MST e as Eleições

“A derrota do Bolsonaro nas urnas, significa a derrota do latifúndio e do agronegócio”, afirma Alexandre Conceição

Em entrevista, integrante da direção nacional do MST, fala sobre a importância da luta política para construção da Reforma Agrária Popular
Alexandre Conceição, da direção nacional do MST. Foto: Gabriel Paiva

Por Wesley Lima
Da Página do MST

O MST ocupa com força o cenário da política eleitoral com candidatos, construindo Comitês Populares, a campanha do presidente Lula e apontando desafios significativos na organização dos trabalhadores e das trabalhadoras. Em entrevista para Página do Movimento, Alexandre Conceição, da direção nacional do MST, fala sobre a importância da luta política para construção da Reforma Agrária Popular e analisa o atual cenário agrário e econômico que atravessa o país.

Para ele o governo Bolsonaro atuou na defesa de uma política latifundista, pautada no agronegócio e na exploração dos bens naturais. E por isso: “esse momento agora, requer muita unidade dos movimentos populares, com os partidos e com a campanha do presidente Lula, para que possamos de fato derrotar aquele que vem tentando derrotar o país como Estado Nação, como Estado Brasileiro, destruindo as instituições, a política pública, modificando o orçamento nacional para as mãos do ‘centrão’, fazendo políticas de currais”, denuncia.

No ponto de vista dos desafios e tarefas, Conceição sinaliza que as candidaturas de 15 trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra para esse momento político é uma resposta do Movimento à sociedade, para os partidos de esquerda e para Lula. Ele explica que os candidatos serão porta-vozes da luta pela terra, da luta pela reforma agrária, da solidariedade, da defesa do meio ambiente e contra a política neofascista do governo Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes.

Confira a entrevista na íntegra:

O atual momento político tem posicionado o debate eleitoral com centralidade nos movimentos e organizações do campo e da cidade. Qual é a urgência e a importância dos trabalhadores e das trabalhadoras se posicionarem concretamente neste período de luta política?  

O atual momento político é bastante delicado. O presidente tem destruído a soberania nacional, tem ameaçado a democracia e tem gerado uma crescente ameaça violenta contra o nosso povo. Sem contar que é um governo incompetente e, ao mesmo tempo, busca destruir os direitos da classe trabalhadora. O país voltou para o mapa da fome, com mais de 33 milhões de pessoas que acordam e não sabem o que vão comer; as áreas de produção de alimentos vêm diminuindo; e a inflação dos alimentos vem tomando conta dos lares no Brasil. Portanto, é um momento muito delicado. É um momento de ameaça, mas também é um momento em que as organizações populares, junto com a campanha do Lula e com os partidos, tem buscado reagir com muita força e ênfase, desde o início da pandemia com a tomada do isolamento produtivo do MST, a solidariedade e, ao mesmo tempo, com o avanço das mobilizações que nós tivemos em 2021 com o Fora Bolsonaro!

Esse momento requer muita unidade dos movimentos populares, com os partidos de esquerda e com a campanha do presidente Lula, para que possamos de fato derrotar aquele que vem tentando derrotar o país como Estado Nação, como Estado Brasileiro, destruindo as instituições, a política pública, modificando o orçamento nacional na mão do “centrão”, que faz políticas de currais. Ou seja, estamos em um momento delicado, um momento que esta em jogo a democracia, e a retomada da construção desse país.

Os movimento sociais, que atravessaram uma pandemia terrível, com o negacionismo do Bolsonaro, chegaram em um momento importante das nossas organizações e das nossas mobilizações. Entendemos que o resultado dessas eleições vai influenciar diretamente o futuro do nosso país e por isso, o MST se coloca a disposição na luta de classe no Brasil, nesse processo eleitoral, na centralidade para derrotar o Bolsonaro e o bolsonarismo.

O governo Bolsonaro desmontou as políticas de acesso à terra e de produção de alimentos saudáveis, paralisando as ações desenvolvidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e cortando drasticamente o orçamento do órgão público. No ponto de vista da luta pela Reforma Agrária, como esse desmonte tem impactado no dia a dia do povo brasileiro?

Infelizmente a vitória do Bolsonaro, também significou a vitória do velho latifúndio atrasado, em aliança com o agronegócio. Hoje, quem está governando o país é o latifúndio, o agronegócio depredador e as igrejas pentecostais conservadoras. Então, a luta pela terra e pela reforma agrária está atravessando também esse momento delicado, porque o governo Bolsonaro criou mais de 180 memorandos, orientações para tirar o poder do Incra, para desmobilizar o Incra. O instituto hoje não tem dinheiro nem para fazer o cafezinho, imagine para reforma agrária.

