Tecnologia

Projeto piloto do Incra leva inclusão digital a cinco assentamentos no RS

Professora que conduziu ações comparou experimentos com 'sementes' que precisam ser cultivadas para 'frutificar'
Territórios da Reforma Agrária também precisam se tornar espaços de inclusão digital. Foto: Corbari

Por Marcos Antonio Corbari
Do Brasil de Fato

“É importante para as escolas do campo localizadas no território da Reforma Agrária ter acesso à Internet. Mas também é importante para a Internet ter acesso ao que se fez e a tudo o que se realiza nessas escolas e nesse território”, resumiu a professora Ana Giordani, da Universidade Federal Fluminense (UFF), na inauguração de uma das cinco salas digitais que integram o projeto piloto do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), instaladas junto a escolas do campo em assentamentos da Reforma Agrária no RS.

“São apenas cinco sementinhas que inicialmente pudemos plantar, sementes que queremos entregar agora, que precisarão ser bem cuidadas e cultivadas para germinar na forma de direitos para os assentados e as assentadas, são cinco sementinhas que temos para mostrar que esse projeto dá certo e multiplicá-lo para todos os assentamentos do país”, completou Giordani.

Conforme a superintendência do Incra no RS relatou ao Brasil de Fato RS, o plano inicial era atender comunidades próximas a Porto Alegre – por questões técnicas e logísticas –, mas acabou adequado e atualmente abrange outras três regiões onde as dificuldades de transporte e comunicação são uma constante. A intenção é aperfeiçoar a proposta a partir da experiência inicial para estendê-la a outros assentamentos e demais superintendências do país.

Os locais atendidos na primeira etapa são a Escola Estadual de Ensino Médio Joceli Corrêa, no assentamento Rondinha (localizado no município de Jóia); Escola Estadual de Ensino Médio Antônio Conselheiro, no assentamento Bom Será (em Santana do Livramento); Escola Estadual Chico Mendes, do assentamento Santa Elmira (em Hulha Negra); Instituto de Educação Josué de Castro, do assentamento Filhos de Sepé (em Viamão); e Escola Estadual de Ensino Médio Nova Sociedade, do assentamento Itapuí (em Nova Santa Rita).

A intenção de gerar frutos é expressa no logotipo da Sala Digital em que uma semente se soma ao símbolo da conectividade, representada em nuances do marrom – da terra –, ao azul, do céu.

Inaugurações se converteram em celebrações à resistência das escolas do campo. Foto: Corbari

A parte física de cada Sala Digital é composta por 20 computadores e antena de internet. Quatro técnicos sediados em Porto Alegre prestam auxílio em tecnologia da informação e assessoria pedagógica. Além disso, um treinamento realizado em março capacitou tutores indicados pelos assentados para organizar o funcionamento dos espaços e orientar presencialmente os usuários.

O prazo de trabalho da estrutura de apoio é de um ano, mas pode ser prorrogado. Os laboratórios experimentais localizam-se junto a instituições de ensino, mas são abertos a todos os assentados.

Cada escola que recebeu a sala digital ficou responsável por ceder como contrapartida o espaço físico adequado e mobiliário. Em locais onde não havia essa disponibilidade – como na Escola Estadual Chico Mendes, de Hulha Negra – a própria comunidade desafiou-se a reunir esforços e se mobilizar pela construção.

“É uma oportunidade importante para nossas crianças, ouvimos o chamado e inicialmente nos assustamos com o prazo curto para responder, mas não foi preciso mais do que uma consulta a um grande parceiro da escola, ao Frei Sérgio, do Instituto Cultural Padre Josimo, para que tivéssemos certeza de que mais uma vez as pessoas no nosso entorno fariam a diferença e esse projeto seria concretizado”, explica a professora Cenira Hann.

Olhando com orgulho para a casa construída no terreno da escola Chico Mendes, especialmente para acolher o projeto, Cenira destacou o apoio de dezenas de voluntários, cooperativas, instituições e, principalmente, assentados e assentadas que abraçaram a ideia e colocaram mãos a obra.

A configuração dos equipamentos buscou atender especificidades dos agricultores. Por isso, os computadores possuem mouse reforçado a fim de facilitar o manuseio e os terminais apresentam capacidade limitada de armazenamento interno, visando aumentar a vida útil, com foco na internet. Mesmo com esses cuidados, surgiram novas necessidades durante a implantação. Como resultado, os kits foram acrescidos de projetor e impressora e, em breve, receberão telão.

Em Hulha Negra o espaço tem duas portas, uma voltada para a escola e a outra para a estrada, como convite à comunidade. Foto: Corbari

“As salas vão elevar o conhecimento dos nossos jovens e abrir espaço também para famílias mais idosas, que têm dificuldade de acesso à comunicação e à internet. Vão contribuir inclusive nos processos de regularização, titulação e cadastro dos lotes”, prevê o superintendente regional do Incra/RS, Nelson José Grasselli.

O dirigente lembra que a tecnologia encurta distâncias e facilita a vida dos interessados, aperfeiçoando a infraestrutura dos assentamentos junto com fatores como estradas e saúde. Nesse sentido, é uma ferramenta que completa a conquista da terra e deve fazer parte do cotidiano dos agricultores.

No mesmo sentido se manifestou Salete Carollo, integrante da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST). Para ela está posto um novo desafio, agora, aos Sem Terrinhas, que vão precisar ajudar os seus familiares a acessar a tecnologia e também aprender a utilizar os equipamentos para ter autonomia. A dirigente fez questão de inclusive sentar junto aos alunos na abertura da sala para conhecer o espaço e incentivá-los a desde já aceitar o desafio de compartilhar os seus conhecimentos com os mais velhos.

Salete Carollo representou a direção nacional do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra. Foto: Corbari

A assentada Arlete Bulcão Pinto lembrou que todos os filhos passaram por aquela escola e agora a caçula, que ainda está estudando, terá a responsabilidade junto com seus colegas e professores de tornar a Sala Digital em um local de transformação. “Vocês, Sem Terrinhas, precisam se apropriar desse espaço e tirar o melhor desses equipamentos, vocês vão ter a oportunidade de aprender e também de nos ensinar”, assinalou a agricultora.

Falando à assessoria do Incra, o coordenador-geral, professor Marco Aurélio Sanfins, da Universidade Federal Fluminense (UFF), define a Sala Digital como “um projeto vivo”. Além de permitir a incorporação de novos itens materiais, a iniciativa poderá desenvolver cursos específicos para os agricultores ampliando o universo de possibilidades oferecidas via internet e os 11 treinamentos disponibilizados atualmente pela UFF. Uma pesquisa em parceria com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) realizada em dois momentos pretende captar as mudanças percebidas pelas famílias a partir da iniciativa.

* Com informações da Assessoria de Imprensa do Incra/RS.