Resistência

Despejo na pandemia é crime! Famílias Sem Terra denunciam reintegração de posse em PE

Famílias Sem Terra do assentamento Antônio Conselheiro, em Gameleira/PE vivem sob ameaça de despejo; no último dia 21/10, o MST realizou ato com autoridades e lideranças para sensibilizar a sociedade sobre a inconstitucionalidade da ação
Famílias do assentamento Antônio Conselheiro foram surpreendidas com uma liminar de ação de reintegração de posse em 2019 e se encontram sob ameaça. Foto: Vilma Maria.

Por Francisco Terto
Da Página do MST

Cerca de 800 companheiros/as Sem Terra, que vivem no assentamento Antônio Conselheiro (São Gregório, Alegre I e II) do MST, localizado em Gameleira na Mata Sul de Pernambuco, foram surpreendidos com uma liminar de ação de reintegração de posse no ano de 2019 e, seguem em constante resistência à ameaça de despejo.

Com o intuito de sensibilizar a opinião pública e a sociedade da inconstitucionalidade da ação, no último dia (21/10) foi realizada uma atividade na área do assentamento com autoridades dos poderes municipais e estaduais, assentados/as e lideranças do MST entre estas; Jaime Amorim, da Direção Nacional do MST; Jô Cavalcanti, co-deputada presidenta da Comissão de Direito Humanos da Assembleia Legislativa de Pernambuco (ALEPE), o prefeito do município Leandro Ribeiro, seis advogados(as) das famílias, vereadores e os secretários de agricultura e cultura, além da presença do Padre José Antônio.

A ação foi pedida por uma imobiliária que teria supostamente comprado as terras da Usina Estreliana e deferida pela 26ª Vara da Justiça Federal de Palmares, direcionada diretamente contra o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e que atinge frontalmente às famílias assentadas da comunidade.

Diante do cenário de sucateamento intencional da Política Nacional de Reforma Agrária por parte do Governo de Bolsonaro, expressa-se como mais um agravante da situação conflituosa já tensionada das famílias, já que o Incra está sendo usado como aparato institucional e ideológico contra o MST.

Histórico

A área é ocupada por 110 famílias do MST desde 1995 . O espaço foi se formando uma comunidade tipicamente camponesa, hoje uma comunidade já constituída, que corre o risco de ver toda sua história de vida se transformar em pó. Segundo o MST, o mais grave é que as famílias que já se encontram assentadas, vivendo em lotes de terras, podem perder o direito à terra, pois, os agentes do estado até o momento não conseguiram propor uma saída digna para resolver o conflito, ao contrário, apontam o despejo como a única saída. Trata-se de uma reversão do processo de Reforma Agrária na área.

Com área de 912,29 hectares foram classificados como propriedade improdutiva em 1997, e o imóvel foi declarado de interesse social para fins de Reforma Agrária e emitido na posse para se tornar assentamento. As famílias passaram a diversificar a produção e atualmente os/as assentados/as estão plantando: macaxeira, batata doce, abacaxi, feijão, milho, banana, coco, fava, manga, cana-de-açúcar, jaca, laranja, acerola, mamão e etc.

O assentamento atualmente é um grande polo de produção de alimentos da Reforma Agrária em Gameleira, como também para toda Região da Mata Sul pernambucana. Os/as assentados/as fornecem produtos para feiras locais, ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), para o Centro de Abastecimento e Logística de Pernambuco (CEASA/PE) e para as ações de solidariedades, explica a dirigente do MST na região, Vilma Maria. “O despejo arbitrário como este pode representar perda de renda e trabalho, além dos 800 camponeses/as diretamente afetados, também atinge para mais de 4 mil pessoas indiretamente”.

Às famílias se encontram sob a ameaça de um despejo real, que não foi realizado até o momento, pois o mesmo juiz (26ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Palmares – PE) entendeu, seguindo as orientações do Conselho Nacional de Justiça e a posterior decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que o estado de calamidade pública engendrado pela pandemia da Covid-19 impede a realização de despejos.

O fim próximo do estado de calamidade, entretanto, poderá levar à execução do despejo, e, portanto a incontáveis violações de direitos das famílias assentadas na área. Segundo Vilma, a real possibilidade da ação de despejo se efetivar no pós-pandemia, já foi sinalizado aos advogados/as dos/as assentados/as.

Há mais de 26 anos que as famílias Sem Terra vivem no local, hoje com escolas, igrejas, produção agrícola e posto de saúde. Nesse sentido, o MST conclama a sociedade a se somar nas denúncias sobre as arbitrariedades do Incra, da Usina Estreliana e parte do judiciário em mais este ato de desumanidade.

*Editado por Solange Engelmann