Método de alfabetização “Sim, eu posso” torna-se exemplo de sucesso no Ceará

Alfabetização através do ‘Sim, eu posso’, do MST no Ceará, traz a esperança pela erradicação do analfabetismo
(Foto: Comunicação MST)

Por Jamile Araújo
Da Página do MST

O Ceará foi o primeiro estado do Nordeste onde o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) realizou a experiência de alfabetização de jovens e adultos a partir do método “Sim, eu posso”. O ano era 2007, e foi no Assentamento Vida Nova, onde as primeiras turmas iniciaram o processo. Houve acompanhamento de um assessor vindo de Cuba para contribuir na implantação do método no Brasil, para capacitar os educadores e educadoras. 

Maria de Jesus, da Direção Estadual e do Setor de Educação do MST no Ceará, explica que o movimento teve duas grandes experiências com o ‘Sim, eu posso’ no estado, sendo uma interna e outra externa. “No que se refere a experiência interna nos assentamentos e acampamentos, nós conquistamos a alfabetização. E nós zeramos o analfabetismo em torno de 10 assentamentos”.

(Foto: Comunicação MST)

De acordo com Jesus, nos assentamentos e acampamentos do movimento, foram mais de 1.200 alfabetizados. Nos projetos do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), realizados em parceria com universidades, foram aproximadamente 7.000 pessoas alfabetizadas.

A dirigente contou que a experiência externa foi a partir de uma parceria com a Prefeitura de Fortaleza, na qual foi possível concluir a alfabetização de cerca de 17 mil companheiros e companheiras nos bairros da periferia de Fortaleza.

A experiência, foi um ato de solidariedade do MST com as pessoas, tornou-se referência para os outros estados onde também houveram parcerias com prefeituras. “Nosso balanço é que o método ‘Sim eu posso’ para a alfabetização inicial é a melhor proposta. E para dar continuidade, com o círculo de cultura com a referência de Paulo Freire”, diz Maria de Jesus. 

A mobilização das turmas

Detalhe do caderno de estudante do programa “Sim, eu Posso” (Foto: Comunicação MST)

Em ambas experiências, a mobilização das turmas se deu a partir dos territórios onde os movimentos populares atuavam. As organizações iam formando as turmas, realizando um processo de trabalho de base  permanente.

Em Fortaleza, foram mapeadas as regiões onde havia um maior número de pessoas analfabetas. Depois, também foram mapeadas as organizações que atuavam, as associações de bairros, os movimentos, e priorizou-se trabalhar com esses territórios. “O trabalho de base não era só formar turma, mas também a escolha dos educadores, o acompanhamento que tínhamos nas turmas, com o método”, afirma Jesus.

Assim como no meio urbano, nos assentamentos, a organização da experiência de alfabetização também se deu através dos núcleos e associações locais, que contribuíram no processo de formação das turmas. 

Esperança em superar o analfabetismo é maior que dificuldades

Os principais limites que dificultaram a implementação do método de alfabetização no início foram os estruturais: aquisição de televisores, de um DVD, gravação das aulas em DVD; cadeiras. No início não havia apoio governamental.

(Foto: Comunicação MST)

Maria de Jesus relata que outro limite enfrentado foi no que diz respeito à motivação das pessoas para voltar a estudar. “Muitos diziam que ‘papagaio velho não aprende mais a falar’, ‘para que estudar?’. Outros acolhiam com muita esperança, porque sentiam essas necessidades pessoais e também coletivas para aprender a ler. Em Fortaleza, por exemplo, uma necessidade era aprender a pegar ônibus; fazer compra no supermercado; saber ler uma conta de luz, de água”, diz.

“No campo, nós também temos essas necessidades de fazer o controle, de saber escrever… As pessoas têm várias necessidades pessoais e coletivas. Nós tivemos estudantes de até 92 anos, uma senhora no Assentamento Vida Nova, em Canindé. A eficácia do método nos dá muita esperança na superação do analfabetismo em nossas comunidades e em nosso país”, reitera Jesus.

O “conhecimento liberta” e a alfabetização humaniza

Maria de Jesus acredita que a alfabetização é capaz de conscientizar, humanizar, transformar as pessoas e, ao mesmo tempo, possibilita que a pessoa não seja mais enganada, trazendo segurança, e ampliando o imaginário do educando.

Nas palavras dela, “José Martí, um grande pedagogo e revolucionário cubano, nos ensinou que ‘o conhecimento liberta’: a pessoa que é alfabetizada se torna sujeita da sua história. O acesso ao conhecimento, o direito à educação, o direito a um processo de escolarização, é uma grande necessidade da sociedade brasileira. O Brasil tem Paulo Freire, tem método que em 40 dias se alfabetiza. No entanto, nós permanecemos ainda com uma população analfabeta”.

A dirigente diz ainda que é preciso denunciar que o Estado brasileiro abandonou as políticas de educação de jovens e adultos. “Nos últimos anos não se reduziu os números do analfabetismo, então nós reivindicamos que tenham políticas públicas para a educação de jovens e adultos”, conclui.

Rompendo as cercas da desigualdade a partir das letras e das palavras

Para Jesus, a conquista da alfabetização de milhares de pessoas é uma grande alegria e um sentimento de gratidão. No estado do Ceará, foram mais de 25 mil alfabetizadas pelo “Sim, eu posso”. Milhares de pessoas que deram os primeiros passos para ler e escrever textos, ler suas contas de energia, pegar ônibus, e deram passos para avançar na superação do analfabetismo.

(Foto: Comunicação MST)

Foi com 74 anos de idade que Sebastião Gomes da Silva, do Assentamento Vida Nova, no município de Canindé, Sertão Central do Ceará, topou encarar o desafio da alfabetização.

Seu Sebastião, que participou da primeira turma de alfabetização no Ceará, em entrevista há cinco anos, falou de sua experiência: “Foi difícil, mas valeu a pena. Começamos sem nem saber direito assinar o nome e, mesmo em pouco tempo, conseguimos aprender muita coisa. A gente já deixava o horário certo para assistir aula. E eu que achava difícil a pessoa sair nesse pouco tempo aprendendo a escrever alguma coisa, fui e vi que deu certo”, relatou o Sem Terra.

Os Sem Terra acreditam que o “Sim eu posso” é um método que, além de possibilitar a realização de um trabalho de base permanente, é uma grande ação para romper a desigualdade educacional no país. “O analfabetismo não cabe na reforma agrária popular, o analfabetismo não cabe num projeto de sociedade da classe trabalhadora. Nós temos que fazer  essa grande ação acontecer nos municípios, nas comunidades, para que a gente supere o ranking e que o Nordeste deixe de ser a região com o maior número de analfabetos”, finaliza Maria de Jesus.

*Editado por Ludmilla Balduino