Comunicação

Eleger Lula é o primeiro passo para avançarmos na democratização da comunicação

Na luta pela Democratização da Comunicação, não há condições para se avançar em um governo de fake news e ataques à democracia
Foto: Felipe Cabral

Por Janelson Ferreira
Da Página do MST

No último dia 17 de outubro foi celebrado o Dia Nacional de Luta pela Democratização da Comunicação. A data faz referência à luta por uma comunicação mais democrática como peça-chave para construção e garantia da própria Democracia. E, em um período de profundos ataques às bases democráticas no Brasil, defender uma comunicação livre e popular é tarefa de todas/os aquelas/es que buscam combater o avanço reacionário em nosso país. 

Dentro do MST, a comunicação sempre assumiu um papel político central. Em nossas primeiras ocupações, era função do Boletim Sem Terra (que, mais tarde, assumiria o nome de Jornal Sem Terra) ser instrumento de formação política, de mobilização das massas e de diálogo com a sociedade. As bases lançadas por aquele instrumento até hoje fundamentam a Comunicação Sem Terra. Ela também assume um caráter popular, visto que a classe trabalhadora, em especial, as famílias Sem Terra, a constrói a partir da luta contra o latifúndio e pela Reforma Agrária Popular. 

Acampados lendo o Jornal dos Trabalhadores Sem Terra. Foto: Douglas Mansur

Ao longo dos governos Lula e Dilma, foram possíveis diversas conquistas em torno de uma comunicação mais democrática e pública. No entanto, o golpe contra a Presidenta Dilma, em 2016, representou também uma derrota da Comunicação Pública. Desde então, o que se verifica é um total abandono, retrocesso e aparelhamento da área por parte do Governo Federal. 

Conferência foi marco na democratização da comunicação 

Em 2009, durante o segundo mandato do então presidente Lula, foi realizada a 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom). Com a participação de mais de 30 mil pessoas, nas etapas locais, estaduais, regionais e nacional, a Conferência buscava discutir os desafios e apontar caminhos estratégicos para a formulação e implementação de políticas públicas na área. Além disso, ela permitiu o envolvimento significativo de diversos segmentos da sociedade civil, os quais puderam participar ativamente na formulação destas propostas. 

Ainda que a conjuntura política verificada após a realização da Conferência Nacional tenha apresentado uma série de limites para a implementação das propostas, foi possível perceber ganhos importantes. Fruto daquele processo, o Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados representaram, ainda que necessitando de correções, avanços importantes para se construir uma comunicação mais democrática e livre no Brasil.

Realizada em 2009, Confecom envolveu mais de 30 mil pessoas em seus debates. Foto: Divulgação

O legado deixado pela Confecom passa, sobretudo, pelo amplo esforço em realizar um debate com toda a sociedade acerca dos rumos da Comunicação no Brasil. Este exercício da democracia, que amplifica as possibilidades de diálogo, considerando as especificidades locais e regionais do país marcou a realização da Conferência. 

Contudo, o Governo Bolsonaro desmontou todos os mecanismos democráticos de participação da sociedade civil (não somente na área da Comunicação). O que se verifica é que, além da ausência de uma estratégia de Comunicação, os rumos da área são decididos por setores empresariais e reacionários. Como exemplo, temos o caso de algumas empresas de comunicação (Record, Jovem Pan e SBT em nível nacional), militantes aliados à Jair Bolsonaro (principalmente, no caso dos chamados “blogueiros conservadores”), setores das Forças Armadas e de igrejas neopentecostais. 

Estes segmentos, diversas vezes, atuam de forma articulada, se apropriando do Estado e agendando uma pauta que vai contra as reais necessidades da classe trabalhadora. Contam com isenção de impostos, destinação de verba publicitária e direcionamento especial do orçamento público. Um importante exemplo de apropriação e desmonte pode ser verificado com a Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

No Governo Bolsonaro, EBC foi desmontada e instrumentalizada

A Empresa Brasil de Comunicação foi criada em 2007, fruto das discussões do 1º Fórum Nacional de TVs Públicas. Sua intenção é de ser uma empresa que preste serviços de radiodifusão pública, além de administrar emissoras de rádio e televisão públicas federais. 

Ainda que tenha papel central na criação de um sistema público nacional de radiodifusão, uma das promessas de campanha de Bolsonaro, em 2018, era “acabar com a EBC”. No entanto, o que se viu após sua eleição foi, além do aprofundamento de seu desmonte, iniciado com Michel Temer, em 2016, um aparelhamento da empresa. 

EBC foi criada em 2007 para ampliar radiodifusão pública em nível nacional. Foto: Divulgação

Atualmente, a EBC é vinculada ao Ministério das Comunicações, coordenado por Fábio Faria, Deputado Federal (PSD-RN) pertencente ao “centrão” e genro de Silvio Santos, dono do SBT. O diretor-presidente da EBC, Glen Lopes Valente, também tem em seu histórico profissional vínculos com a emissora de Silvio Santos. Ele já ocupou a direção-executiva Comercial e de Marketing da empresa. 

A forma como Bolsonaro aparelha e instrumentaliza a EBC remonta à ditadura militar, na qual importantes meios de comunicação tinham papel fundamental na consolidação do regime ditatorial. Pautas fundamentais do último período, como a pandemia de Covid-19, a falta de respiradores nos hospitais de Manaus, o avanço da vacinação, entre outros, deram lugar ao ufanismo às forças armadas, cobertura de atos irrelevantes de Bolsonaro e a disseminação do negacionismo característico do atual governo com relação à pandemia. 

O aparelhamento chegou a tal nível que o Governo Federal ordenou que a empresa comprasse três novelas produzidas pela TV Record, de propriedade do bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus e aliado de Bolsonaro. Custando em torno de 3 milhões de reais cada uma das novelas, duas delas tem temáticas bíblicas: Os Dez Mandamentos, produzida em 2015, e a Terra Prometida, de 2016. 

Este aparelhamento distorce os objetivos da empresa, a qual deveria criar e difundir conteúdos que contribuíssem para o desenvolvimento da consciência crítica da população. A EBC representa uma importante conquista na luta pela democratização da comunicação no Brasil e a sua defesa, reconstrução e ampliação é fundamental em um futuro sem o Governo Bolsonaro. 

A instrumentalização da EBC é uma das táticas usadas pelo bolsonarismo para enraizar seu projeto de destruição do país. Além desta, a sofisticada máquina de disseminação de mentiras criadas pelos militantes de extrema direita pode ser considerada como uma das principais ameaças à democracia brasileira atualmente.

Bolsonarismo criou verdadeira máquina de mentiras

Na última década o Brasil tornou-se importante palco de produção e disseminação de fake news, desinformações e mentiras que são usadas como estratégia para obtenção de ganhos políticos e econômicos. É certo que estas estratégias não surgiram com o boom das redes sociais, nem na eleição de Jair Bolsonaro, em 2018. No entanto, é necessário considerar que as estruturas das redes favorecem o crescimento das fake news, as quais tornaram-se arma central do bolsonarismo.

Esta relação entre redes sociais e fake news se deve muito em função da forma como estas plataformas operam, baseadas em uma lógica de captura de usuários e dados, afim de melhor direcionar suas publicidades e propagandas. Este direcionamento permite que a abrangência e circulação destas fake news sejam potencializadas nas redes. 

Fato é que as fake news hoje são ferramenta política fundamental no crescimento da extrema direita, inclusive em nível mundial. O golpe contra Dilma Rousseff, em 2016, a eleição de Bolsonaro, em 2018, e a expressiva votação do ex-militar no primeiro turno, em 2022, são reflexos, entre outros motivos, da utilização das fake news como arma na construção e disseminação do medo, da violência e da desinformação. 

Levantamento produzido pela agência “Aos Fatos” demonstra que o número de vezes em que Bolsonaro mentiu somente cresceu ao longo de seu mandato. Estas declarações falsas, muitas vezes servem de matéria-prima para uma intensa produção de peças digitais que são difundidas em massa pela militância bolsonarista nas redes sociais. 

Em 2019, Bolsonaro deu uma média de 1,6 declarações falsas ou distorcidas por dia. No ano seguinte, o número subiu para 4,36. Já em 2021, o número de mentiras chegou a quase 7 por dia. O que torna mais macabra a situação é que metade destas declarações se referia à pandemia de covid-19. 

Bolsonaro deu 7 declarações falsas por dia em 2021. Foto: Gabriela Biló

O combate às fake news passa, necessariamente, pela alteração da estrutura e do modelo de negócios das empresas donas das plataformas. Não enfrentar este problema a partir de sua base estrutural, significa oferecer saídas falsas a uma das principais ameaças à democracia atualmente. 

Portanto, a derrota de Bolsonaro nas urnas, em 30 de outubro, faz com que o futuro governo tenha que se debruçar na elaboração de marcos regulatórios e de combate a tal prática. Combater as fake news em nível estrutural, desarticulando politicamente, financeiramente e intelectualmente os grupos de extrema direita voltados à produção e disseminação delas deve estar na ordem do dia do próximo governo. 

Ataque à jornalistas também é marca do Governo Bolsonaro

O cenário atual no país também é marcado por um sistemático ataque à jornalistas e aos seus exercícios profissionais. E o presidente da República, sua família e corpo ministerial são uns dos principais responsáveis por estes ataques. 

Segundo dados da Repórter Sem Fronteiras, no primeiro semestre de 2021, o número de ataques do chefe de Estado brasileiro contra a imprensa aumentou 74% em relação ao segundo semestre de 2020. Ao todo, Jair Bolsonaro realizou 87 ataques contra jornalistas, número que o torna o principal agressor naquele período.

Os postos seguintes de principais agressores são ocupados por Eduardo Bolsonaro (85 ataques), Carlos Bolsonaro (83) e Flávio Bolsonaro (38). Ao todo, foram 331 ataques realizados pela família Bolsonaro e ministros aliados à imprensa, um aumento de 5,41% em relação ao segundo semestre de 2020.

No primeiro semestre de 2021, Bolsonaro realizou 87 ataques à imprensa. Arte: Repórter Sem Fronteiras

Certamente, parte relevante destes ataques são direcionados a profissionais de empresas que contribuíram para o avanço do bolsonarismo no país. Contudo, é necessário considerar que muitos destes jornalistas compõem a classe trabalhadora brasileira e estão inseridos em uma dinâmica de superexploração do trabalho, assédio e precarização de direitos trabalhistas nas empresas em que trabalham. 

Além disso, os ataques de Bolsonaro e pessoas próximas possui um nítido recorte de gênero. Em um cenário já marcado pela violência em suas diversas formas (84% das jornalistas já relataram alguma situação de violência psicológica), Bolsonaro mira seus ataques, preferencialmente, em jornalistas mulheres, expondo, humilhando e, muitas vezes, estimulando seus seguidores a repetirem os mesmos atos.  

Eleger Lula é o primeiro passo para avançarmos na Democratização da Comunicação

Posto todo este grave cenário, é possível afirmar que não há condições para se avançar na democratização da Comunicação com um Governo Bolsonaro. Por isto, derrotá-lo nas urnas é a primeira tarefa para avançarmos nesta pauta.

A tarefa de toda/o Comunicadora/Comunicador é apontar Lula como a única alternativa para sairmos deste lamaçal que Bolsonaro enfiou o país. Foto: Ricardo Stuckert

A eleição de Lula representa um sopro de esperança frente a possibilidade da classe trabalhadora ter condições de discutir amplamente os rumos, desafios e limites da construção de uma Comunicação democrática e popular no Brasil. É Lula quem pode apresentar as condições de realização de uma nova Conferência Nacional de Comunicação, a qual poderá discutir novas e velhas questões. 

Sendo assim, a tarefa de toda/o Comunicadora/Comunicador Popular até o próximo dia 30 de outubro é dialogar com o povo e apontar Lula como a única alternativa para sairmos deste lamaçal que Bolsonaro enfiou o país. Para isto, temos em nossas mãos importantes ferramentas de comunicação, criadas pelas lutas da classe trabalhadora. O tempo de afiá-las já passou. É chegado o tempo de usá-las. 

*Editado por Fernanda Alcântara