CPI contra o MST

Ministro Paulo Teixeira visita casa de assentada atacada pela CPI do MST na Bahia

Salles sugeriu que ela teria privilégios, mas para ministro, incidente deu visibilidade positiva para a reforma agrária
O que a CPI veio mostrar aqui, para nós é motivo de orgulho, disse o ministro durante a visita. Foto: Matheus Alves.

Por Afonso Bezerra e Pedro Stropasolas
Do Brasil de Fato

O ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, visitou, neste sábado (26), o assentamento Jacy Rocha, no município de Prado, na Bahia, onde fica a casa da engenheira agrônoma e assentada, Juliana Lopes, mais conhecida na comunidade como Júlia.

Ela teve a residência invadida pelos membros da CPI do MST, na última quinta-feira (24), em uma tentativa da diligência da comissão de “denunciar” – sem provas ou mesmo indícios – supostas desigualdades entre os assentados, sugerindo que alguns seriam “privilegiados”.

Teixeira está na região para participar da festa de inauguração das novas estruturas da escola popular Egídio Brunetto, que completa 10 anos de existência com dois dias de festividades. 

O ministro caminhou pelo lote acompanhado da assentada e demais integrantes do MST na região. Ele contestou a narrativa dos deputados federais Luciano Zucco (Republicanos-RS) e Ricardo Salles (PL-SP), de que assentados da Reforma Agrária não podem ter casas de alvenaria.

“A CPI quis dar luz ao sucesso deles [de Juliana]” disse o ministro ao Brasil de Fato, que afirmou ainda que a iniciativa de Salles e Zucco teria, involuntariamente, dado visibilidade positiva “à Reforma Agrária”.

“Porque o sucesso deles é fruto de um bom programa de Reforma Agrária. E o que a gente quer para todos os agricultores é isso: que eles possam ter uma casa bonita, que os filhos possam se formar como eles se formaram. O que a CPI veio aqui mostrar, para nós é motivo de orgulho”, explicou.

O ministro também criticou a postura dos deputados na condução da diligência e os critérios adotados durante as visitas aos assentamentos.

“Essa CPI precisa dizer se ela quer que as pessoas continuem pobres ou se ela quer retirar as pessoas da pobreza. A Reforma Agrária é para tirar as pessoas da pobreza e da miséria. Mas parece que não é a ideia do relator, que se assusta com uma casa melhor, com um carro melhor. Nós queremos a Reforma Agrária para as pessoas melhorarem de vida”, disse Teixeira.

Ministro Paulo Teixeira visita Assentamento Jacy Rocha, na Bahia. Foto: Matheus Alves.

Contexto

A engenheira agrônoma Juliana Lopes não estava em casa quando os deputados chegaram, na última quinta-feira (24). Os parlamentares entraram em seu lote sem autorização.

Juliana e o esposo vivem do cultivo agroecológico do cacau, café e da venda de galinhas caipiras em feiras na cidade de Teixeira de Freitas.

Filha de assentados, Juliana vive no Jacy Rocha desde 2011. Ela estudou dentro do próprio assentamento e se formou engenheira agrônoma pelo Pronera. Toda a renda que ela e o esposo, também engenheiro agrônomo, ganham mensalmente é fruto dos lotes implantados com o conhecimento adquirido pelo curso do Pronera.

“Eu sou a síntese da mudança que a reforma agrária faz na vida das pessoas”, pontua. “Recebi com muita surpresa essa visita da CPI. Eu não estava em casa e não fui informada. Se tivesse sido informada eu teria recebido. Filmaram a minha casa, tiraram várias fotos. Eu não tenho problema nenhum de mostrar a minha casa, o meu lote. Pelo contrário, seria muito importante mostrar como é a minha vida, como é o meu sistema de produção”, pontua a agricultora.

Os parlamentares tentaram boicotar a presença dos militantes do MST durante a diligência e tomaram decisões de modo a confundir a logística do movimento para receber o grupo.

Quando se aproximavam da entrada do Jacy Rocha, Salles e Zucco optaram por outra entrada, distante de onde os moradores estavam concentrados. A fuga dos dois parlamentares pegou de surpresa os integrantes do movimento, que aguardavam os membros da CPI para apresentar a Escola Popular de Agroecologia Egídio Brunetto, responsável pela alfabetização de 800 famílias no Extremo Sul da Bahia e referência na região.

“Minha casa fica no fundo do lote. Eles entraram por uma cancela que fica no início do lote, para construir uma narrativa de criminalização do MST. Invadiram minha casa para propagandear uma narrativa que não é real. Eu tenho roça, eu produzo comida”.

Lucinéia Durães, assentada no Fábio Henrique, também ficou indignada com a conduta dos deputados durante a diligência da CPI do MST. Ela é responsável pela plantação de 10 mil pés de café na região e agora está focada no cultivo de pimenta do reino.

“O Ricardo Salles escolheu aqui no assentamento uma família que há mais de 8 meses não mora mais aqui, tava inclusive com o barraco abandonado. Ele foi lá, mostrou a foto do barraco abandonado e veio aqui mostrar a casa de Juliana para dizer que as lideranças tem casa boa, e o povo não vive bem.”

“Esse assentamento tem mais de 50 casas como essa da Juliana”, explicou. “Nós, do Movimento Sem Terra, não temos nenhuma simpatia pela pobreza dos companheiros e das companheiras. Nós fazemos a luta para implementar a Reforma Agrária, porque ela é que garante emprego, renda e, sobretudo, dignidade”, concluiu.

Editado por Rodrigo Durão Coelho e Maria Silva