LGBT Sem Terra

O Orgulho LGBTQIA+ Sem Terra

Na luta pela Reforma Agrária Popular a bandeira não é somente pelo direito à terra e soberania alimentar, a diversidade inclui diferentes formas de amar e de existir para se impor contra o sistema patriarcal opressor
LGBT Sem Terra. Foto: Wellington Lenon

Por Jade Azevedo
Da Página do MST

O mês de junho é o mês do orgulho LGBTQIA+, comemorado em quase todo o mundo com desfiles e paradas em que vemos a bandeira arco-íris por todo lado, nas ruas, janelas, redes sociais e propagandas. Entretanto, é importante lembrar que no sistema capitalista a opressão patriarcal de gênero é constante e esta pauta deve estar conectada às outras lutas, inclusive à da reforma agrária. 

Vinicius Oliveira, integrante do coletivo LGBT do MST e educador, conta que as LGBTs sempre estiveram presentes na luta, “desde o seu nascimento do movimento, há mais de três décadas atrás, elas estavam cortando arame da fazenda, fazendo ocupação das áreas, construindo barraco, educando e construindo escolas, trabalhando no setor de comunicação, cultura e produção, plantando e cultivando alimentos”. 

Ouça aqui o depoimento de Vinicius

Segundo ele, a importância da construção do Coletivo LGBT como parte da reforma agrária, é lembrar que elas sempre estiveram presentes nesta luta, “no início invisibilizadas, sofrendo opressões, boicote, mas a partir do momento em que se coloca a diversidade em pauta, reposiciona-se a luta, trazendo a pauta para além do respeito às LGBTs, mais sim construindo coletivamente sujeitos que sejam anti-lgbtfóbicos, assim como anti-racistas, anti-patriarcais, anticapitalistas”, explica. 

Vinícius lembra que no VI Congresso, que aconteceu em Brasília, em fevereiro de 2014, o lema do Movimento passou a ser “Lutar! Construir Reforma Agrária Popular!”. Naquele espaço foram apresentadas novas linhas políticas que orientaram os trabalhos de base do movimento nos acampamentos e assentamentos com propostas que correspondiam ao novo período histórico de hegemonia do capital financeiro e ofensiva do agronegócio. 

LGBT Sem Terra. Foto: Vinícios de Oliveira

O novo direcionamento trouxe à militância e à sociedade discussões de uma nova síntese e reposicionamento de lutas que defende que a construção da reforma agrária popular deve olhar para a totalidade dos  sujeitos e sujeitas que a integram. “Para as LGBTs Sem Terra isso foi fundamental, pois deu caminho  para a pauta da diversidade sexual ser incorporada adiante, como parte da conquista da terra e direitos básicos. Expandindo o objetivo da luta para a construção de novos territórios, novas relações humanas, produção de alimentos e relações saudáveis”, ressalta Vinicius.  

Ele acrescenta que “é preciso olhar a dimensão humana e toda a sua complexidade.  Discutir sobre afetividade, sexualidade, prazer. A reflexão não pode estar somente no campo político-econômico, sem formar seres humanos omnilateralmente – produção que objetiva o homem completo pelo trabalho produtivo e pela vida em sociedade –. O ser humano tem muitas dimensões e a pauta da Reforma Agrária Popular reforça sua luta quando defende as LGBTs”, conclui.

Foto: Wellington Lenon

No ano seguinte, em 2015, no seminário “O MST é Diversidade Sexual”, realizado na Escola Florestan Fernandes (ENFF), Guararema (SP), aconteceu o primeiro encontro LGBT do MST.  Com a participação de mais de 30 pessoas de vários estados, o evento demonstrou a possibilidade de acolhimento da alteridade, do diálogo com a multiplicidade do ser humano e a necessidade de se refletir sobre o imaginário social de concepção da família “tradicional” considerada como um único modelo legítimo e abriu espaço para se pensar na possibilidade de sexualidade fluida como parte das lutas identitárias e do amadurecimento do Movimento.

Esses eventos incentivaram a pauta dentro do movimento, “o que antes estava sendo desenvolvido em espaços estaduais, saiu dali com encaminhamentos preciosos que se tornaram linhas de ação do Coletivo, no campo de visibilidade, e propiciou a organização de grupos de estudo que estão aprofundando mais e mais a pauta LGBT dentro da reforma agrária”, ressalta.