A política de reforma agrária do governo Bolsonaro é a política do latifúndio. Garantindo a concentração de terra, destruindo a reforma agrária enquanto política pública e investindo na destruição da política de reforma agrária como uma política de produção de alimentos. Portanto, a luta pela reforma agrária no atual momento, passa essencialmente pela centralidade da derrota de Bolsonaro nas urnas, que também significara a derrota do latifúndio e do agronegócio. Por isso nós estamos seguindo a orientação do MST, que é garantir o desenvolvendo da produção de alimentos mesmo com a destruição da política pública, sem o PAA [Programa de Aquisição de Alimentos], sem o PNAE [Programa Nacional de Alimentação Escolar], sem um projeto de assistência técnica.

Nós seguimos produzindo alimentos. E nesse mesmo intuito da produção de alimentos, temos a tarefa de seguir produzindo solidariedade. Aquilo que temos feito ao longo da pandemia, com a luta da reforma agrária, é atacar o latifúndio, produzir alimentos e derrotar o governo de Bolsonaro para que a reforma agrária ganhe uma nova perspectiva de futuro.

Que iniciativas o MST, outros movimentos e organizações do campo brasileiro têm tomado no enfrentamento aos desmontes das políticas voltadas para os/as camponeses/as no Brasil?

Nós como Movimento Sem Terra adotamos, inclusive durante a pandemia, a política de isolamento produtivo para que possamos seguir produzindo alimentos, nos acampamentos, nos assentamentos, cuidando da saúde, cuidando da não disseminação do vírus, diferentemente do Governo Bolsonaro. Nós provamos para o Brasil e para o mundo, que a reforma agrária e a agricultura familiar camponesa são responsáveis pela produção de mais de 70% dos alimentos.

A solidariedade também teve um papel estratégico para o MST. Através da doação de alimentos, avançamos no diálogo com o povo brasileiro e, por isso, até dezembro do ano passado nós distribuímos 6 toneladas de alimentos, mais de 1 milhão de quentinhas, mais de 170 mil livros e participamos efetivamente de todas as mobilizações nacionais pelo Fora Bolsonaro. Por isso que o MST com suas iniciativas, buscou no Congresso Nacional aprovar a Lei Assis Carvalho, em 2020, e o governo Bolsonaro vetou; aprovamos em 2021 a mesma Lei, chamada Assis Carvalho 2, que garante um crédito emergencial, um fomento para os trabalhadores e as trabalhadoras rurais produzirem ainda mais alimentos, mas o governo Bolsonaro vetou novamente.

O MST tem apontado as candidaturas como espaços de luta política, posicionando a retomada da Reforma Agrária. Que desafios o MST tem enxergado nesse processo?

Nesse processo de resistência, desde o golpe contra a ex-presidenta Dilma [em agosto de 2016] e da prisão do presidente Lula, (…) nós seguimos construindo a luta pelo Fora Bolsonaro, a luta política de solidariedade com a classe trabalhadora e nesse sentido, o MST se colocou a disposição e a altura do momento histórico para avançar na luta pela democracia. Nesse intuito veio o desafio, colocado pelos partidos, pelo Lula e pela própria sociedade nos vários estados, de que a gente necessitava também participar do processo eleitoral.

O MST tem disponibilizado 15 candidaturas, sendo elas três candidatos à reeleição para deputado federal, mais três novos para deputado federal no Maranhão, Goiás e em Brasília, e as demais candidaturas todas para deputados e deputadas estaduais em seus respectivos estados. Então, o processo eleitoral é um desafio muito grande para o MST.

Nas suas candidaturas, os nossos candidatos serão sempre porta-voz da luta pela terra, da luta pela reforma agrária, da solidariedade, na defesa do meio ambiente e contra a política neofascista do governo Bolsonaro e do ministro Paulo Guedes. Por isso, o MST está, não só, no processo eleitoral na disputa com nossas candidaturas, mas efetivamente acompanhando toda a campanha do presidente Lula. Ajudando com ideias e propostas para o plano de governo, atuando efetivamente na coordenação nacional através da equipe nacional de mobilização, mas também com o grande desafio de seguir construindo os Comitês Populares.

Os Comitês Populares serão, sem dúvida, um grande desafio para que a gente possa organizar a sociedade em núcleos de base e que esses Comitês possam servir para organizar a campanha, para que ela seja massiva e em defesa da democracia. Nossas candidaturas precisam refletir e fortalecer essas iniciativas para politizar e avançar no trabalho de base através do voto.

*Editado por Solange Engelmann