Luta pela terra

A luta por terra e água nos perímetros irrigados pelas famílias Sem Terra na Bahia

Luta pela terra e água no estado marcam a disputa de projetos no semiárido baiano
Foto: MST na Bahia

Por Coletivo de Comunicação do MST na Bahia
Da Página do MST

Desde fevereiro (18/02), cerca de 500 famílias ocupam o Perímetro Irrigado do Projeto Nillo Coelho, no município de Casa Nova, na região Norte da Bahia, a área hoje ocupada equivale a um total de 1.600 hectares de terra pública.

As famílias reivindicam a área ocupada para fins de Reforma Agrária e assentamento das famílias Sem Terra, além de cobrar o cumprimento do acordo estabelecido no ano de 2008, entre Governo Federal, Estadual, Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (CODEVASF) e Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) para aquisição de 13.000 hectares de terra para o assentamento de 1.000 famílias, acordo este que não foi cumprido em sua totalidade e apenas 192 famílias foram assentadas e 5.550 hectares de terra adquiridos.

“Estamos há 15 anos aguardando o cumprimento deste acordo que foi estabelecido entre Governo Federal, Estadual e CODEVASF, para o assentamento das 1.000 famílias, tanto no perímetro irrigado, como também nas áreas que seriam adquiridas justamente para assentar as famílias”, destaca a direção do MST na região.

“A agricultura familiar precisa ter espaço nos perímetros irrigados com água à vontade, com terra à vontade, semeando a resistência e o sonho de se produzir e cultivar alimentação saudável em terras destinadas exclusivamente ao agronegócio que são terras públicas. A ocupação das famílias é uma retomada do espaço do perímetro irrigado para solicitar ao Governo Federal que retome as tratativas que dizem respeito ao perímetro irrigado e assentamento das famílias Sem Terra. Esse espaço foi pensado para o agronegócio, para grandes empresas e fazendas, não pensando, dessa forma, na agricultura familiar”, comenta o Movimento.

Foto: MST na Bahia

Perímetros irrigados e a concentração de terras para o agronegócio

Os perímetros são frutos do processo de transposição do Rio São Francisco, cujo objetivo é levar as águas do manancial aos pequenos agricultores e às comunidades carentes, porém, na prática, esse ideal não se concretiza.

Existe toda uma cadeia do agronegócio que disputa as áreas do perímetro com as famílias Sem Terra. Esse processo de disputa na via institucional tem travado o desenrolar das negociações com a CODESVASF para garantir as diversas e reiteradas desapropriações.

Em 2005, com a transposição do rio São Francisco houveram diversas manifestações em defesa do rio e dos ribeirinhos, para contemplar a agricultura familiar com terra e água, não apenas beneficiar o agronegócio. Esse processo resultou em várias manifestações na região, inclusive a ocupação de 1.000 famílias em uma área do Projeto Salitre. Houve a reintegração de posse sem nenhum diálogo e as famílias ficaram desamparadas.

Já em abril de 2007, houve reocupação da área antes de ser inaugurada a primeira etapa do Perímetro Irrigado Salitre, as 1.000 famílias Sem Terra constituíram o Acampamento Abril Vermelho, nas proximidades de uma das casas de bombas mantidas pela CODEVASF, exigindo infraestrutura para os assentamentos e acampamentos.
 
Mediante acordo firmado entre Governo Federal, Governo do Estado e as famílias em 2008, de assentar de imediato 1.000 famílias, sendo 600 em uma área de 13.000 hectares cedida pela CODEVASF e 400 famílias pelo INCRA, do qual apenas 5.550 hectares foram entregues e assentadas somente 192 famílias, nem a CODEVASF cumpriu o acordo de disponibilizar a área de mais de 13.000 hectares, nem o INCRA de assentar as 400 famílias. Couberam às famílias um prazo de 60 dias para desocupar a área, cujo foi cumprido antes do prazo, destacando como o único termo do acordo cumprido.

Foram assentadas apenas 192 famílias em três áreas distintas no município de Sobradinho (BA), ficando as 808 famílias que não foram contempladas à espera de novas áreas.

Devido ao não cumprimento dos acordos, ao longo dos tempos, houveram inúmeras denúncias por parte dos trabalhadores e trabalhadoras rurais Sem Terra através de audiências públicas, carta aberta, Ouvidoria Agrária, INCRA, MDA, Ministério Público e Manifestações Públicas, porém não houve em momento algum um posicionamento de resposta.

Com o não cumprimento dos acordos, após 04 anos de espera às margens da estrada, os trabalhadores reocupam o Projeto Salitre (Juazeiro) e ocuparam o Projeto Nilo Coelho (Casa Nova) em 2012. Em momento algum houve resistência em desocupar essas áreas, por parte dos trabalhadores, desde que fosse cumprido o acordo por completo pela CODEVASF, INCRA, Governo Estadual e Federal.

O desfecho da sentença de despejo ocorreu na madrugada do dia 25 de novembro de 2019, de forma truculenta e violenta, sem levar em consideração a presença das mulheres, crianças e idosos. Vários trabalhadores ficaram feridos e desaparecidos, inclusive crianças.

Resistência das famílias Sem Terra

A luta por terra e água no Semiárido Baiano é marcada pela resistência camponesa e denúncias aos monopólios construídos pelas empresas e latifúndios na região. As famílias Sem Terra esperam pelas terras e, nesse processo, sofrem diversas ameaças de empresas que querem se apropriar das águas, além da morosidade do Estado em atender a pauta de reivindicação.

Apesar das diversas tratativas, o acordo ainda não foi cumprido pelos órgãos envolvidos, e as famílias continuam resistindo e exigindo o acesso à água e terra.

O ato faz do campo brasileiro um palco de guerra quando o agronegócio, o latifúndio e grandes empreendimentos saqueiam territórios de camponeses, quilombolas, indígenas, ribeirinhos e comunidades tradicionais, com a conivência e inércia dos Governos Federal e Estadual.

O MST reafirma que a luta é pela construção de um país mais justo e soberano. Por que acredita que através da Reforma Agrária será possível melhorar a qualidade de vida das pessoas, produzir alimentos saudáveis, proteger a natureza e combater os flagelos sociais, em especial, combater a fome e a miséria.

*Editado por Gustavo Marinho