Preservar e Produzir
Plantio de árvores aliado à produção de alimentos é resposta para preservação e renda no campo
Por Anelize Moreira
Da Página do MST
O crescimento da área ocupada por atividades agropecuárias entre 1985 e 2020 foi de 44,6% no Brasil, segundo dados Mapbiomas sobre o uso do solo nas últimas décadas. E de que forma a agricultura e a pecuária ocuparam 85 milhões de hectares no período? Deixando rastros de destruição.
O desmatamento e as mudanças climáticas provocadas pela expansão agrícola do agronegócio, tem ameaçado cada vez mais os biomas, com a superexploração de recursos naturais.
Por conta deste cenário de avanço de degradação ambiental no país, é que o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que já vinha com ações de agroecologia e contra os agrotóxicos, amplia mais uma frente de produção sustentável, aliando o plantio de árvores com o cultivo de alimentos.
“Para contrapor os ataques e crimes ambientais, temos o intuito de plantar árvores aliada a produção de alimentos. Elas são também uma forma de diversificar os agroecossistemas e trazer mais diversidade produtiva”, diz Bárbara Loureiro, coordenadora do Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis criado pelo MST há dois anos.
Recuperar áreas naturais é importante para combater e mitigar os efeitos das mudanças climáticas, e uma estratégia para garantir a segurança hídrica e alimentar. Além disso, as árvores ainda podem ter diversos usos: frutas, sementes, cascas, raízes, madeira e para diferentes fins tanto alimentares quanto medicinais.
“As árvores também garantem mais resiliência para esses agroecossistemas, porque quando aumenta a diversidade, ele tem mais condições de se recuperar de algum fenômeno, como queimada, seca, enchente ou erosão. A ideia é produzir alimentos saudáveis, mas também conservar a biodiversidade e recuperar o que precisa ser recuperado”.
Além da preservação ambiental, o plantio de árvores vai colaborar para organização de cadeias produtivas dos assentamentos e acampamentos e na geração de renda dessas famílias.
“Tem várias formas, mas primeiro é com a produção de mudas e a coleta de sementes. Então nós temos olhado para os viveiros de muda, também como uma linha produtiva, não só comercializar as mudas nativas e frutíferas, mas o uso múltiplo desses viveiros. As famílias têm produzido mudas de hortaliças, medicinais e ornamentais para trazer mais diversificação, essa é uma das possibilidades de geração de renda”, explica Loureiro sobre o plano que já implantou mais de cem viveiros em diferentes lugares do país.
Outra forma de introduzir as árvores na produção de alimentos são os sistemas agroflorestais, os SAFs e os assentados aprendem a técnica por meio da capacitação em cursos.
Bárbara explica que, em cada bioma, a agrofloresta adquire uma característica específica. Por exemplo, uma agrofloresta no semiárido é diferente da agrofloresta da Mata Atlântica, seja por questões ecológicas, culturais, produtivas ou alimentares.
Francisco de Souza mora no assentamento há 26 anos e afirma que a prática de manejo florestal sempre esteve presente na rotina de produção dos assentados a importância de preservar a natureza e os recursos naturais para as futuras gerações.
Porém, com a introdução da atividade apícola potencializou a necessidade de preservação das áreas e consequentemente o plantio de árvores frutíferas.
“Além de melhorar a nossa alimentação no dia a dia, as mudas para produção de frutas, também proporcionam uma maior produtividade das abelhas, uma vez que vai ter maior disponibilidade de néctar nas plantas e esse néctar vai ser levado para as abelhas produzirem mel. Então além do aumento de produção de frutas, temos uma boa produção de mel. Isso vai impactar diretamente na renda das famílias, principalmente agora nesse período chuvoso, que varia entre os meses de dezembro e março no semiárido piauiense”, diz.
Francisco conta que um dos desafios é organizar a comercialização dessa produção. No ano passado eles conseguiram vender o mel no Armazém do Campo em BH e isso aumentou a renda das famílias por ser um espaço de venda de produtos da reforma agrária.
“O que nós estamos construindo é uma cooperativa dos apicultores do assentamento e acreditamos que esse será um instrumento que vai nos ajudar a superar alguns gargalos na comercialização. Muitas famílias ainda comercializam para os atravessadores por preços bem abaixo do mercado, então a cooperativa além de dar maior visibilidade ao nosso produto, também proporciona o alcance a mercados mais rentáveis para as famílias assentadas”, afirma o apicultor.
Desde 2016, houve inúmeros retrocessos em políticas públicas de incentivo à agricultura familiar. Bárbara Loureiro diz que uma das contribuições da geração de renda é a possibilidade de permanência no campo.
“Uma das grandes pressões nos territórios é a renda. As famílias que não conseguem produzir, não conseguem terreno, elas acabam também sendo pressionadas pelo agronegócio para vender esses lotes e ir para cidade e viver em condições muito precárias. Então essa é uma forma de dar condições e alternativas concretas de sistemas produtivos que são possíveis e viáveis, você diminui essa pressão do agronegócio”, explica a coordenadora do plano.
Ao longo destes dois anos de Plano Nacional foram plantadas dois milhões de árvores, aliada a produção de alimentos saudáveis. A meta do movimento é plantar 100 milhões de árvores em 10 anos. A ideia é mapear neste ano as iniciativas por regiões e saber quantos hectares são dedicados a essa prática.
Edição: Douglas Matos/ Brasil de Fato