Lindolfo, Presente!

Lindolfo Camponês, gay e sonhador, PRESENTE!

Perfil de Lindolfo, nascido numa comunidade camponesa chamada Coxilhão de Santa Rosa- PR, formada por pequenos agricultores e agricultoras e mais uma vítima da LGBTFobia
Arte: MST

Por Coletivo LGBT Sem Terra 
Da Página do MST

Lindolfo nasceu em 11 de Setembro de 1995, no município de São João do Triunfo, no Estado do Paraná, numa comunidade camponesa chamada Coxilhão de Santa Rosa, formada por pequenos agricultores e agricultoras. Lindolfo era filho de Adolpho Osvaldo Kosmaski (83 anos) e de Rosinei Luci Pereira, camponeses que, apesar de saberem ler algumas palavras ou escrever o nome, ensinaram seus 6 filhos o amor à terra, a importância da dedicação ao estudo e o imprescindível sonho de uma vida digna. 

Lindolfo cresceu no campo, aprendendo com a comunidade os valores da solidariedade e da humildade. Sendo o mais velho dos filhos, assumiu desde cedo o cuidado com seus irmãos e sua irmã. Estudou numa escola do campo, dessas que são fundamentais para um projeto de agricultura que contemple as necessidades do povo. Com seus 7 anos entrou na 1º série na Escola Rural Municipal de Coxilhão de Santa Rosa, que ficava bem próxima de sua casa. Estudou nela até o 3º ano, quando foi transferido para uma outra escola, pelo fechamento da anterior. Estudou até a quarta série na Escola Rural Municipal Manoel Ferreira de Andrade, em uma comunidade vizinha de Coxilhão do Meio. Posteriormente, transferiu-se para o Colégio Estadual Francisco Neves Filho, na sede do município de São João do Triunfo, onde permaneceu boa parte da sua adolescência.

No ensino médio, Lindolfo se destacou pelo estudo, tendo a oportunidade de realizar algumas viagens, através de um projeto cultural e interdisciplinar da sua escola que se chamava Túnel do Tempo. O projeto representava a história da agricultura na humanidade e outras temáticas ligadas à terra e à agroecologia, nos eventos da Jornada de Agroecologia organizados pela VIA CAMPESINA e o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Desde longa data, trata-se de um evento que acontece uma vez no ano no Estado do Paraná. 

No ano de 2014, ao terminar o ensino médio, participou como agricultor na Jornada de Agroecologia que aconteceu na Escola Milton Santos (EMS), centro de formação do MST, localizado no município de Maringá-PR. Lindolfo tinha o belo sonho de cursar medicina, por sua características de  cuidar e se importar com as outras pessoas, motivo pelo qual decide atuar na Escola Latina Americana de Agroecologia (ELAA) no município de Lapa/PR. Do encontro com esta escola que oferece cursos técnicos e superiores em agroecologia e licenciatura, se consolida sua paixão pela agroecologia e a Educação do campo.

Foto: Arquivo pessoal/Lindolfo

Em 2015, decidiu fazer o curso de Licenciatura em Educação do Campo, Ciências da Natureza com ênfase em Agroecologia, numa parceria entre a ELAA e a UFPR/Setor litoral. Neste mesmo período passa a participação nas atividades organizativas do MST, quando também se reconhece como gay e passa a participar do Coletivo LGBT do Movimento. Lindolfo retrata  a trajetória de quem levanta a bandeira da diversidade sexual e de gênero junto à agroecologia, dando passos mais firmes para sua liberdade e emancipação humana. E assim, com outros decide caminhar junto, assume este grande desafio de se colocar enquanto militantes desta vida.   

Em 2018, ao concluir o curso de Licenciatura em educação do campo, retorna para sua comunidade, para cuidar de seus pais. Prossegue seus estudos no Programa de Pós Graduação em Ciências e Matemática, na Universidade Federal do Paraná. 

Pelo anseio de contribuir com sua comunidade, na última eleição municipal em 2020, concorreu a vereador pelo Partido dos Trabalhadores (PT), no município de São João do Triunfo, obtendo 65 votos, o que lhe garantiu uma vaga de suplência. Nos últimos meses, estava atuando como professor da Rede Estadual de Ensino do Paraná em quatro escolas, tarefa que desenvolvia com dedicação e o compromisso de quem entende o significado histórico dos seus passos militantes. Há relatos dos educandos e das educandas que passaram pelo seu caminho, que expressam o gosto pelas suas aulas, e lembram deste como um educador aberto ao diálogo e à construção coletiva. 

Sua vida foi brutalmente ceifada no dia 01 de maio de 2021, de forma cruel. Com indícios de disparo de tiros e seu corpo carbonizado, nosso companheiro é mais uma vítima de um crime de ódio por ser LGBT assumido. Mal sabem as mãos assassinas e os responsáveis ideológicos dessa violência patriarcal que os caminhos de libertação vem sendo semeados e não se desvanecem com a morte. Como as sementes, as plantas que Lindolfo tanto amava, sua  luta seguirá renascendo, crescendo e florescendo, com cores alegres e brilhantes a cada ciclo da vida. 

Lindolfo era um jovem, camponês, gay, cheio de sonhos. Era uma pessoa conhecida pelo afeto e o cuidado; de sorriso franco e coração aberto, com um olhar alegre, que cativam abraços e amor. Um desses seres que percorrem o mundo com o coração batendo forte, aberto ao desafio de aprender, ensinar e compartilhar. Amoroso com sua família, seus amigos e sua comunidade. Defendia a vida e lutava pela educação do campo, a agroecologia e pelo direito das LGBTs viverem e amarem sem medo. Tamanho legado é impossível de ser esquecido, apagado ou carbonizado.  

Lindolfo hoje se torna símbolo das bandeiras pelas quais lutava, das bandeiras que ecoam na nossa voz. Seus sonhos são os nossos sonhos. Sua ausência física jamais será silêncio, mas clamor de justiça e liberdade sempre! 

#JustiçaPorLindolfo  

*Editado por Fernanda Alcântara