Saúde Popular

Terezinha Sabino: vamos voltar a ocupar as ruas, fazer nossas lutas e ocupar terras

Em entrevista, a dirigente do Setor de Saúde do MST de Minas Gerais conta como o movimento tem lidado com a pandemia e as perspectivas pós vacinação
Terezinha Sabino, dirigente do Setor de Saúde do MST em Minas Gerais. Foto: Matheus Alves

Por Geanini Hackbardt
Da Página do MST

Terezinha Sabino de Souza, 65 anos, nasceu em Quartel do Sacramento, um distrito da pequena cidade de Bom Jesus do Galho, no Vale do Rio Doce. Filha de trabalhadores rurais, ela cresceu vendo os pais serem explorados por fazendeiros e desde cedo se envolveu em atividades sociais relacionadas às Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), participou da vida sindical rural e ajudou a criar o Partido dos Trabalhadores da cidade. Em 1993 conheceu o MST, no ato chamado Grito da Terra Brasil, por indicação da equipe de liturgia da igreja católica de Quartel do Sacramento.

No ano seguinte ela participou do trabalho de base, se tornando liderança da luta pela terra. Em 23 de agosto 1994, organizada junto à outras 28 famílias, participou da ocupação da antiga Fazenda Ministério, atualmente chamada de Assentamento Oziel Alves Pereira, onde é assentada. Atualmente Terezinha é cuidadora popular e dirigente do Setor de Saúde do MST em Minas Gerais.

Em entrevista, Terezinha relata os desafios da luta contra a pandemia nas áreas de assentamento e acampamento, bem como as formas de cuidados construídas nas comunidades. “Acreditamos que o hábito alimentar e as condições de produzir alimentos sem agrotóxicos contribuíram com a imunização dos órgãos, proporcionando forças para a recuperação”, ressaltou.

Confira a entrevista completa:

Como o setor de saúde avalia a propagação da pandemia em Minas Gerais?

A pandemia do Coronavírus vem nos surpreendendo cada dia mais. Mata nossos parentes, nossos amigos e quem a gente ama. O Setor de Saúde do MST tem desenvolvido um papel muito importante nesses tempos difíceis. Sempre reforçamos todos os cuidados como o uso da máscara de forma correta, tampando a boca e o nariz, a higienização das mãos e uso de álcool em gel e da homeopatia para fortalecer a imunidade.

Sabemos que isso não é suficiente, os casos continuam se agravando cada vez mais e os governos não tomam as medidas necessárias para garantir as condições para que a população fique em casa ou tome a vacina com mais agilidade.

A dor causada pela perda de nossos amigos e parentes, as pessoas que amamos, é irreparável. Quando esperamos a chegada da pessoa que fica internada e recebemos uma foto e um comunicado do óbito, como aconteceu com o Padre Nelito ou o Doutor Arnoldo, daqui de Governador Valadares, ficando apenas a memória dos pequenos gestos de carinho e afeto, as lágrimas correm como uma navalha na face. A dor da perca é como se deslocar do peito a corda que liga o coração ao corpo, afetando a alma e a mente.

Como o Movimento em Minas tem lidado com a pandemia nas suas áreas? Quais são as formas de enfrentamento?

Para o Setor de Saúde do MST de Minas Gerais, a taxa de disseminação do vírus foi alarmante, considerando o número de casos, de pessoas contaminadas e mortes, sem contar aqueles casos que não entraram no indicativo dos números. Consideramos não só os números, mas os corpos que se foram e temos certeza que estes se tornaram sementes para continuarmos a luta em defesa da vida.

Em Minas Gerais, as plantas medicinais vêm sendo utilizadas como recurso terapêutico, forma de enfrentamento à Covid 19, como fortalecimento para uma boa imunidade. Por exemplo o chá de limão, chá de gengibre, chá de alho, chá de alfazema, para tranquilizar a mente, o chá de manjericão, para não deixar a tristeza ocupar o espaço da alegria, mantendo assim a saúde mental. E nesse momento histórico o Setor de Saúde vem fortalecendo cada vez mais as orientações e recomendando o plantio, a conservação e o uso das plantas medicinais, que são tradicionalmente utilizadas pelas famílias do movimento devido aos conhecimentos tradicionais camponeses e às dificuldades de acesso à saúde pública.

Sabemos que uso delas é importante, porém também é preciso cuidar da alimentação. Por isso o movimento tem realizado ações de solidariedade nos 24 estados da união desde o início da pandemia, doando alimentos para quem tem fome. Percebemos que a busca por alimentos aumentou muito com os índices absurdos de desemprego que o país enfrenta. Estamos afirmando cada vez mais nossos laços entre trabalhadores, moradores das áreas periféricas das cidades, dos acampamentos e assentamentos.

Os assentamentos e acampamentos sofreram com muitas contaminações?

Os acampamentos e assentamentos do MST em Minas Gerais sofrem com contaminações da Covid -19. Nossas áreas não são ilhas fechadas, há movimentação de pessoas, visitas de familiares e vizinhos e muitas pessoas da cidade que buscam o interior para sair dos seus apartamentos nas cidades grandes.

Apesar dos vários casos de contaminação, a grande maioria do nosso povo se recuperou rapidamente. Acreditamos que o hábito alimentar e as condições produzir alimentos sem agrotóxicos contribuíram com a imunização dos órgãos, proporcionando forças para a recuperação.

Quais as perspectivas pós pandemia?

A expectativa após a pandemia, após a vacina, é a gente continuar cuidando, produzindo os alimentos e fortalecendo o Movimento.

Vamos voltar a ocupar as ruas, fazer nossas lutas e ocupar terras. A natureza do Movimento Sem Terra é a ocupação e o Setor de Saúde faz parte dessa luta no dia a dia.

Saúde é a capacidade de lutar contra tudo o que nos oprime.

*Editado por Gustavo Marinho