Agronegócio

Agronegócio favorece desequilíbrio ambiental e climático, diz pesquisador

Modelo baseado em monocultura e uso de agrotóxicos ainda prejudica produção de alimentos e encarece custos
Uso de defensivos agrícolas e agrotóxicos também são prejudiciais para o equilíbrio ambiental – Foto: José Medeiros / Sudeco

Por Gabriel Carriconde
De Brasil de Fato Curitiba

Chuvas acima da média no sul do Brasil, com prejuízo à produção de alimentos e aumento dos preços; seca histórica na Amazônia, impactando atividades pesqueira, sobretudo de ribeirinhos. Esses são alguns exemplos de como a crise climática se abateu com força no Brasil.

Para Luiz Marques, professor do departamento de História da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e autor do livro “Capitalismo e Colapso Ambiental”, o modelo do agronegócio colabora com a emissão de gases do efeito estufa, o que tem alterado de maneira cada vez mais severa o clima. O uso de defensivos agrícolas e agrotóxicos também são prejudiciais para o equilíbrio ambiental.

”Esse modelo agrícola baseado na monocultura e pecuária bovina voltado para a exportação tem impacto na destruição da manta vegetal brasileira, não só a Amazônia mas em outros biomas. É simplesmente suicida para a própria cultura do agronegócio, para a sociedade brasileira e para a nossa biodiversidade”, analisa.

O professor denuncia ainda o papel ”destrutivo” da agropecuária de gados bovinos, um dos principais responsáveis pelo desmatamento da Amazônia e pela produção de metano. “Esse gado produz uma quantidade brutal de metano, um dos principais gases que ajudam no efeito estufa, tendo um impacto de 86 vezes maior de CO2 em um intervalo de 20 anos. (…) Se você pegar o inventário da emissão dos gases de efeito estufa no Brasil, cerca de 75% decorrem da atuação do agronegócio, com grande preponderância na agropecuária bovina”, analisa. 

Impactos conectados

Com o avanço no desmatamento, principalmente na região amazônica, há prejuízo na produção da umidade, importante para a formação dos chamados ”rios voadores”, que provoca o equilíbrio de chuvas para a região centro-sul do país.

Os rios voadores são cursos de água atmosféricos, formados por massas de ar carregadas com vapores de água, muitas vezes acompanhados por nuvens e propagados pelos ventos.

Com a falta de chuvas no norte, que enfrenta uma seca histórica, os eventos climáticos vêm ficando cada vez mais extremos, alternando entre secas com altas temperaturas e enchentes.

O professor Eloy Casagrande, PhD em engenharia de recursos minerais e meio ambiente pela Universidade de Nottingham (Inglaterra) e auditor ambiental pelo EARA, explica que a quantidade de umidade liberada na Amazônia irriga as chuvas no sul e sudeste.

“A quantidade de água que se desloca da região amazônica para o sul, sudeste e centro-oeste — e que às vezes pode chegar a ser maior com a água evaporada muitas vezes pela copa das árvores —, pode ser maior que a vazão do Rio Amazonas, cerca de 200.000m³ por segundo”, conta.

Um artigo publicado em 2019 pelo pesquisador Marcos Heil Costa, engenheiro com vasta experiência em clima, uso da terra, ciclo do carbono, água e agricultura no Brasil Central e Amazônia, cita que o aumento da estação seca nos estados amazônicos já vem ameaçando as safras de soja e milho.

“A falta de chuvas no triênio 2020-2022 tem provocado quebras de safra em importantes regiões produtoras de alimentos no Brasil, com carestia e prejuízos colossais aos agricultores de milho, açúcar, café, trigo e laranja. Por causa disso, a safra 2020/2021 de milho foi 15% inferior à safra 2019/2020”, relata o professor Luiz Marques ao Jornal da Unicamp, citando o artigo de Marcos Heil.

Prejuízos na produção e aumento de preços

Para a agricultura familiar, que possui menos recursos para lidar com problemas relacionados a secas ou excesso de chuvas, os impactos climáticos têm prejudicado a produção.

De acordo com dados do anuário da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura, as propriedades de agricultura familiar são quase 3,9 milhões no país, representando 77% de todos os estabelecimentos agrícolas, com produção de alimentos chegando a oitava maior do planeta.

Para a agricultora familiar Elizete Pereira, do assentamento 8 de Abril, no Paraná, com as alterações do clima tem sido difícil planejar a produção. “Quando está muito seco, você perde pela falta de nascer [alimentos] e não chover na hora certa, e não ter possibilidade de irrigação. Quando chove demais, perde feijão, perde arroz”, diz.

No Paraná, por exemplo, as chuvas acima da média para a primavera tem causado o aumento nos preços das hortaliças. De acordo com o Boletim de Conjuntura Agropecuária da semana de 12 a 19 de outubro, Curitiba, que é responsável por 40,9% das atividades olerícolas, teve um acúmulo de 394 milímetros de chuvas até o dia 17. O número é bastante superior à média histórica de 100 a 190 milímetros para o mês de outubro no entorno da capital.

Um levantamento que analisa a variação de preços dos 30 principais produtos vendidos nas Centrais de Abastecimento do Paraná (Ceasa), em especial em Curitiba, mostra que 11 desses produtos tiveram elevação no valor desde o início do mês, influenciados pelas intempéries.

A alface saiu do valor médio de R$ 15,00 a caixa de 7 quilos (valor registrado no dia 2 de outubro), para R$ 30,00 no dia 18. Já o morango apresentou aumento de 94,4%. No início do mês quatro bandejas (1,5 quilo) custavam em média R$ 18,00, e agora são compradas por R$ 35,00.
 

*Essa matéria faz parte da edição Brasil de Fato Paraná – Especial 20ª Jornada de Agroecologia.

*Editado por Lia Bianchini

**Editado por João Carlos