Reforma Agrária Popular
“Não resolveremos os problemas da sociedade se não resolvermos os problemas da questão agrária”
Por Wesley Lima
Da Página do MST
O Movimento Sem Terra ocupou na noite desta última terça-feira (22), o Campus X Teixeira de Freitas da Universidade Estadual da Bahia (UNEB) com a realização da Plenária “Reforma Agrária Popular e a CPI contra o MST”. A plenária foi construída em solidariedade e foi uma demonstração de apoio popular à luta pela reforma agrária.
João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST, foi o convidado da noite e falou sobre o processo histórico de luta pela terra, conectando as questões com a conjuntura política no Brasil e os atuais desafios no enfrentamento ao modelo de produção do latifúndio e do agronegócio.
Para ele “não resolveremos os problemas da sociedade se não resolvermos os problemas da questão agrária”. E continua: “a questão agrária, ou a reforma agrária como proposta, só tem saída se resolvermos esse problema antes: da política, de projeto de país”, destaca.
Durante sua fala, Stedile apresentou no detalhe as questões históricas que fundamentam a propriedade privada no Brasil e a importância da reforma agrária na luta pela terra neste contexto.
A reforma agrária depende da luta de classes em geral. Por isso também é que o MST nos últimos seis anos não conquistamos terra. Nós estávamos na resistência.”
Ele explica que neste contexto o Movimento compreendeu que seu papel era de derrotar o fascismo e eleger o Lula “como forma da luta de classes para destravar a reforma agrária e nós fomos vitoriosos”, enfatiza.
Momentos históricos
O processo de luta pela terra Brasil acompanha formas de resistência camponesa, indígena e negra, desenvolvidas frente ao avanço do capitalismo no campo. Stedile explicou que a colonização em nosso território nacional exigiu uma apropriação do trabalho dos povos originários e a implementação de modelos produtivos.
No primeiro momento, o sistema plantation foi fundamental. Ele foi um sistema de produção agrícola implantado pelas nações europeias em suas colônias. Stedile entende o plantation como uma prática que fazia parte do mercantilismo, baseado na construção de grandes latifúndios, na monocultura, no trabalho escravo e era voltado para atender o mercado exterior.
Em seguida, ele aponta o avanço do capitalismo industrial, que foi uma nova fase desse sistema econômico. O capitalismo industrial surge em meio a um processo de revoluções políticas e tecnológicas, na segunda metade do século 18. Com essa nova fase se supera o capitalismo comercial, também chamado de mercantilismo, que surgiu em fins do século 14 e vigorou até então.
Nesse contexto, o coordenador nacional do Movimento, chama atenção para “Lei de Terras”, que segundo ele é responsável pela consolidação legal da propriedade privada, “como uma exigência da nova etapa do capitalismo”.
Um próximo momento, referência para o que conhecemos hoje, foi a “Revolução Verde”. Ela foi criada para se referir ao desenvolvimento de técnicas na produção dos negócios agrícolas, baseada na utilização de adubos químicos, inseticidas, herbicidas e sementes transgênicas. Essa etapa de desenvolvimento capitalista no campo abre portas para a política neoliberal que encontra-se no centro de acumulação do capitalismo, “a partir do mercado financeiro e as empresas transnacionais”, explicou.
Modelos de disputa no campo
Para finalizar a aula, Stedile destacou que essa leitura da realidade agrária é construída a partir de uma “leitura da economia política”, tendo no centro o “estudo mental teórico da economia política”.
Nesse sentido, ele enfatiza que existem três modelos que disputam as agriculturas e “eles se agudizaram em suas lutas”. Nos últimos, com o aprofundamento das crises, os modelos agrícolas “entraram em um confronto mais direto, por conta da crise capitalista que atingiu o mercado financeiro e as transnacionais”.
O primeiro modelo é o “latifúndio predador”. “O latifúndio não é verbete para grande propriedade, aqui é o conceito de um modelo do capital para acumular riqueza na agricultura, que se caracteriza por acumular riqueza, se apropriando dos bens da natureza, invadindo terra pública, terra indigena, explorando os bens comuns.”
O segundo modelo é o agronegócio. Stedile afirmou que são fazendas “modernas”, que aprofundaram o pacote de Revolução Verde, usando cada vez mais agrotóxicos, tecnologias. “O agronegócio produz riqueza, tudo isso para exportar. É um modelo que dá muito dinheiro, mas eles só produzem commodities e as contradições estão na não produção de alimentos, no não desenvolvimento do local onde está e que o agrotóxico mata. Mata a biodiversidade.”
O terceiro modelo é o da agricultura familiar, que está enraizada na base do MST, desde a fundação do Movimento. Esse modelo tem como meta reivindicar as terras de latifúndios desapropriados para assentamentos, assim como está previsto na Constituição Federal, desenvolvendo a agroecologia e novas relações entre os seres humanos e a natureza.
É na agricultura familiar que a produção de alimentos saudáveis está na centralidade. Comida de verdade para alimentar o povo, os trabalhadores e as trabalhadoras, garantindo viabilidade econômica, social e cultural para aqueles e aquelas que vivem no campo.
Diligência e dez anos da Escola Popular
A aula de João Pedro Stedile ocorreu dias antes das comemorações de dez anos de existência da Escola Popular de Agroecologia e Agrofloresta Egídio Brunetto, localizada no assentamento Jacy Rocha, no município do Prado (BA). Os festejos acontecerão nos dias 26 e 27.
Na ocasião serão inauguradas as novas dependências da Escola, com o objetivo de oferecer melhores estruturas de estudo, trabalho e desenvolvimento técnico de experiências que visam a transição agroecológica na região e no estado.
Além disso, a Plenária, como símbolo de apoio e solidariedade ao MST, aconteceu frente a realização de uma diligência, que ocorrerá nos dias 24 e 25, da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o MST.
*Editado por Fernanda Alcântara