Agrotóxicos

Sudeste contra os agrotóxicos: Agroecologia é o caminho que favorece a continuidade da vida

Entre denúncias contra os agrotóxicos e o modelo de morte do agronegócio, a agroecologia é anunciada por movimentos e organizações como um projeto antagônico possível para a produção e reprodução da vida.
Foto: Reprodução

Da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida

Consolidando o penúltimo encontro do ciclo da mobilização nacional contra o Pacote do Veneno (PL 6299/02), e SIM à Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA) (PL 6.670/16), movimentos e organizações da Região Sudeste realizaram na última quarta-feira, 22, um debate online para apontar denúncias sobre os impactos dos agrotóxicos na vida do povo e como tem se construído outras propostas de enfrentamentos a este cenário baseadas na agroecologia.

Entre as denúncias, está o desmonte e ataque direto à política de reforma agrária no estado de São Paulo, que desde sua conquista tem garantido o direito à terra e a construção de uma outro modelo de produção e desenvolvimento para o campo.

O geógrafo e militante do MST no Pontal do Paranapanema/SP, Diógenes Rabello denuncia o PL 410/2021, de autoria do João Dória (PSDB), que estava tramitando na Assembleia Legislativa de São Paulo em regime de urgência, sendo assim apresentado pelo governador apresentou dando a entender a falta de interesse em dialogar com a sociedade ou com os principais envolvidos. Porém, o Ministério Público de São Paulo derrubou essa urgência apontando que deve haver amplo debate com as pessoas interessadas e envolvidas no tema.

“Esse é o PL da titulação, que prevê alterar todo esse conjunto de diretrizes em relação a fornecer para as famílias assentadas da reforma agrária o título de domínio da terra. Temos entendido que esse projeto de lei, agora com um parecer do Deputado Mauro Bragato, que incluiu um artigo abrindo possibilidades para regularização da grilagem de terras no estado, ataca nossos direitos e a soberania dos povos do campo e fere o direito do acesso à terra por meio da reforma agrária.”

Por outro lado, assim como diversas experiências que temos no país afora, a resistência também tem ocorrido não só em âmbito estadual, mas também municipal e local. Historicamente, a população paulistana vive no “tucanistão”, somam-se décadas de administração tucana que desgasta o cenário político e intensifica o processo de privatizações. Da luta dos movimentos, para pelo menos equilibrar a balança da desigualdade, surge a Política Estadual de Agroecologia e Produção Orgânica (PEAPO) e a Política Estadual de Redução de Agrotóxicos (PERA).

A arquiteta e urbanista, integrante do Comitê Paulista da Campanha contra os agrotóxicos, Susana Prizendt abordou um pouco desses elementos. “A PEAPO é uma lei que tramitou na ALESP e foi criada com muita participação da sociedade através de consultas públicas, sancionada em março de 2018 pelo governador do estado, porém, ela não foi regulamentada. Ela traz o fortalecimento do processo de transição agroecológica, fornece incentivo de apoio para se criar planos municipais e regionais de agroecologia. Teríamos um estado com agricultura familiar fortalecida e com nível decrescente de agrotóxicos na terra e na água.”

Suzana explicou ainda que, apesar de serem duas iniciativas complementares que dialogam muito a PERA ainda é um PL e não tramitou para ser votado na ALESP. A redação do texto do PL buscou trazer para a dimensão estadual as principais pautas da PNARA, entre elas suprimir a capina química urbana e a pulverização aérea.

Subindo de São Paulo para Minas Gerais o cenário é tão complexo quanto o anterior. As denúncias se configuram a partir da capina química urbana em diversos municípios, inclusive próximo aos cursos d’água, que já conta com um grave fluxo de contaminação por agrotóxicos. São várias as regiões que sofrem com monoculturas de eucalipto, café, cana, soja, tomate, entre outros. Também há um intenso impacto sobre a fauna e a flora provocando a morte de abelhas, peixes e outros componentes.

Fernando Rangel relatou que em Minas Gerais há muitos megaempreendimentos e atuação do agronegócio que tem uma relação intrínseca com a contaminação e o racismo ambiental. “Normalmente são os grupos e comunidades mais vulneráveis os primeiros a sofrerem danos e revitimização, como as comunidades quilombolas e outros povos e comunidades tradicionais. Ou seja, estes empreendimentos causam destruição tanto para o meio ambiente quanto para os povos que habitam esses territórios, inclusive nas áreas urbanas. É sempre o povo pobre que se alimenta de produtos mais baratos, industrializados, com alta carga de agrotóxicos. Raros são os estados que aplicam a taxação do ICMS aos agrotóxicos.”

