93% dos paranaenses são contra os pedágios, afirma Pesquisa

Solange Engelmann
do Paraná

Só tráfico de drogas lucra mais que as concessionárias de pedágios, diz Ministério Público

O lucro obtido pelas concessionárias de rodovias no Brasil só é comparável ao do tráfico internacional de drogas. Quem garante é o subprocurador-geral da República, Aurélio Virgílio Veiga Rios. Sendo assim, não admirá que, segundo pesquisa do Fórum Social Popular Contra o Pedágio no Paraná, 93% dos paranaenses são contra a cobrança de pedágio.

Paulo dos Santos, usuário das rodovias, reclama que as empresas estão tendo lucro com um serviço público, sem proporcionar melhorias aos usuários e as rodovias. “Além do valor da tarifa ser quase o mesmo preço do combustível, os pedágios também congestionam o trânsito em dias de feriado”, reclama.

Entretanto, pagar pedágio não é um problema exclusivo de quem trafega nas rodovias. O coordenador do Fórum, Acir Mezzadri, esclarece que, mesmo o cidadão brasileiro que não transita por qualquer rodovia, paga pelos pedágios quando consome qualquer produto.

Isso também afeta diretamente o crescimento do Paraná, uma vez que todas as mercadorias vêm com o valor do pedágio embutido. A conta é paga por todos: consumidores, agricultores, usuários e caminhoneiros. Ao todo, 72% de toda a riqueza brasileira é transportada pela malha rodoviária.
Além dos usuários e dos consumidores, os pequenos agricultores são diretamente afetados pois as altas tarifas elevam os custos para escoar a produção agrícola. Dados do governo do Paraná mostram que, todos os anos, somente a agricultura deixa mais de R$ 100 milhões nas praças de pedágios do estado.

Os caminhoneiros também sofrem. Segundo o presidente do Sindicato das Cooperativas de Transporte do Paraná (Sincoopar) e representante do Movimento União Brasil Caminhoneiro, Nelson Canan, o pedágio do Paraná, um dos mais caros do Brasil, vem dificultando a sobrevivência da categoria. “As empresas embutem o valor do pedágio no frete e o caminhoneiro acaba tendo que pagar a conta”, explica.

Bem público vira lucro

Os problemas começaram em 1998, com a privatização das estradas paranaenses. Hoje em dia, são poucos os trechos onde é possível circular sem pagar às concessionárias. Só no Paraná, são 27 praças, administradas pelas empresas, Rodovia das Cataratas, Econorte, Caminhos do Paraná, Ecovia, Rodonorte e Viapar.

Se alguém paga, alguém recebe. O faturamento desses seis grupos não pára de crescer. Entre 1998, primeiro ano da cobrança, e 2006, a arrecadação subiu oito vezes, segundo o governo do Paraná. No entanto, apenas 30% do que é pago em tarifa está sendo revertido em obras e conservação.

“Entregar as estradas prontas para as concessionárias explorar é um crime. O governo passado entregou um bem público que, hoje, está na mão de meia dúzia de empresas”, repudia Nelson Canan.

Para o diretor-geral do Departamento de Estradas de Rodagem (DER), Rogério Wallbach Tizzot, o pedágio no Brasil é uma aberração, uma anomalia do conceito de concessão e um desvio desnecessário das atribuições públicas. Tizzot explica que, no Brasil, entendeu-se como concessão a transferência do patrimônio público rodoviário à iniciativa privada, que passou a explorá-lo mediante a cobrança de pedágio, criando um sistema que gera fabulosa receita a um grupo de empreiteiras.
Para efeito de comparação, Canan revela que, em alguns trechos, o valor pago em pedágio daria para adquirir outro caminhão. “De Foz do Iguaçu ao Porto de Paranaguá, o caminhoneiro paga quase R$ 4 mil por mês. Com esse dinheiro, daria para financiar um bom caminhão novo, pois a parcela em consórcio não ultrapassa os R$ 3 mil”, revela.

Outro problema para os caminhoneiros é o vale pedágio. Ele se tornou obrigatório para o transporte de cargas, com um custo 5 % maior que o cobrado em dinheiro. A categoria reclama que quem não tem o vale é multado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) que, em vez de defender os usuários, beneficia as empresas.

