Ataque

Agrava-se ameaça contra ambientalistas no Norte de Minas: fazendeiro demarca arbitrariamente área em litígio

A área em que vive os ambientalistas Maria Izabel e Clailson Gonçalves foi cercada sem que a Justiça tenha resolvido processo de partilha em juízo
Agricultores e ambientalistas, Maria Izabel da Silva e Clailson Gonçalves. Imagem: Reprodução Mtcbrasil

Por Mtcbrasil

No dia 06 de junho de 2022, Maria Izabel da Silva, agricultora e ambientalista, fez mais um boletim de ocorrência. Ela e seu esposo, Clailson Gonçalves, são moradores do Sitio Barreiro Azul, localizado da zonal rural de Varzelândia, norte de Minas Gerais. À polícia, Maria Izabel relatou que na manhã do dia 31 de maio, o fazendeiro José Pereira, mais conhecido na região como “Zé Ruim”, compareceu na sua propriedade, área de cerrado preservado. Segundo ela, o fazendeiro levou uma engenheira ambiental para fazer medições e levantamentos na área, sem o consentimento de Izabel.

Não se trata de uma “rixa” entre vizinhos. O casal de ambientalistas tem sido ameaçado a deixar o sítio onde moram há cerca de 15 anos. Maria Izabel afirma ser herdeira legítima da área, antes pertencente à família dela. No entanto, a parcela de terra foi vendida, sem que o processo de partilha da herança fosse realizado pela Justiça.

Não é a primeira vez que Maria Izabel, que também é coordenadora do Movimento dos trabalhadores e trabalhadoras do Campo (MTC), é pressionada por José Pereira a revelia do processo judicial. Por duas vezes, ainda em janeiro deste ano de acordoboletim de ocorrência também registrado, ele levou policiais para a residência do casal, sendo que uma das vezes sem que eles estivessem presentes na casa.

Euclides Lopes, um vizinho do casal, afirma que o José Pereira disse ao policial que “o filho dele quer vir resolver do jeito dele”. Segundo Lopes, o fazendeiro estava com dois policiais armados. “Eu fui e falei que não adianta brigar porque, não vai resolver nada, além do seu filho, vir aqui brigar, se ele matar alguém, ele vai preso e se alguém matar ele vai preso também. Tem que ser resolvido na justiça e não com as próprias mãos.”, completou.

Mais uma vez, o fazendeiro não foi sozinho. Segundo Maria Izabel, além da engenheira ambiental, ele levou gado e o soltou em área preservada. “Por orientação da nossa advogada, colocamos uma cerca para que o gado não entrasse no nosso quintal, que possui hortaliças, ervas medicinais e árvores”, disse. A ambientalista também oficiou o caso na Secretaria Estadual de Meio Ambiente de Minas Gerais.

Além do MTC, outras organizações têm acompanhado o caso.  Ainda relacionado às primeiras denúncias de Maria Izabel, o advogado Aldinei Leão, do Centro de Referência em Direitos Humanos (CDRH), localizado em Montes Claros, afirmou monitorar a questão, ainda que o conflito esteja no âmbito do direito individual. “Nós queremos garantir que as providências sejam tomadas em relação às ameaças. Nós encaminhamos junto ao município as questões sociais envolvidas, pois há uma grande vulnerabilidade social e psicológica envolvida”, disse Leão à época.

No entanto, os órgãos de segurança do estado de Minas Gerais pouco ou nada fizeram. “Já foram diversos boletins de ocorrência, ofícios, manifestações de organizações de direitos humanos. Enquanto não há a decisão judicial, estamos sob graves ameaças e sob muita pressão. Temos acompanhamento psicológico, mas porque o MTC providenciou. A gente continua no temor que ele venha a fazer outra ação ainda mais grave e a situação já é muito difícil, pois não temos acesso à água potável, já que o poço está sob intervenção do sr José Pereira”, afirmou Maria Izabel.

O risco das milícias

Segundo pronunciamento do deputado federal Rogério Correia (PT-MG), realizado na Câmara Federal no dia 13 de junho, fazendeiros do Norte de Minas têm contratado jagunços para “fazer justiça com as próprias mãos”, sem esperar ou obedecer a decisões judiciais.

O parlamentar anunciou naquele dia que esteve no Ministério Público do seu estado para pedir a abertura de investigação sobre o que ele chamou de “formação de milícias no Norte de Minas Gerais”.Segundo o deputado, “qualquer ocupação que possa haver em terras improdutivas, sem que haja determinação judicial, provoca a formação de milícias, o pagamento de jagunços e de ex-policiais da reserva”.

A situação preocupa o MTC, por se tratar da mesma região onde vivem Maria Izabel e Claison. “Há uma conjuntura de incentivo à violência no campo. Ela vem através das declarações do próprio presidente Bolsonaro e uma crença na impunidade oferecida no âmbito político. Estamos há meses juntos de Izabel e Clailson buscando a Polícia, os órgãos do Governo de Minas, a Parlamentares. Há um silêncio completo do estado neste caso”, disse Adriano Ferreira, da coordenação do MTC.

Na denúncia feita pelo deputado Rogério Correia, há um levantamento de pessoas ameaçadas, lista organizada por movimentos sociais e cruzada com informações do Programa de Proteção à Pessoa Ameaçada de Morte e do próprio Ministério Público. Até o fechamento desta matéria, o processo não teve andamento dentro do MP-MG.

Confira pronunciamento: