Consea Voltou

Lula recria Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

O Conselho atua no assessoramento à Presidência da República na formulação, avaliação e monitoramento de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional
Também formam reempossados os Conselheiros e a Presidenta do órgão. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Por Janelson Ferreira
Da Página do MST

Na manhã desta terça-feira (28), o Presidente Lula assinou o decreto que reinstalou o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA). Na ocasião também foram reempossados os Conselheiros e a Presidenta do órgão, Elisabetta Recine, que compunham o Conselho quando ele foi desativado, em janeiro de 2019.

O Conselho atua como órgão de assessoramento da Presidência da República na formulação, avaliação e no monitoramento de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. Importante espaço de participação e controle social, agora ele estará vinculado à Secretaria-Geral da Presidência da República.

Composto por dois terços de representantes da sociedade civil e um terço de indicações governamentais, o CONSEA integra o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN) e tem caráter consultivo. Entre outras atribuições, é responsável por propor à Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN) as diretrizes e prioridades da Política e do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, com base nas deliberações das Conferências Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional.

O órgão foi criado em 1993, pelo então Presidente Itamar Franco. Mas, em 1995, Fernando Henrique Cardoso o substituiu pelo Programa Comunidade Solidária. Ao tomar posse para seu primeiro mandato, em 2003, Lula recriou o Conselho, o qual se manteve ativo até 2019, quando, em um de seus primeiros atos, Jair Bolsonaro o desativou.

“O primeiro ato do Presidente anterior foi destituir o CONSEA, e o primeiro ato do Presidente Lula foi determinar que nós restituíssemos o CONSEA”, lembrou Márcio Macêdo, Ministro Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República. “De todos os problemas que enfrentamos no país, o mais vergonhoso, revoltante e criminoso é o da fome”, destacou Macêdo.

“Quando a gente confia no povo e permite que o povo decida que política a gente vai implementar, a certeza do sucesso é muito real”, destacou Lula. Segundo o Presidente, o governo tem o desafio de recuperar o direito do povo, não apenas de comer três vezes ao dia, mas de andar de cabeça erguida, de ter orgulho de ser brasileiro, de ter um trabalho descente, de ter uma escola de qualidade. “Eu acredito que a gente pode fazer este país voltar a sorrir, estar de barriga cheia e o povo trabalhar, estudar”, destacou.

Wellington Dias, Ministro do Desenvolvimento Social, afirmou que o evento serviu como um momento de pacto por um Brasil sem fome. “Vamos tirar o Brasil do mapa da fome e da insegurança alimentar. Queremos alimentação saudável, produzida por quem mais precisa de renda, alimentação e que possa garantir qualidade de vida”, disse Dias.

CONSEA deve contribuir para o fim da fome no Brasil, afirma presidente do órgão recriado. Foto: Olga Leira

Elisabetta Recine, que assumiu o cargo de Presidenta do CONSEA, afirmou que o órgão estará totalmente comprometido com o fim da fome no Brasil. “Não acabaremos com a fome, garantindo alimentação adequada, saudável e sustentável se não tivermos um compromisso amplo e verdadeiro dos diferentes setores de governo para atingirmos a raiz deste problema”, afirmou Recine.

Doutora em Saúde Pública pela USP, Elisabetta Recine coordena o Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (Opsan) da Universidade de Brasília. Desde 2021, integra o Painel de Especialistas de Alto Nível do Comitê de Segurança Alimentar Mundial da Organização das Nações Unidas (CSA/ONU). É a única brasileira entre os 15 cientistas que compõem a entidade.

CONSEA foi responsável por propor políticas como PAA e PNAE

Durante a posse, a nova Presidenta destacou que partiu do CONSEA diversas iniciativas no combate à fome e na busca por uma alimentação saudável. “Foi aqui que nasceu o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), a obrigação de 30% das compras do PNAE (Programa Nacional de Alimentação Escolar) ser destinado à agricultura familiar”, explicou a Presidenta.

O Programa de Aquisição de Alimentos foi criado em 2003, no contexto das ações do Fome Zero. Ele buscou viabilizar a compra institucional dos produtos da agricultura familiar, articulando a necessidade de alimentos gerados pelas políticas de assistência social e abastecimento, com a necessidade de comercialização da agricultura familiar.

Entre 2003 e 2020 foram destinados 4,3 bilhões de reais para o programa, com aquisição de mais de 500 tipos de alimentos diferentes. Em 2012, ano de maior execução do programa (quase 840 milhões de reais), mais de 18 mil entidades que atuavam no atendimento a pessoas em situação de insegurança alimentar. Apesar desta relevância, em 2021 o Governo Federal não apontou nenhuma iniciativa para assegurar a execução do Programa.

Além do PAA, o Programa Nacional de Alimentação Escolar é outro instrumento fundamental na garantia de alimentação saudável para escolas públicas, assegurando que 30% da compra viesse da agricultura familiar. Cerca de 40 milhões de estudantes eram atendidos por esta política. O PNAE já vinha há anos com defasagem dos valores das compras. A proposta de reajuste chegou a ser proposta na Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023. No entanto, Bolsonaro vetou a proposta, por, segundo ele, não atender ao interesse público.

O CONSEA é o guardião da comida de verdade, aquela que reconhece os saberes, sabores, fazeres e falares”, destacou Recine.

De acordo com a doutora, está na ordem do dia o debate sobre os sistemas alimentares, no âmbito internacional e local. Daí a necessidade de se articular combate à fome, à pobreza, obesidade e crise climática, tendo também o foco na transferência de renda, geração de emprego e valorização do salário mínimo, com a garantia de terra e território.

Extinção de órgão mobilizou organizações populares desde 2019

Desde que Bolsonaro determinou o fechamento do CONSEA, em todo país, centenas de organizações populares, ex-integrantes do órgão e os Conselhos estaduais se uniram para denunciar a política do Presidente anterior. Ao longo de quatro anos, por meio de banquetes públicos e intervenções, as organizações buscaram sensibilizar a sociedade sobre a importância da comida – no campo, na cidade, nas florestas e nas águas – promovendo debates e agendas que envolveram agricultores, cozinhas, pesquisadores e diversos outros militantes em geral.

Campanha “Gente é Pra Brilhar, Não Para Morrer de Fome”, organizada pelo movimentos sociais denunciou a destruição do CONSEA. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Fruto desta mobilização foi a criação da Campanha “Gente é Pra Brilhar, Não Para Morrer de Fome”, que articulou mais de 200 cozinhas solidárias em todo país, as quais serviram milhares de refeições. Em setembro de 2021, promoveu o Tribunal Popular da Fome, que acusou, julgou e condenou o Governo Federal por violações ao Direito Humano à Alimentação e a Nutrição Adequadas e ao Direito a Estar Livre da Fome.

Na verdade, eles nunca conseguiram acabar com o CONSEA, eles desmancharam a estrutura legal que existia, mas muita gente que participava do Conselho continuou lutando, organizado, tentando combater a fome”, reconheceu Lula.

“Todos os desafios enfrentados durante a pandemia demonstraram que as respostas apresentadas pelo campo popular podem sim transformar a sociedade e as políticas a partir da soberania alimentar e do respeito ao direito humano à alimentação”, afirmou Elisabetta Recine.

Banquetaço

A retomada do Consea é uma medida esperada por todos os cidadãos e cidadãs que lutam contra a fome e a insegurança alimentar que assola o país – sinalizam as centenas de organizações que compõem o Coletivo Banquetaço.

Para comemorar a volta do Conselho, nesta segunda (27), o Coletivo Banquetaço promoveu celebrações  em todas as grandes regiões do país, onde foram realizadas atividades em 70 cidades, distribuídas em 15 estados.

Entre elas, foram organizados banquetes públicos, rodas de conversa, cursos, seminários, palestras, plantio e distribuição de mudas e intervenções artísticas; com o propósito de conscientizar a sociedade sobre a importância de um órgão como o Consea, para que haja comida de qualidade e em quantidade suficiente para a população.

*Editado por Solange Engelmann