Não bastasse a quantidade de pedágio no Estado, o governo federal, tentou implantar a cobrança em mais duas rodovias que cruzam o Paraná: a BR-116 (Curitiba – Divisas SC e SP) e a BR-476 (Curitiba – Divisa SP). No entanto, a pressão das sociedade civil, das entidades que integram o Fórum Contra o Pedágio e do governo do Paraná fizeram o presidente Lula suspender as licitações dos novos pedágios nas rodovias federais. A decisão fortaleceu a luta contra os pedágios e abriu a possibilidade para a criação de uma estatal responsável pela administração das rodovias.

Na mão do Estado

A exploração das rodovias federais pela iniciativa privada sempre foi sustentada sob o argumento de que faltam recursos necessários para manter a rede rodoviária. Entretanto, é o contribuinte que vem pagando altas taxas de impostos sobre o setor de transportes. Tizzot analisa que a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide), embutida no preço dos combustíveis e criada para a manutenção da infra-estrutura de transportes do país, poderia ajudar a resolver o problema. Porém, segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), entre janeiro de 2002 e dezembro de 2005, somente R$ 5,4 bilhões, dos R$ 31,5 bilhões que a Cide recolheu, foram aplicados no setor.

Para solucionar essa questão, o Movimento União Brasil Caminhoneiro defende que os governos estaduais devem retomar o controle das rodovias. A solução seria intervir nas concessionárias e criar uma autarquia para administrar as estradas. Para Mezzadri, do Fórum contra o Pedágio, o modelo de cobrança das tarifas precisa ser rediscutido imediatamente com a sociedade. “A conservação das estradas deve ser feita com recursos da Cide pois a arrecadação é suficiente para a manutenção de toda a malha rodoviária federal”, afirma.

Para Mezzadri, o governo do estado teria que encampar os pedágios e utilizar a estrutura existente apenas para a manutenção das estradas, sem visar lucro.

As manobras de Jaime Lerner

As rodovias federais do Paraná foram abandonadas e sucateadas para, em 1998, serem entregues às concessionárias de pedágios pelo governo Jaime Lerner. O diretor-geral do DER, Rogério Tizzot, relata que o projeto de privatizações das estradas públicas no Paraná se iniciou em 1996. “O interesse privado e o governo estadual da época formularam um novo modelo: a concessão de rodovias para formar o Anel de Integração. Assim, nasceu o atual sistema de pedágio explorado por concessionárias no Paraná, as quais investiram poucos recursos próprios e financiaram mais de 70% dos investimentos junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), um banco público”, relata.

Desde a implantação do pedágio, as tarifas pagas pelos usuários se tornaram exorbitantes, com poucas obras realizadas. As cobranças eram tão altas que, para garantir a reeleição, em 1998, Lerner assinou um termo reduzindo os preços em 50%. Em retaliação, as concessionárias paralisaram todas as obras durante o período. Após a reeleição, a tarifa foi restabelecida em 100% e 487 km de obras foram cortadas das obrigações das empresas.

Fórum quer acabar com as tarifas

Na luta contra as altas tarifas de pedágios, foi criado, no Paraná, o Fórum Social Popular Contra o Pedágio, que, no dia 30 de janeiro, começou a fazer um abaixo-assinado para coletar 1,5 milhão de assinaturas. O objetivo é a criação de um projeto de lei de iniciativa popular que visa acabar com o atual processo de privatização das rodovias federais no Brasil, propondo a revisão do sistema de concessão das rodovias federais.

Como muitas ações contra os pedágios esbarram na Justiça, o coordenador do Fórum, Acir Mezzadri, acredita que o caminho é a organização da sociedade com ações populares. “Queremos um processo aberto, com toda a sociedade envolvida para discutir qual a melhor saída e a melhor proposta para o setor de infra-estrutura rodoviária do país”, explica.

O retrato da privatização

Tarifas sobem mais de 100%

Desde que foi iniciada a cobrança de pedágio no Paraná em 1998, as tarifas subiram 66,5 % acima da inflação. Enquanto nesse período o índice nacional de preços ao consumidor amplo (IPCA) teve elevação de 62,5 %, o preço do pedágio no estado subiu 129 %.

Arrecadação das empresas aumenta 700%
1998: R$ 92 milhões
1999: R$ 165 milhões
2000: R$ 257 milhões
2001: R$ 356 milhões
2002: R$ 400 milhões
2003: R$ 486 milhões
2004: R$ 544 milhões
2005: R$ 640 milhões
2006: R$ 735 milhões