Fim da jornada tripla é reivindicação das mulheres camponesas
Por Marcelo Brandão
Da Agência Brasil
Imagine-se entrando no trabalho às 5h30. Às 12h00 vai almoçar e logo depois volta ao trabalho, onde fica até as 20h00. Troque o ar condicionado do escritório pelo brilho do sol, constante, em sua cabeça, grande parte do tempo. Muitos ficam cansados só de pensar. No entanto, há mulheres que lutam pelo direito de ver essa cena apenas na imaginação, não mais uma realidade de jornada tripla, sem o devido reconhecimento.
Por Marcelo Brandão
Da Agência Brasil
Imagine-se entrando no trabalho às 5h30. Às 12h00 vai almoçar e logo depois volta ao trabalho, onde fica até as 20h00. Troque o ar condicionado do escritório pelo brilho do sol, constante, em sua cabeça, grande parte do tempo. Muitos ficam cansados só de pensar. No entanto, há mulheres que lutam pelo direito de ver essa cena apenas na imaginação, não mais uma realidade de jornada tripla, sem o devido reconhecimento.
São as mulheres do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), que estão reunidas em Brasília reivindicando melhores condições de trabalho. O movimento, criado em 2004, tem na capital federal seu primeiro encontro nacional. São cerca de 2 mil mulheres de vários pontos do Brasil, 2 mil histórias diferentes, mas com muitos capítulos em comum. Um deles é a grande jornada de trabalho.
Arlene Boa, 29, coordenadora do MMC, conhece a rotina das camponesas. “São mulheres que acordam de madrugada para preparar a marmita ou o café da manhã para quem acorda depois. Mandam os filhos para a escola, fazem o serviço de casa e vão para a roça trabalhar. E a jornada vai além. Fazem o jantar, limpam a cozinha, cuidam dos animais, molham a horta. Na maioria das vezes, os homens chegam da roça, tomam banho e esperam o jantar ficar pronto para ir dormir. A mulher continua trabalhando e vai dormir mais tarde”.
Arlene diz que nenhuma das atividades é reconhecida. “Esse trabalho na roça, muitas das vezes, não é considerado trabalho. É considerada ajuda, porque não é a mulher quem vende a produção, quem controla o dinheiro. É o marido”.
Rosane Schiavini, camponesa catarinense de 44 anos, luta pelos direitos da categoria desde os anos 1980. Segundo ela, desde essa época nutria um sentimento de mudança. “Já se via que as mulheres não eram reconhecidas como trabalhadoras. No entanto, elas trabalhavam bem mais que os homens, com dupla ou tripla jornada de trabalho. Ainda assim, eram vistas apenas como serviçais, que ajudavam o marido na roça e faziam o serviço de casa. Não apareciam enquanto trabalhadoras”.
Para Arlene, o ideal seria a divisão igual do trabalho doméstico, mas ela sabe que a mudança é difícil. “A jornada de trabalho deve ser coletivizada. Todos os serviços. Educação dos filhos, cuidado com a casa, com as criações. Mas no campo é muito difícil um homem querer mudar isso. Quem está acomodado não vai querer mudar. É a gente que tem que incomodá-los para mudar”.
O 1º Encontro Nacional do Movimento de Mulheres Camponesas do Brasil termina na quinta-feira (21). Sua luta, no entanto, vai além da jornada de trabalho. As camponesas também buscam, dentre uma série de reivindicações, o registro civil para todas as camponesas, a produção saudável de alimentos, tanto para comercialização quanto para consumo e o fim da violência contra elas.
Arlene acredita no evento para iniciar um processo de mudança na sociedade. “Esse primeiro encontro é importante para mostrar que as camponesas existem, que têm direitos e que muitas vezes não são respeitados. Nossa luta, nosso trabalho é todo o dia. Sempre”.