Organizações lançam carta contra criminalização dos movimentos sociais de PE
Por Mariana Martins
Organizações de direitos humanos e entidades da sociedade civil lançaram ontem uma carta em repúdio à política de criminalização dos movimentos sociais, principalmente os movimentos agrários de luta pela terra, promovida pela Associação de Oficiais, Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar e Bombeiros Militares de Pernambuco (AOSS) em todo o estado.
A AOSS colocou nas principais vias públicas da cidade do Recife e nas rodovias do estado outdoors que acusa os sem-terra de serem sem lei e sem limites, além de reproduzir o mesmo anúncio em jornais de circulação local e de produzir um encarte próprio contra os trabalhadores rurais. De acordo com a carta assinada pelas entidades, a investida da AOSS
contra os sem-terra foi intensificada depois do incidente da Marcha de Abertura do II Fórum Social Brasileiro, no dia 20 de abril. Durante a passeata, mais de dez pessoas ficaram feridas e dois sem-terra forma baleados.
Para as entidades, a campanha deflagrada pelos policiais é preconceituosa e não condiz com o papel de proteção e de respeito aos direitos humanos atribuído aos oficiais. A carta afirma ainda que a campanha “além de atender a interesses de latifundiários, utiliza uma estratégia antiga de atribuir aos defensores de direitos humanos e aos militantes a prática de ações criminosas como meio de reprimir a luta dos movimentos sociais”.
A carta será encaminhada à imprensa e a demais organizações de direitos humanos e movimentos sociais de todos Brasil. Leia o documento abaixo:
Carta Aberta em Solidariedade aos Trabalhadores Rurais Sem Terra do Estado de Pernambuco
As organizações de direitos humanos e entidades abaixo assinadas vêm a público demonstrar apoio e solidariedade aos trabalhadores/as rurais sem terra do estado de Pernambuco e repudiar a prática de violação de direitos humanos e criminalização dos movimentos sociais promovida pela Associação dos Oficiais, Subtenentes e Sargentos da Polícia Militar/Corpo de Bombeiros Militar de Pernambuco (AOSS).
A AOSS, representada pelo Major Alberto Feitosa, tem distribuído nas principais vias públicas do Recife e nas rodovias do Estado de Pernambuco, outdoors e jornais, bem como feito discursos nos horários nobres das rádios e televisões, com conteúdos difamatórios e preconceituosos contra trabalhadores/as sem terra.
Esta ação difamatória não ajuda a resolver o problema da violência em nosso estado, tampouco condiz com o papel de proteção e de respeito aos direitos humanos, que deve ser prestado pelos oficiais representados por tal associação.
É importante esclarecer que a campanha promovida pela AOSS, além de atender a interesses de latifundiários, utiliza uma estratégia antiga de atribuir aos defensores de direitos humanos e aos militantes a prática de ações criminosas como meio de reprimir a luta dos movimentos sociais.
As ações da AOSS foram iniciadas após os fatos ocorridos no dia 20 de abril deste ano, quando foi realizada, no Recife/PE, a Marcha de Abertura do II Fórum Social Brasileiro, geralmente marcada pela descontração, alegria e irreverência dos/as militantes, e que teve um péssimo desfecho marcado pela truculência da Polícia Militar de Pernambuco. Pelo menos dez pessoas, dentre elas seis trabalhadores rurais sem terra, foram violentamente agredidas por policiais militares. Dois trabalhadores foram baleados, Jaime Amorim, coordenador estadual do MST e Severino Francisco de Melo, da Comissão Pastoral da Terra. Nunca uma ação como esta havia acontecido nos espaços dos Fóruns Sociais realizados no país.
Os constantes ‘incidentes’ ocorridos contra militantes de movimentos sociais e defensores de direitos humanos são conseqüência de uma ‘Política de Segurança Pública’ baseada na repressão violenta – legitimada institucionalmente – e na impunidade, que funciona como autorização tácita aos policiais a agredirem tanto os movimentos sociais como a população pobre, reproduzindo um padrão permanente de violação dos direitos humanos.
Infelizmente a ação da AOSS é uma clara incitação à violência, tornando militantes e defensores de direitos humanos ainda mais vulneráveis. Acontecimentos como estes devem servir de reflexão sobre o tratamento dado pelo aparato da polícia aos movimentos sociais e não ser usado como desculpa para insultar e perseguir os trabalhadores/as rurais sem terra, e promover campanhas como vem fazendo esta Associação.
Como servidores públicos, os policiais militares, que têm como dever o respeito à sociedade, não deveriam atuar de maneira irresponsável contra a mesma. Este tipo de atitude demonstra a prática discriminatória com que os ‘promotores da segurança pública’ agem contra uma parcela da sociedade que tem sistematicamente seus de direitos fundamentais violados. Desta forma, ações como a da AOSS contribuem para a promoção de uma cultura de ódio, com características que beiram o fascismo.
Esse é o momento de refletirmos sobre a questão fundiária no nosso país, sobre como a concentração de 46% das terras nas mãos de apenas um 1% da população oprime o pequeno agricultor, que produz mais de 70% dos alimentos que abastecem a mesa do povo brasileiro, gerando sete vezes mais empregos no campo do que a monocultura secular brasileira.
Os movimentos sociais não se intimidarão por essa campanha e se manterão firmes na luta pela reforma agrária, por uma justa distribuição de terras e renda, por uma sociedade sem preconceitos, na incansável denúncia de todo e qualquer desrespeito aos direitos humanos, sem prejuízo de serem tomadas todas as medidas necessárias para responsabilizar cível e criminalmente a AOSS.
Recife, 31 de maio 2006.
Associação Brasileira de ONG´s – ABONG
Associação de Mulheres Brasileiras – AMB
Associação de Quilombolas de Conceição das Crioulas/Pernambuco – AQCC
Associação Político Cultural Brasil/Cuba – Casa Gregório Bezerra
Ação Brasileira pela Nutrição de Direitos Humanos – ABRANDH
Centro Dom Helder Câmara – CENDHEC
Centro de Cultura Luiz Freira – CCLF
Centro de Mulheres do Cabo – CMC
Centro Sabiá
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Centro Cultural Manuel Lisboa – PE
Diretório Central dos Estudantes da Universidade Federal de Pernambuco – DCE/UFPE
Djumbay – direitos humanos e desenvolvimento local sustentável
Fórum de Mulheres de Pernambuco – FMPE
FIAN BRASIL – Rede de informação e ação pelo direito de se alimentar
Instituto Papai
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH
Movimento Mata Sul pela Paz e contra a Violência – MASPAZ
Movimento dos Trabalhadores Cristãos – MTC
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto – MTST
NAJUP – Núcleo de Assessoria Jurídica Popular – Direito nas Ruas
SOS Corpo – Instituto Feminista para Democracia
Terra de Direitos – organização civil para os Direitos Humanos
Via Campesina – Brasil
Deputado Estadual Roberto Leandro
Deputado Estadual Nelson Pereira
Deputada Estadual Ceça Ribeiro
Deputado Federal Paulo Rubem Santiago
Deputado Federal Fernando Ferro