PL 410

Governo Doria pretende privatizar a reforma agrária

Proposta se compromete a não regularizar a grilagem de terras públicas no estado de São Paulo, mas ainda mantém privatização
Agricultores lotaram as galerias da Alesp em dia de votação do “PL da Grilagem”. Foto: Alesp

Da Página do MST

A Associação dos Funcionários da Fundação ITESP (AFITESP), o MST, a Comissão de Direitos Humanos da OAB, o Ministério Público do Estado de São Paulo, a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CONDEPE), diversos pesquisadores ligados a universidades, entre outras organizações, vêm denunciando que o Projeto de Lei nº 410/2021, apresentado em 26 de junho de 2021, propõe a privatização das terras públicas estaduais através da titulação de domínio aos lotes em assentamentos rurais e a regularização da grilagem de terras públicas no estado.

De acordo com as entidades citadas, a obrigatoriedade do processo de titulação, conforme prevê o PL, impõe ao assentado uma dívida compulsória com o Estado, estando assim em nítido desacordo com o previsto na Constituição Federal, que garante ao beneficiário, em seu Artigo 189, o direito de livre escolha entre o Título de Domínio (TD) ou a Concessão de Direito Real de Uso (CDRU). A proposta também contraria a Constituição Estadual, que prevê, em seu Artigo 187, que “a concessão real de uso de terras públicas far-se-á por meio de contrato”, não havendo previsão legal para o Título de Domínio, conforme proposto pelo governo do Estado.

Considera-se que, frente à conjuntura atual, com crescente redução de recursos destinados ao fomento da agricultura familiar, desemprego estrutural e conjuntural, e crises econômica, política e institucional, uma equivocada titulação dos assentamentos estaduais poderá contribuir para o agravamento do cenário descrito, com empobrecimento da população rural e urbana de inúmeros municípios no Estado, desconfiguração dos assentamentos enquanto comunidades de direitos, trabalho e vida, “inchaço” das periferias das cidades, redução da produção e encarecimento dos alimentos, ameaçando, também, a segurança alimentar e nutricional da população paulista.

As entidades expõem ainda que, como não bastassem os riscos contidos no PL em sua redação original, somaram-se, também, os riscos advindos de parecer emitido pelo relator especial do PL na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP). Por meio de emenda, foi proposta a modificação da ementa do Projeto de Lei, acrescentando-lhe artigo 4º que, conforme sua redação, possibilitaria “a alienação, onerosa, a pessoa natural, de terras devolutas ou presumivelmente devolutas, mediante pagamento de preço fixado […]”. Tal proposta, caso acatada, possibilitaria a regularização da grilagem de terras públicas no estado de São Paulo, transferindo para as mãos dos grileiros em torno de 1 milhão de hectares de terras públicas, permitindo aos ocupantes irregulares (grileiros de terras) regularizar as áreas ilegalmente ocupadas mediante pagamento, acabando com qualquer possibilidade de arrecadação de terras devolutas para a implantação de novos assentamentos rurais. 

Frente a ampla mobilização popular, às denúncias apresentadas por diversas entidades, à repercussão na imprensa e à polêmica resultante, após acordo entre as lideranças das bancadas na ALESP, o Projeto de Lei foi retirado de pauta no mês de dezembro de 2021, com o compromisso, por parte do Governo do Estado, de que seria criada uma comissão para melhor discutir e aprimorar o PL, superando os pontos de maior gravidade e divergências.

Decorrido o tempo, em reunião ocorrida nesta terça-feira (08) entre lideranças do governo, de partidos de oposição, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e representantes de assentamentos do estado, foi firmado, por parte do Governo, o compromisso em retirar de votação o polêmico artigo 4º, evitando, assim, a entrega de imensa fração do estoque de terras públicas estaduais a grandes ocupantes irregulares. Com relação à CDRU, o Governo afirma não haver espaço para a inclusão no Projeto de Lei, medida amplamente defendida pelas entidades já mencionadas e que garantiria aos assentados o direito de escolha entre as duas modalidades de titulação.

Por fim, considerando-se o quadro descrito, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Associação dos Funcionários da Fundação ITESP (AFITESP), reconhecem a importância dos diálogos e o avanço representado pela retirada do mencionado artigo 4º e destacam a necessidade de que o Governo cumpra com o acordo firmado nesta manhã. Ressaltam, ainda, sua continuidade na defesa pela inclusão da alternativa da CDRU, como maneira de se garantir o direito de escolha dos assentados e assentadas e fazer cumprir a previsão constitucional. 

A votação ocorrerá nesta terça-feira (08), às 15h30, em sessão extraordinária que se realizará de maneira virtual, dificultando a mobilização popular por parte dos interessados. A sessão poderá ser acompanhada pela TV Alesp no Youtube através do link: https://www.youtube.com/channel/UCYnRWbd-tDDYf9zgCUlwxFw.

*Editado por Fernanda Alcântara