“Fim das parcerias enfraquece assentamentos”

do Blog da Reforma Agrária O pré-candidato a presidente, José Serra (PSDB), prometeu acabar com os convênios de entidades da reforma agrária com o poder público, para a execução de políticas públicas em assentamentos. Para o engenheiro agrônomo Gerson Teixeira, ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) e integrante do núcleo agrário do PT, o fim dos convênios seria uma punição aos acampados e assentados, rebaixando as suas condições de vida.

do Blog da Reforma Agrária

O pré-candidato a presidente, José Serra (PSDB), prometeu acabar com os convênios de entidades da reforma agrária com o poder público, para a execução de políticas públicas em assentamentos.

Para o engenheiro agrônomo Gerson Teixeira, ex-presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária (Abra) e integrante do núcleo agrário do PT, o fim dos convênios seria uma punição aos acampados e assentados, rebaixando as suas condições de vida.

“Os convênios com as prefeituras, estados e entidades relacionados ao programa de reforma agrária têm sido a forma de viabilização da infra-estrutura social básica, serviços de assessoria técnica, assistência judicial, capacitação e educação”, afirma.

Segundo ele, os trâmites para firmar um convênio são tão rigorosos, que estão inviabilizando o instrumento para o atendimento dos assentamentos .

“São inúmeras as instâncias, procedimentos de instrução e de controle em todo o processo. Enfim, há que se repensar essa modalidade de instrumento público, sob pena de sua completa inviabilização”, afirma.

A seguir, leia a entrevista do Blog da Reforma Agrária com Gerson Teixeira, por correio eletrônico.

Como você avalia as declarações do pré-candidato José Serra, que promete acabar com os convênios de ministérios com entidades sociais para a execução de políticas públicas nos assentamentos?

Sem nenhuma surpresa, pela origem da ameaça. Mas fico profundamente preocupado com a possibilidade de um presidente para o Brasil que aposta no agravamento da crise social do país e que publicamente se declara contra a reforma agrária no Brasil.

Quais seriam as consequências da eliminação dos convênios entre os ministérios e entidades sociais para a reforma agrária?

Certamente, essa possibilidade puniria os acampados e assentados, subtraindo-lhes direitos e precarizando ainda mais as condições de vida nos assentamentos. De um modo geral, os convênios com as prefeituras, estados e entidades relacionados ao programa de reforma agrária têm sido a forma de viabilização da infra-estrutura social básica, serviços de assessoria técnica, assistência judicial, capacitação e educação, entre outros. Inclusive, muitos programas do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Incra não teriam como ser executados.

Já as entidades seriam asfixiadas nas atividades de apoio e formação dos trabalhadores assentados, com consequências na desorganização de uma importante estrutura criada pelas entidades ao longo dos anos para atividades de suporte às ações de reforma agrária. A vida, as lutas e o despertar de consciência dos pobres sempre tiveram férrea oposição dos poderosos, incluindo os aparelhos de Estado sob o seu controle. O caso dos convênios é mais um capítulo das enormes e permanentes ações dos ruralistas contra as forças populares do campo.

Os meios de comunicação tentam desmoralizar essa política, afirmando que os recursos são utilizados para ocupações de terra e protestos de movimentos sociais. Qual o papel para a reforma agrária dessas parcerias dos ministérios com entidades sociais?

Os recursos dos convênios são aportes de recursos públicos complementares às dotações ordinariamente aplicadas pelos programas e ações das políticas setoriais, que fazem a diferença para a garantia da qualidade de vida dos assentados e para o desenvolvimento dos assentamentos. Não surpreende a campanha sistemática dos veículos da grande mídia contrária aos movimentos dos trabalhadores que lutam pela terra. Agora estão congregados no Instituto Millenium defendendo e traçando estratégias para o embate eleitoral em defesa do Serra.

A chamada CPI do MST foi criada para investigar supostos desvios nesses convênio. Até agora, as entidades e os ministérios apresentaram o resultado do trabalho realizado. Qual a sua avaliação do andamento da CPMI?

O MST e suas lideranças já foram investigados até à alma. A CNA e os ruralistas em geral acharam que com a CPMI tirariam a última gota de sangue do Movimento. Até o momento não encontraram mais nada e as sessões da CPMI têm sido um total vazio de ruralistas, exceto pela presença constante do deputado Onyx Lorenzoni, que claramente tem comparecido “de ofício”.

Na última reunião, foi o único ruralista a comparecer e se restringiu a ler materiazinhas da Veja. Daí decorre que, de nossa parte, criamos uma “Batalha de Itararé”.

Mas não dá pra relaxar e o PT e o governo têm atuado com carga total em defesa dos trabalhadores e contra a transformação da CPMI em trincheira para as lutas políticas e ideológicas dos ruralistas sob comando da CNA e a sua presidente.

Quando o governo federal fez desses convênios os principais instrumentos para a implementação de políticas nos assentamentos?

Os convênios foram transformados, no governo Lula, em acessórios indispensáveis para as políticas setoriais dirigidas aos assentamentos e à agricultura familiar como um todo. Por isso, passaram a ser objeto de asfixiamento pelos políticos, mídia e setores da burocracia de direita.

A imprensa não explica o funcionamento dos convênios e passa a imagem de que o governo passa os recursos sem nenhum controle. Como funcionam esses convênios? Qualquer entidade pode fazer as parcerias com os ministérios? Qual o processo de seleção dos projetos? Como são as auditorias?

Atualmente, de tanto rigor e controle, é quase impossível firmar um convênio. Esse desafio assume proporções olímpicas quando se trata de entidade com algum vínculo com os movimentos sociais, por conta da estigmatização pública gerada pelos meios de comunicação. São inúmeras as instâncias, procedimentos de instrução e de controle em todo o processo. Enfim, há que se repensar essa modalidade de instrumento público, sob pena de sua completa inviabilização. Obviamente, sem qualquer frouxidão dos controles internos e externos.

Até o governo FHC, havia uma estrutura estatal de serviço, pesquisa e assistência técnica agropecuária, para o atendimento de assentamentos, pequenas e médias propriedades. O que aconteceu? Como funcionava?

Na verdade, essa estrutura que serviu de plataforma de apoio ao processo de modernização conservadora da agricultura familiar começou a ser desmontada mesmo antes do governo FHC, que cuidou para dar o tiro de misericórdia. O governo Lula vem tentando recuperar esses serviços sob novos formatos, a exemplo do projeto de ATER recentemente criado. No entanto, deu muita liberdade para o MDA decidir. Por enquanto, tudo bem. Mas e se o Serra ganhar as eleições? Quanto a pesquisa, precisamos urgentemente iniciar campanha pela reestatização da Embrapa, que foi transformada numa empresa terceirizada dos grandes laboratórios.

Os movimentos sociais avaliam que esses convênios foram criados no marco do neoliberalismo, com a terceirização de serviços públicos. O que você acha? Você acha que o Estado teria que retomar a responsabilidade pela execução dessa políticas?

Acho que precisamos definir regras e reduzir os níveis de burocratização dos convênios, de modo a viabilizá-los na forma como operam atualmente, sob o absoluto controle do Estado em que pese a responsabilidade de terceiros na execução. Sempre irão existir situações não previstas nas políticas diretamente executadas pelo Poder Público, que demandarão instrumentos auxiliares como os convênios.