#TôComMST

O MST é quem nos acolhe para organizarmos a resistência

"Muitos podem até questionar o que fazia ali no Congresso uma delegação de macumbeiras e macumbeiros: estávamos ali por solidariedade àquelas e aqueles que cuidam e preservam a moradia de minhas divindades"

Por Makota Celinha Gonçalves
Da Página do MST

Se me perguntarem agora, há quantas anda meu coração, diria que está oco, vazio. Uma tristeza toma conta de meu ser desde a noite de 17 de agosto. Estava no Teatro onde assisti ao maravilhoso show de minha amiga Aline Calixto, intitulado Clara Vive, em homenagem a cantora Clara Nunes. Isso, depois de uma viagem de 12 horas, vindo de Brasília onde fomos nos solidarizar com o MST e nosso amigo João Pedro Stédile. 

Desde a segunda feira, já imaginava que a semana não seria fácil, mas como rapadura é doce e não é mole, e para mim amizade, fidelidade, solidariedade, cumplicidade são sinônimos que dão cor a gente preta, partimos na segunda feira á noite rumo a Brasília para assistir o circo de horrores da chamada CPI do MST. Já sabíamos por antecedência que Exú estaria na frente e que, portanto, nada aconteceria que fugiria da esperada aula magna, que o companheiro Stedile daria àqueles que achavam, aliás sempre acham no alto de sua prepotência, que iriam expor para a sociedade de forma negativa e preconceituosa o MST, atraindo para o movimento a ira da sociedade. 

Muitos podem até questionar o que fazia ali no Congresso uma delegação de macumbeiras e macumbeiros, ao que respondo na maior tranquilidade: estávamos ali por solidariedade àquelas e aqueles que cuidam e preservam a moradia de minhas divindades e que ainda produz comida saudável para nossas mesas objetivas e subjetivas.  Para nós é uma honra poder defender quem cuida da natureza, quem tem pela terra o amor e a certeza de que ela bem tratada é a casa de todas e todos e que assim bem cuidada nos acolhe na generosidade, sendo farta, saudável e garantidora de nossas vidas com qualidade. 

Mas para mim o MST ainda é muito mais, o MST foi e é em seu compromisso de um novo país quem nos acolhe para juntas e juntos organizarmos a resistência em todas as esferas onde há opressão, onde há necessidade de mobilizar para juntos reagir a violência, ao racismo, a intolerância e a prepotência dos poderosos desse país. 

Na defesa das políticas pró reforma agrária, a favor do Movimento se juntaram vários segmentos, nós, fomos apenas mais um movimento comprometido com esta luta, nem maior, nem melhor, mas firme no propósito de fazer setores da direita conservadora, desrespeitosa e prepotente morder seu próprio rabo. E eles morderam, pois não havia o que responder quando quem trouxe para o debate as incoerências do que ali se pretendia alguns deputados: montar um circo de ignorâncias; foi alguém que sabe o porquê defender a luta das trabalhadoras e trabalhadores do campo. Que trouxe, ao contrário do que esperavam, estampado no rosto o orgulho do MST de ocupar a terra para dela tirar a subsistência, a moradia e o direito. Ali foi ensinado a diferença e invadir e ocupar.  João Pedro ensinou que o fato de ser sem-terra, não dá direito ao militante da causa de ficar fora da escola, que a luta do movimento formou inclusive os advogados que ali estavam a defender o MST.  

Falou da autonomia do movimento, da organização e das fragilidades, e assim reafirmou a dignidade. Foi para quem assistiu uma lição de vida, sem prepotência, arrogância. Mas firme e coesa, própria de quem não tem nada a esconder. Foi muito lindo perceber que de uma forma firme, sem autoritarismo, mas com autoridade de quem entende o assunto, o líder do MST indicou leituras necessárias para a formação dos parlamentares, deu dicas para aqueles que tem seus movimentos para cuidar dos seus. Aconselhou o conhecimento e a aquisição da sabedoria sem ser prepotente, mas de forma contundente. Aqui do nosso lado, eu diria mais ou menos assim, quem catou, catou e quem não prestou atenção perdeu a oportunidade de ficar calado e aprender um pouco do Brasil. 

Sai do depoimento mais rica que entrei, aprendi com um mais velho meu, e mais velho aqui não é de idade, mas de experiência e sabedoria, a nunca me envergonhar de quem sou, para onde vou e a valorizar meus sonhos e utopias. Por isso, fui até o DF, eu e mais 20 pessoas lideranças de terreiros aqui de Minas. Nós sabemos a importância da solidariedade e da importância de nossas lutas. E nunca perderemos a oportunidade de reafirmar que segurar a mão do outro é muito mais que uma frase de efeito. Até porque por experiência própria se a mão for preta e macumbeira ela escorrega, exatamente como ontem, 18 de agosto a mão de Mãe Bernadete escorregou das mãos do estado brasileiro, para quem Vidas Pretas Não Importam.