Preços justos e o alimento que carrega a semente de uma outra sociedade
Por Rafael Soriano
Da Página do MST
A cidade de São Paulo se prepara para receber mais uma vez a Feira Nacional da Reforma Agrária. Uma das organizadora desta terceira edição, Antônia Ivoneide, que vem do Ceará, traz uma reflexão necessária sobre o alimento que chega à mesa dos brasileiros, a importância da Reforma Agrária e de se mudar o modelo de viver no campo.
“O que vem pra Feira é parte daquilo que eu alimento também a minha família”, indica Neném, como é conhecida a agricultora, também integrante da Direção Nacional do MST. “Vamos nos alimentar (e bem) aqui na Feira, como eu, como parte da comunidade que eu vivo, numa relação direta de respeito”, completa.
Neném também explica a relação dos preços dos produtos, que serão vendidos no Parque da Água Branca e adianta como será o espaço Culinária da Terra, com vinte cozinhas de todas as regiões do país.
Confira a íntegra da entrevista.
A Feira Nacional da Reforma Agrária é uma amostra de um universo maior. Qual o modelo defendido pelo MST para o campo brasileiro?
O MST defende que a terra seja partilhada e esteja com aqueles que nela trabalham, que queiram de fato viver na terra e tirar seu sustento com o desenvolvimento de um processo de produção. A função social da terra é produzir alimento, mas não qualquer alimento, e sim um alimento saudável, agroecológico, que não use venenos e não reproduza as relações de exploração de trabalho ou de gênero, de geração e de poder.
Propomos a produção de alimento agroecológico que traz em si a relação entre as pessoas. Para isso, estamos numa transição que usa o caminho do alimento saudável.
Temos que construir essa relação de produção de alimento, que se amplie na relação com a sociedade, com outros movimentos do campo, como quilombola e indígena, em defesa dos nossos territórios. Que a gente vá além da luta pela terra e pela Reforma Agrária, que englobe a defesa do território e de uma sociedade diferente no campo, em que o alimento e o todo da cultura têm uma relação fundamental.
Alimento pode ser mercadoria?
Do nosso ponto de vista do camponês, não. O agronegócio transforma a produção, mas também os bens da natureza como a água, a terra, as florestas, os minérios, em lucro, para que possam ganhar em cima. O alimento, por sua vez, é vital para a vida. A gente vive porque come e bebe água, portanto o alimento é uma essência da vida.
O alimento deve ser pensado para além da mercadoria, porque mercadoria não importa o que e como é produzido, mas se essa mercadoria vai dar retorno financeiro.
E os alimentos que estarão em São Paulo, vindos de todo o Brasil?
O alimento que vem pra Feira é pensado principalmente na ótica de quem come, nas famílias que vão comer aquilo que a gente está produzindo. Não é primeiro o lucro (a renda vem também), mas primeiro a alimentação, viver e viver bem com aquilo que se produz.
A alimentação que vem pra Feira não é uma produção à parte do que as famílias também comem no campo. Faz parte daquilo que eu alimento também a minha família. Vamos nos alimentar (e bem) aqui na Feira, como eu alimento a minha família e como a parte da comunidade que vivo, numa relação direta de respeito.
Conta um pouco sobre o espaço Culinária da Terra!
O Espaço Culinária da Terra vai trazer pra Feira os nossos sabores, os nossos gostos, o nosso jeito de fazer a comida e da relação não só da produção, mas do preparo. Aqui se aproxima a realidade de produção trazida pra Feira, mas também da transformação do produto. A Culinária da Terra traz para São Paulo o gosto da cozinha do campo, das camponesas e dos camponeses fazendo a alimentação. A relação com a terra, a comida e a prática da cozinha.
Você que vive nessa cidade grande, venha ter um momento do campo aqui na Feira. Venha provar os sabores das mais de vinte cozinhas da Culinária da Terra, tocar, sentir o cheiro, perguntar como é cozido, preparado. É o momento de conhecer e ter contato com essa dimensão da cultura do alimento e do viver no campo.
Os preços na Feira Nacional são justos?
A gente faz uma pesquisa em outros pontos de venda, outras feiras e de quanto precisamos para produzir com os custos. Isso se equilibra com nossa proposta de ter na Feira da Reforma Agrária um elo forte de diálogo com a sociedade urbana, portanto, um momento de anúncio da Reforma Agrária Popular e não um espaço para a lucratividade por si só.
Esse equilíbrio, somado à venda direta do produtor às famílias que vão consumir, geram uma tabela abaixo dos preços praticados em São Paulo. Venha conferir!
*Editado por Iris Pacheco