Ameaça de Despejo

“MP da Grilagem” ameaça famílias no assentamento Irmã Dorothy (RJ)

Alteração da política de reforma agrária pode excluir famílias Sem Terra que moram no Irmã Dorothy, no Sul Fluminense, há 15 anos
Assentamento Irmã Dorothy. Foto: Arquivo Coletivo de Comunicação MST-RJ

Por Coletivo de Comunicação MST-RJ
Da Página do MST

A Medida Provisória nº 759, também conhecida como MP da Grilagem, editada pelo então presidente interino Michel Temer em 2016, alterou diversos pontos da política de reforma agrária. Como toda Medida Provisória, a MP da Grilagem tinha prazo de validade. No entanto, em 2017 ela foi convertida na Lei nº 13.465, passando a ser definitiva.

Entre uma série de mudanças, a nova lei agrária altera o processo de seleção das famílias Sem Terra. É nesse contexto que mais de 50 famílias do assentamento Irmã Dorothy, em Quatis, localizado no Sul Fluminense, estão apreensivas em plena pandemia. Elas temem a possibilidade de serem excluídas dentro dos novos critérios que estabelecem um sistema de pontuação das famílias.

Segundo Edneia Pinto, coordenadora regional do MST, a última visita do INCRA em dezembro gerou instabilidade no Irmã Dorothy. “Vieram falar que não reconheciam ninguém como morador. Algumas famílias ficaram tão apreensivas que foram embora ou alugaram casa na cidade com medo do que possa acontecer”.

Pela regra antiga, a seleção das famílias para a reforma agrária não era feita por edital público e só poderiam participar as famílias acampadas no Irmã Dorothy ou que estivessem aguardando em outros assentamentos. A partir de 2017, podem participar da seleção qualquer pessoa que more em municípios vizinhos. Barra Mansa, Passa Vinte (MG), Porto Real, Resende e Valença podem se candidatar a um lote do assentamento Irmã Dorothy.

“Aqui temos muitos idosos, temos receio que famílias com mais força de trabalho passem por acima no edital, mas nós vamos vencer essa luta. Estamos organizados em núcleos e certos de que ou assenta todo mundo ou não assenta ninguém”, completa Edneia, coordenadora regional e moradora do Irmã Dorothy.

Infográfico: Luiza Alves/Coletivo de Comunicação MST-RJ

Ela explica que o assentamento é resultado da junção de acampamentos que acabaram se desfazendo ao longo dos anos na região. As famílias que estão desde o início da ocupação passaram por fases difíceis e de muita luta, chegando a morar embaixo de lonas, mas sempre se mantiveram unidas. É por isso que o lema “Não apaguem nossa história! Todas as famílias assentadas já” foi definido em assembleia para enfrentar esse momento.

Histórico

O processo de construção do Irmã Dorothy teve início em 2004, quando o INCRA começa a verificar se a Fazenda da Pedra era um latifúndio improdutivo. Em fevereiro de 2005, uma equipe do INCRA vai à fazenda, constata a improdutividade do imóvel e recomenda sua desapropriação para fins de reforma agrária.

Alguns meses depois, organizadas junto ao Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) e ao Sindicato de Trabalhadores Rurais de Barra Mansa, as primeiras famílias ocuparam a Fazenda da Pedra para pressionar pela criação do assentamento no local.

Durante 9 longos anos, uma decisão judicial obrigou as famílias do Irmã Dorothy a permaneceram em uma pequena área correspondente a 2% do imóvel. Em 19 de outubro de 2006 foi publicado o Decreto Presidencial que autorizava a desapropriação da Fazenda da Pedra. Ainda naquele mês, os procuradores do INCRA entraram com a ação judicial de desapropriação.

Apesar da lei estabelecer prazo de 48 horas para imissão na posse pelo INCRA, essa só veio a acontecer oito anos depois, em outubro de 2014. Mesmo assim, o assentamento só foi criado oficialmente em setembro de 2015 e desde então nenhuma família foi cadastrada.

Com o início da pandemia, a produção de alimentos do assentamento Irmã Dorothy também ficou direcionada para as ações de solidariedade. Além da Marmita Solidária, que distribuiu mais de 1.400 refeições em Resende, o assentamento já organizou Feiras Popular e o Sopão Solidário. Alimentos saudáveis da Reforma Agrária como rúcula, couve, limão, goiaba e aipim chegaram à mesa de funcionários públicos, ao hospital São Lucas e famílias em situação de vulnerabilidade.

*Editado por Fernanda Alcântara