Uma luta diária

De acordo com o relatório da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais (ILGA), o Brasil ocupa o primeiro lugar nas Américas em quantidade de homicídios de pessoas LGBTs e também é líder em assassinato de pessoas trans no mundo.

Em maio deste ano, mês em que se comemorou o Dia Internacional de Luta contra a LGBTQIA+ fobia, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Paraná, perdeu um de seus companheiros, o jovem Lindolfo Kosmaski, 25, camponês, formando da Escola Latino Americana de Agroecologia (ELAA), assassinado no dia 1º de maio, em São João do Triunfo (PR), um crime motivado por homofobia.  

Inauguração do Bosque da Biodiversidade Lindolfo Kosmask. Foto: Paula Degraf Gobbo

Em resposta ao crime, diversas ações foram feitas para cobrar justiça por Lindolfo, discutir e refletir sobre o Coletivo LGBT, fortalecer o debate e construir materiais informativos, de formação, visibilidade e conscientização dos sujeitos e sujeitas dentro do movimento. 

“É preciso lutar contra o capitalismo que tem no seu pilar principal o patriarcado que oprime mulheres, LGBTS, e inclusive pessoas que não são LGBTs por controle aos seus corpos e gêneros a que eles estão sujeitos. Não é possível fazer reforma agrária sem lutar contra o patriarcado e o racismo”, argumenta Vinicius.

Como parte das ações do Coletivo LGBT, na semana do 17 de maio, a bandeira arco-íris ocupou visual e esteticamente as redes do Instagram e Facebook do MST-PR. “Durante uma semana, publicamos nossas palavras de ordem, depoimentos, simbologia, integramos militantes lésbicas, gays, transexuais e outras pessoas que se identificam com outras formas de gênero, em eventos, e programas estaduais e nacionais”, conta.

Vinícius ressalta que no Paraná, desde 2016 o coletivo está envolvido em ações no estado, fomentando diversos eventos, mesas, levando as pautas para dentro dos espaços do movimento, trabalhando em diversas instâncias e grupos.

Durante a semana do Meio Ambiente, 5 a 12 de junho, em Ponta Grossa, para comemorar os 18 anos do Acampamento Emiliano Zapata, foi inaugurado o Bosque Biodiversidade Lindolfo Kosmaski, mais uma vez a bandeira vermelha e arco-íris estavam juntas plantando resistência, luta e direitos por terra, alimentação e igualdade para todes. 

No dia 2 de Julho, o Coletivo lança um videoclipe feito por eles com a música Oração, da Linn da Quebrada, atriz, cantora, ativista social e compositora brasileira. A canção é um hino à comunidade LGBTQ+ e, em especial as trans, para espalhar amor, revelar a garra das trans, um pedido de dignidade e clamor de sobrevivência ao país que mais mata pessoas trans no mundo. 

LGBT Sem Terra. Foto: Valmir Fernandes

O que ler

Hasteemos a bandeira colorida: Diversidade Sexual e de Gênero no Brasil

Autores: Leonardo Nogueira, Erivan Hilário, Thaís Terezinha Paz e Kátia Marro (orgs.) 

Editora Expressão Popular

LGBT Sem terra: rompendo cercas tecendo a liberdade (a ser lançado)

Org. MST/Editoria LGBT/ Site: mst.org.br

LGBT Sem Terra o amor faz revolução.

Webdocumentário

Madame Satã, direção Karim Aïnouz. disponível NOW

Hoje eu quero Voltar sozinho, direção Daniel RIbeiro, disponível Netflix

Foto: Wellington Lenon

A maçã de Eva, doc, direção José Manuel Colón, disponível Netflix

Indianara, doc, direção Marcelo Barbosa e Aude Chevalier-Beaumel, disponível Canal Brasil

Alice Júnior, direção Gil Baroni, disponível Netflix

Bixa Travesty, Linn da Quebrada, direção Claudia Priscilla e Kiko Goifman, disponível Youtube Play

Paris is Burning, direção Jennie Livingston

Pose, série retratada e interpretada por pessoas trans,  disponível Netflix

Canais YouTube 

Tempero Drag (Rita Von Hunty) 

Doutora Drag (Dimitra Vulcana)

*Edição Vinícius Oliveira/ Fernanda Alcântara