categoria petroleira e alimentos in natura, colhidos pelo coletivo Marmitas da Terra em áreas da Agricultura Familiar de São José dos Pinhais, também estão sendo partilhados com associações de moradores que já têm ou estão em fase de organização de cozinhas comunitárias. 

Saiba como ajudar

Produção das marmitas. Foto: Jade Azevedo

A ação Marmitas da Terra teve início no começo da pandemia e distribui de 700 a mil marmitas para pessoas em situação de vulnerabilidade toda quarta-feira. A maior parte dos alimentos vêm de acampamentos e assentamentos da Reforma Agrária e áreas da Agricultura Familiar. 

Com a atividade do Grito dos Excluídos, a iniciativa vai chegar ao marco de 17.600 refeições distribuídas desde abril. A coordenação da atividade pretende estender a ação até dezembro, e por isso lançou uma campanha de financiamento. Clique aqui e saiba como ajudar

*Editado por Fernanda Alcântara