Justiça anula decreto de desapropriação da Syngenta
Por Solange Engelmann e Pedro Carrano
De Curitiba (PR)
Em uma decisão unânime, os integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Paraná votaram todos pela anulação do decreto de desapropriação do campo de experimentos ilegal de transgênicos da transnacional suíça Syngenta Seeds, em Santa Tereza do Oeste, no Paraná.
O decreto nº7.487 foi sancionado pelo governador do Paraná, Roberto Requião, em novembro de 2006, transformando o local, considerado ilegal,em área de interesse público, para a criação de um Centro de Pesquisa e Referência em Agroecologia, na tentativa de estimular o avanço da reforma agrária e da agricultura familiar. Mais de 170 entidades do Brasil e do exterior apoiaram a desapropriação da fazenda.
Em fevereiro do ano passado, o Tribunal de Justiça do Paraná já havia concedido liminar a favor da Syngenta, suspendendo provisoriamente o decreto do governo. O principal argumento usado pelos desembargadores é o de que a desapropriação do campo de experimentos não respeita os
requisitos legais da legislação.
Segundo a assessora jurídica da organização de direitos humanos Terra de Direitos, Gisele Cassano, o decreto foi anulado por questões técnicas, mas a questão inicial sobre a desapropriação ainda persiste, devido à gravidade da situação, com o assassinato de dois trabalhadores e vários feridos no local. “Ainda é necessário que haja desapropriação, o que pode ocorrer com a edição de
outro decreto, sem os vícios do primeiro”, argumenta.
Cerca da 50 integrantes da Via Campesina, do Movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (Feab), outros movimentos sociais e entidades de direitos humanos estiveram presentes no julgamento, com bandeiras e símbolos de luta.
Durante o julgamento, o direito de propriedade privada foi ressaltado como supremo, sobrepondo-se ao direito ao que diz a Constituição Federal, que prevê desapropriação em caso de desrespeito à função social, como respeito à legislação ambiental.
Em março de 2006, a Syngenta foi multada pelo Ibama em R$ 1 milhão, pelo cultivo ilegal de transgênicos, no entorno do Parque Iguaçu, ou seja, em área de proteção ambiental, o que é proibido pela legislação do país. Na época o local foi ocupado pela primeira vez pela Via Campesina
(organização que reúne os movimentos camponeses do mundo), para denunciar os crimes da empresa contra a biodiversidade.
Tanto que um dos desembargadores presentes emitiu 150 reintegrações de posse contra o MST ao longo de sua carreira, número que, segundo ele, não lhe garante tanta experiência assim no assunto. Assim mesmo, ele pôde concluir que apenas o cultivo de psicotrópicos (drogas) permite a desapropriação imediata de uma área.
No dia 21 de outubro, após a reocupação do campo de experimentos da empresa por 150 trabalhadores da Via Campesina, cerca de 40 homens de uma milícia armada, identificada como “seguranças da empresa NF”, contratada pela Syngenta, atacou o acampamento, executou à queima roupa o militante do MST e da Via Campesina, Valmir Mota de Oliveira, (conhecido como Keno), ferindo gravemente mais seis trabalhadores.
Entre eles Izabel do Nascimento, que ficou cega do olho direito e teve os movimentos de um braço prejudicados. O segurança Fábio Ferreira também foi morto durante a ação.
A Via Campesina e o MST exigem que os responsáveis pelo ataque ao acampamento e os mandantes sejam punidos e para que área da empresa seja transformada em um Centro de Agroecologia.