O processo de resistência da luta dos trabalhadores/as rurais, quilombolas, povos tradicionais, geraizeiros, caatingueiros, ocorreu de forma muito violenta com expulsão dessas populações do campo. No entanto, também fruto da luta, foi construído um Plano de Ação da Estratégia Intersetorial de Redução do Uso de Agrotóxicos e Apoio a Agroecologia e a Produção Orgânica em Minas Gerais (PLANERA), durante o governo Pimentel, que reuniu diversas organizações e movimentos sociais, garantindo ampla participação, e que foi instituído via decreto, todavia a atual gestão de Zema não o executa.

Para essa luta no âmbito Legislativo é fundamental contar com os mandatos comprometidos com a vida. Importante ressaltar que são vários os deputados e deputadas que diariamente se colocam nessa trincheira, entre os que puderam estar presente nessa atividade estão os deputados federais Nilto Tatto (PT-SP), Padre João (PT-MG), Deputada Claudia Visoni (PSOL-SP), da Mandata Ativista, agricultora urbana, pela segurança e soberania alimentar, Mandato da Marina Helô (confirmada) e a Deputada Estadual Marcia Lia (PT-SP)

Dossiê contra o Pacote do Veneno e Pela Vida

O esforço para unir denúncias em torno do “Pacote do Veneno”, que tramita no Congresso, segue nessas mobilizações de âmbito regional. Um deles é dar visibilidade ao “Dossiê contra o Pacote do Veneno e em Defesa da Vida”, um estudo reúne 35 autores/as e compila pesquisas e posicionamentos de dezenas de organizações brasileiras contrárias ao uso de agrotóxicos, lançado no quarto dia da Mobilização Nacional Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.

A Biomédica e pesquisadora da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Karen Friederich, relatou que os/as pesquisadores/as envolvidas neste trabalho, desafiaram-se a avaliar parte dos impactos que ocorreriam frente a aprovação do PL do Veneno, sobretudo diante do bojo de retrocessos no âmbito legislativo para controle e redução dos agrotóxicos no Brasil.

“Esse cenário em que se dá a discussão do PL do veneno é um contexto muito preocupante. Nos últimos anos, de 2016 a 2020, foram liberados mais de dois mil agrotóxicos no Brasil, sendo o maior número nos últimos dois anos e meio. Outro caráter que é preocupante e que temos a necessidade, é de monitorar resíduos de agrotóxicos em água e alimentos in natura e industrializados”, ressaltou.

Recentemente o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) realizou uma pesquisa onde apontou diversos agrotóxicos em alimentos industrializados. Todos os agrotóxicos encontrados nos alimentos analisados estão presentes nas lavouras brasileiras, como o glifosato, herbicida mais usado no mundo. Em 2015, a Iarc (Agência Internacional para Pesquisa sobre Câncer), da OMS (Organização Mundial da Saúde), concluiu com base em centenas de pesquisas que o glifosato era “provavelmente carcinogênico” para humanos. No Brasil, a Anvisa decidiu no ano passado manter a liberação do glifosato, mas com restrições (clique aqui para baixar o dossiê).

Os contrapontos científicos e técnicos a este projeto ganharam forma nas mais de 300 do livro Dossiê e é uma produção da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO); Associação Brasileira de Agroecologia (ABA); da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, em parceria com a Articulação Nacional de Agroecologia e apoio do Instituto Ibirapitanga e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Conta ainda com prefácio assinado por Leonardo Melgarejo e João Pedro Stédile, e posfácio de Leonardo Boff.

A Campanha também propõe que entidades, movimentos e bancadas também protocolem esse documento nos endereços de e-mail dos deputados e deputadas.

Para ampliar a mobilização, entidades e movimentos sociais farão seminários regionais virtuais, a partir desta semana. As ações estão previstas para ocorrer sempre às 18h e transmitidas pelas redes da Campanha. Clique aqui para saber mais sobre as ações nas outras regiões.

*Editado por Fernanda Alcântara