Inclusão Tecnológica

Dirigente do MST fala sobre impactos de máquinas chinesas na produção de alimentos no NE

Em entrevista, Elias Araújo aponta a importância da parceria para diminuir as desigualdades tecnologias entre a agricultura familiar e o agronegócio
Foto: Fernanda Correia/MAB

Por Solange Engelmann e Yuri Gringo
Da Página do MST

No Brasil historicamente se instalou um contexto desigual, por parte das políticas de estado e do mercado, não somente no acesso à terra pelos camponeses, que se encontra concentrada por grandes latifundiários, mas também um conjunto de desigualdades tecnológicas que precarizam as condições de produção, renda e atrasam o desenvolvimento da agricultura familiar camponesa, que é responsável pela produção de alimentos que chega à mesa da população brasileira.

Buscando enfrentar esses desafios e ampliar a produção de alimentos saudáveis nos assentamentos de Reforma Agrária e nos territórios da agricultura familiar, o Consórcio Nordeste, em parceria com o governo do Rio Grande do Norte e o MST, realizam nesta sexta-feira (02), o Ato de Lançamento do Campo Experimental das Máquinas Chinesas, em Apodi, no Rio Grande do Norte.

Durante o ato será formalizada a chegada de 29 máquinas no país. Desse total, 11 máquinas serão entregues ao MST no estado, além da Paraíba, Maranhão e Ceará, para a testagem sobre a eficiência desses maquinários, em diferentes tipos de solos e sistemas produtivos dos assentamentos.

O dirigente do setor de produção do MST na regional Amazônica, Elias Araújo, comemora a chegada das máquinas chinesas no Nordeste e comenta sobre os possíveis impactos dessas tecnologias na produção de alimentos e diminuição das igualdades tecnologias entre a agricultura familiar e o agronegócio.

Elias Araújo. Foto: Yuri Gringo/Reprodução

“Um debate extremamente importante, é o da inclusão, de combater as desigualdades, principalmente esse fosso que existe entre a agricultura do agronegócio e a agricultura familiar camponesa. Para isso é preciso melhorar as condições de produção e o acesso aos meios de produção”, afirma.

Confira a entrevista na íntegra:

Qual a importância das máquinas chinesas para a produção de alimentos pelas famílias assentadas na região Nordeste?

Esse tema das máquinas chinesas, para nós, é muito importante. A principal importância dela, em primeiro lugar, é pautar a mecanização. Esse é o grande diferencial da cooperação com a China. E a agricultura familiar, os assentamentos de Reforma Agrária. É participar de um movimento aonde se paute a mecanização e a maior importância da mecanização. Ter práticas sustentáveis, que permita você ampliar a escala da produção de alimentos sem perder a qualidade do alimento. O alimento saudável, alimento agroecológico. E, portanto, a principal importância é submeter essa pauta a uma relação que permita o que nós estamos chamando de testagem experimentação, a partir de uma participação direta dos agricultores assentados do Nordeste.

E em relação às práticas e manejos na produção de alimentos pelos agricultores assentados e familiares, qual seriam os impactos?

É preciso pensar no barateamento de mão de obra, volume de produção e rendas das famílias assentadas nessa região. Nessa parceria o impacto desejado é, em primeiro lugar, garantir a acessibilidade das máquinas, contando com uma redução de custos, já que estamos numa realidade em que máquinas agrícolas são muito caras de se obter.

Esperamos que um dos impactos seja a redução do preço das máquinas, mas principalmente, garantir a oferta. É possível que tenha máquinas baratas no Brasil, mas o fato é que não tem uma disponibilidade dessas máquinas. Então, vamos garantir, em primeiro lugar, que essas máquinas existam, sejam disponibilizadas para a agricultura familiar num baixo custo e, principalmente, que atenda o itinerário técnico das culturas principais do Nordeste.

No longo prazo, a gente espera de que essas máquinas consigam ser adaptadas para garantir a sustentabilidade. Ampliar a questão de emprego e melhorar o uso de mão de obra. A ideia é ter ferramentas que ajudem a garantir a produção na escala que se necessita. Que as cooperativas, os grupos, as famílias consigam se inserir nas políticas públicas, atendendo ao PAA, ao PNAE e ao abastecimento local, reduzindo o trabalho penoso e o custo de produção, avançando em boas práticas de produção.

Qual o diferencial entre as máquinas enviadas pela China, por meio do consórcio do Nordeste e os grandes, e maquinários usados pelo agronegócio no Brasil?

A questão do diferencial entre as máquinas chinesas e as máquinas disponibilizadas aqui, principalmente para atender o agronegócio está focado para a fração do agricultor que a gente está trabalhando, que é o pequeno agricultor.

Essa máquina está sendo pensada para a família, o pequeno grupo, a cooperativa, a agroecologia, o ambiente da agricultura familiar. Então, isso a gente quer pautar, trazer o debate de que o diferencial de que as máquinas chinesas estão pensadas nessa dimensão e escala de produção.

Como o acesso a esses maquinários da China pode contribuir para diminuir as desigualdades tecnológicas entre a agricultura familiar do Nordeste e o agronegócio?

A impressão que temos é que, a partir dessas máquinas, que serão testadas, validadas e utilizadas, isso vai despertar um conjunto de relações com as instituições de ensino, de pesquisa, mas também com fabricantes e políticas públicas. Pode ser um instrumento que contribua para a garantia de pensar uma agricultura, a agroecologia e uma unidade de produção familiar ou coletiva a partir da ideia da mecanização, uma coisa que não se tem.

A gente precisa em primeiro lugar, garantir esse debate extremamente importante, que é o da inclusão, de combater as desigualdades, principalmente esse fosso que existe entre a agricultura do agronegócio e a agricultura familiar camponesa. Para isso se resolver é preciso melhorar as condições de produção e o acesso aos meios de produção. Com o tema da mecanização, da pesquisa, da cooperação internacional, e assim vamos facilitando e provocando os gestores locais para implantar montadoras, fazer importação de máquinas para que a gente consiga, de fato, reduzir essa desigualdade entre a agricultura que se faz nas pequenas propriedades e a agricultura que se faz no agronegócio. Reduzir esse grande fosso de acesso às tecnologias entre a grande agricultura, dita moderna, e a agricultura familiar.

Qual a expectativa em relação à parceria com os chineses e o uso dessas máquinas pelas famílias assentadas e da agricultura familiar no país?

A principal questão agora é uma expectativa na relação com a China. Primeiro, precisamos conhecer as máquinas, para além dos pequenos tratores, mas conhecer essa tecnologia. O segundo passo é saber como isso impacta localmente, atende as nossas demandas e que seja uma relação duradoura. E depois dessa parceria com os fabricantes locais, com os pesquisadores locais, com os camponeses no país e as máquina, a gente vai chegando ao desejável, que são máquinas ajustadas a necessidade e a demanda que se tem não só no Nordeste, mas em outras regiões do Brasil.

*Editado por Fernanda Alcântara