Aromas de Março

Aromas de Revolução vem das Mulheres Indígenas

Coluna Aromas de Março deste mês traz o movimento de retomar seus territórios ancestrais
Foto: Juliana Pesqueira (@jupesqueira)

Por Atiliana Brunetto e Judite Stronzake
Da Página do MST

Chega setembro e os aromas de lutas se espalham pelo ar, assim como março, trazem aromas de rebeldia das mulheres indígenas e também o colorido da resistência da diversidade em flores. As mulheres indígenas enaltecem suas ancestrais com lutas pela terra e pela vida, mantém viva a memória da boliviana indígena Bartolina Sisa através das retomadas de terras. São mulheres as protagonistas das maiores lutas por Territórios Indígenas.

O dia 05 de setembro é dia Internacional da Mulher Indígena, instituído durante o II Encontro de Organizações e Movimentos da América Latina e Caribe, em Tihuanacu, Bolívia, data escolhida em memória ao assassinato de Bartolina Sisa, em 1782, mulher quéchua que foi esquartejada durante a rebelião anticolonial de Tupac Katari, no Alto Peru 

Os povos indígenas tem travado muita luta de resistência e persistência em defesa de seu tekoha, por sua história e ancestralidade, e nos dão exemplos de coragem. Junho de 2022, foi marcado entre os mais violentos no estado de Mato Grosso do Sul, pois mau o Brasil e o mundo fecharam o caixão do indigenista Bruno Pereira no Recife e as despedidas ao jornalista Dom Philipe, quando a caçada por ar e por terra aos Guarani e Kaiowá de Amambai-MS, se desatou sem dó nem piedade, um violento genocídio. A ordem veio do alto do comando do Governo Estadual, sem ordem judicial, sem aviso prévio contra uma comunidade em luta pelas suas terras ancestrais na retomada Guapo´y Mirim Tujury nos limites da Aldeia Amambay. 

Foi o Massacre de Guapo´y, eram chuvas de balaços de verdade lançados sob as cabeças dos indígenas, a polícia militar que desde as 4 da manhã daquele 24 de junho, não deixou nem crianças, nem adolescentes, nem mulheres idosas de fora dos alvos das balas desde o clarear do dia até o pôr do sol. Foram 12 horas ininterruptas de ataques por agentes do Estado, predominantemente efetivos da polícia militar, bem apetrechados em suas caminhonetes, camburões e, como se isso não bastasse, com “apoio” aéreo de um helicóptero com voos rasantes, montou um cenário de guerra metralhando a população indígena. 

Uma guerra insana, desproporcional, feita com armamentos pesados e homens bem treinados contra uma comunidade, que resistiu com suas flechas e arcos, suas pinturas de colorau no rosto e com a força do seu mbaracá, das suas rezas e cantos.  Sem ter o direito de pensar para sua vida defender ficaram a mercê das balas disparadas, tamanha atrocidade resultou em assassinato. O sangue de Vitor Fernandes regou a retomada, tornou-se uma potência mobilizadora que, no dia 27 de junho, durante o sepultamento, transformou a terra Guapo´y em mais um território que retorna aos braços de suas filhas, e mais uma vez as mulheres a frente trazendo consigo a coragem dos rituais, sob os sons e cantos sagrados, e bem ali naquele local continuam as mulheres plantando esperançar e alimentação. 

Foi mais uma tragédia ocorrida em territórios atualmente tomados pela monocultura de soja/milho transgênico plantado por empresas, com a finalidade de exportação, onde lá na ponta da cadeia produtiva serão transformados em ração para animais em países estrangeiros, são produções colhidas e vendidas nos balcões do mercado internacional onde os negócios são mais lucrativos para o agronegócio, ficando para a população água envenenada, fome e doença. 

As comunidades indígenas em todo o Brasil têm buscado espaço para exercer seu modo de vida. Espaço que não têm mais dentro dos limites das centenárias aldeias criadas na época do extinto Sistema de Proteção os índios (SPI), se vendo obrigadas a sobreviver do trabalho explorado por empresas internacionais, como o corte de cana, para o setor da indústria sucroalcooleira e também pelo processo de arregimentar, tanto no Brasil como em países vizinhos, onde trabalham em condições análogas à escravidão. 

Para superar a fome e conquistar seus territórios ancestrais, mães, mulheres, crianças e jovens ampliam as Retomadas em todo o espaço territorial brasileiro, no contexto atual é uma revolução no enfrentamento ao agronegócio. Saem caminhando de pés descalços em direção a suas ancestralidades que fora subtraída por latifundiários e grandes empresas internacionais do agronegócio. Aquelas mulheres querem plantar alimentos: mandioca, batata doce, abóbora, amendoim, etc., pra que logo mais tenham alimentos para seus filhos e filhas. 

O 21 de setembro é dia das árvores, anunciando que logo chega a Primavera, momento que deveria ser de muita plantação de árvores em toda América Latina e todos continentes, deveria ser de cores, alegrias na produção da umidade do ar, onde, chegamos na marca de 12% da umidade do ar no MS, estatística pior que o deserto do Saara é de 14%, porém a busca desenfreada pelo lucro do sistema capitalista tem matado a beleza do meio ambiente através de incêndios, desmatamento, mineração é o saqueio dos territórios.

Terra para os povos originários é Mãe, mais que o lugar de habitação, de plantação, é parte dos corpos, é um modo de vida e de espiritualidade. As mulheres indígenas sempre tiveram um papel fundamental na defesa dos territórios, da natureza e da vida dos povos originários. As agriculturas indígenas, quilombola e camponesa significam alternativa à crise mundial capitalista que a pandemia da Covid 19 escancarou. A crise é o mesmo modo corporativista de produção e distribuição de alimentos, cujo único objetivo é a acumulação de riqueza de forma cada vez mais rápida e com profundo padrão de destruição. Controlado por algumas empresas monopólicas do agronegócio, bancos e gigantes redes de supermercados, este modo capitalista de produzir e distribuir alimentos estão na raiz da crise alimentar e dos agudos problemas sociais que o Brasil e o mundo enfrentam. 

As mulheres indígenas, quilombolas, camponesas e Sem Terra, exercem práticas agrícolas fundamentadas em uma perspectiva orientada pela necessidade de reproduzir a vida em todas as dimensões. É uma práxis consciente que visa a ecologia da vida social: o fim do trabalho explorado e do patriarcado. Não é a mera obtenção de dinheiro, mas respeito aos ciclos da natureza, cujos ritmos são acompanhados a partir de uma concepção agroecológica que envolve a reciprocidade entre seres humanos, meio ambiente e práticas equilibradas entre todas as espécies que habitam a casa comum – a Terra. 

Setembro traz a luta das mulheres indígenas, força entrelaçada com o grito de socorro da mãe natureza. Defender a natureza é defender nossas vidas!

*Editado por Fernanda Alcântara