Luta Por Direitos
Assentados da Fazenda da Barra denunciam descaso dos governos com assentamento
Por Filipe Augusto Peres
Da Página do MST
Nesta quarta-feira (20), na Câmara Municipal de Ribeirão Preto, ocorreu uma Reunião Pública para debater os problemas do assentamento da Fazenda da Barra, e assentados denunciaram descaso do poder executivo em relação aos assentamentos.
Chamados pelo Coletivo Ramon Todas as Vozes (PSOL) e o vereador França (PSB), durante a reunião assentados e assentadas reclamaram da falta de apoio do poder público municipal para que os assentamentos possam se desenvolver.
Questões como falta de saneamento básico, falta de água encanada, má condições das estradas e falta de apoio local à agricultura familiar regional, produzida sem o uso de agrotóxicos, foram alguns dos elementos levantados pelos presentes.
Neusa Paviato, da Direção Estadual do MST, lembrou que os mais de 1.700 hectares do assentamento de reforma agrária é uma conquista da classe trabalhadora. Paviato reforçou que a desapropriação da área não se deu, somente, pelo não cumprimento da função social da terra, como manda o artigo 5 da Constituição, mas também pela questão ambiental, uma vez que o antigo proprietário estava degradando totalmente a área. “[…]a gente conquistou ela (a Fazenda da Barra) por não cumprimento da função social e ambiental, que vinha sendo degradado, aquele espaço, um espaço rico dentro de Ribeirão Preto”.
Presidente a Cooperativa Orgânica Agroflorestal Comuna da Terra, militante do MST e assentado pela Reforma Agrária, Lucinei Ferreira (Nei) reforçou o discurso de Neusa e Ramon sobre as dificuldades que os assentados passam pelo esquecimento do governo federal, assim como do governo municipal. De acordo com Nei, a falta de apoio do poder público dificulta o trabalho de recuperação da área devastada pelo antigo proprietário.
“O antigo proprietário destruiu, desmatou toda a área, e hoje nós vemos que é muito difícil recuperar, principalmente por conta de não termos nenhum tipo de apoio do governo federal. O governo municipal, acredito, também tem uma parcela de responsabilidade, mesmo porque o assentamento fica dentro do território de Ribeirão Preto”, afirmou.
O Presidente da Comuna da Terra enalteceu o papel que os assentados vem tendo para lutar pela preservação da água que os ribeiro-pretanos bebem. “É impossível falar que só o governo federal seria o responsável por aquela área. […] A gente ajuda a preservar a água que toda Ribeirão Preto bebe e é um sonho nosso estarmos nessa área para podermos ajudar a preservar e produzir.”
Nei lembrou que a luta atual do MST não é apenas produzir, mas também preservar e desenvolver o meio ambiente.”Hoje, a nossa luta, não é apenas produzir mas, também, preservar, trabalhar com a agrofloresta, com agroecologia. Nós temos a consciência de que só produzir não é suficiente, mas que é preciso produzir com consciência”.
O agricultor familiar lembra que, com menos da metade do assentamento produzindo, o território já produz alimentos sem agrotóxicos para entregar nas escolas de Ribeirão Preto e região. “Se o governo acreditasse, se todo o assentamento estivesse produzindo, a Fazenda da Barra pode produzir alimentos para toda Ribeirão Preto e região, até porque a Comuna, produz, hoje, alimentos para as prefeituras de Ribeirão Preto, Franca, Pontal, Guariba. […] É uma capacidade imensa de produção de alimento desperdiçada dentro de Ribeirão Preto”.
Presidente do CONSEAN (Conselho Municipal de Segurança Alimentar e Nutricional), Luciano Botelho, trouxe em sua fala a memória de que em 2020, o Ministério Público Federal, diante da recusa do governo de Duarte Nogueira em implementar o saneamento no PDS da Barra, condenou tanto a Prefeitura como o Departamento de Água e Esgoto do município (DAERP) a oferecerem projeto de implementação da rede de saneamento básico no assentamento rural. “Olha a que ponto nós chegamos. Do MPF ter de entrar com uma ação obrigando o poder público a fazer aquilo que ele já deve fazer, obrigando a dar água e esgoto de qualidade”.
Em relação ao INCRA, Luciano lembrou que o assentamento Mário Lago é uma referência nacional quando se pensa no modo de produção agroflorestal, mas que esta só foi conquistada porque alguns produtores conseguiram acesso à água. “Aqueles que não tem acesso à água não tem como produzir. Nesse sentido, produzir é um ato de resistência. […] Não foi feita a distribuição de água, foi feita com mangueira de irrigação. Uma mangueira que, no seu interior, vai parando lodo e colônias de bactérias. Ou seja, os assentados estão tomando cloriformes fecais estafilococos. É disso que estamos falando. Nós não temos a dignidade necessária de investimento público, as pessoas não tem uma dignidade para uma vida plena e saudável. De 2016 para cá, nem preciso falar, a política pública não existe para assentamento”.
A importância da produção do assentamento Mário Lago e da parceria do MST com a UMM e a Rede Agroflorestal
Integrante da União dos Movimentos de Moradia e liderança da Comunidade Cidade Locomotiva, Platinir Nunes disse que o poder público pouco ou nada fez pelas comunidades urbanas em Ribeirão Preto e pelo PDS da Barra. Platinir lembrou a importância da parceria entre o MST e a UMM diante do descaso do governo municipal com a população em situação de vulnerabilidade. A liderança falou sobre as diversas ações solidárias que o MST, em parceria com a Rede Agroflorestal, realizou, em várias comunidades urbanas ao longo da pandemia.”Esse casamento (UMM/MST) nos alimentou na pandemia. Estou falando de 20 comunidades, milhares de famílias onde tivemos onde tivemos a oportunidade de ter 42 toneladas de alimentos saudáveis doados ás comunidades”
Os incêndios criminosos e criminalização dos assentados
Agrônomo, ligado à Rede Agroflorestal, Joaquim Lando pediu aos vereadores que prestem atenção à questão do fogo que ocorre todo ano no assentamento. Joaquim lembrou que o poder público ignora as chamas que ocorrem no PDS da Barra e que os incêndios, sempre criminosos, são injustamente imputados à comunidade.
“O assentamento sofre todo ano o flagelo do fogo. Ano a ano, novas áreas, novos espaços são queimados, inclusive de reservas. E como tudo o que acontece lá, vivemos o descaso do poder público em relação àquilo. O descaso, inclusive, da sociedade, porque nós vemos a pauta negativa na imprensa local falando de um incêndio, atribuindo-o, muitas vezes, à própria comunidade a responsabilidade por um ato que não é dela. O incêndio é sempre criminoso. Sempre!”
A negação do poder público para a construção da escola no assentamento
Manuela Aquino, da Direção Estadual do MST, afirmou que os direitos da classe trabalhadora não são garantidos, que entrar na terra é apenas a primeira trincheira da luta pela terra.”Hoje, não só com os assentados de reforma agrária no Brasil, mas com a classe trabalhadora em geral, os direitos não são garantidos. Eles são conquistados pelas classes trabalhadoras do campo e da cidade através de muita luta”.
Ligada ao Setor Estadual de Educação, Manuela fez um recorte das várias movimentações realizadas para que a escola fosse implementada no assentamento Mário Lago ao longo de várias gestões diferentes.
“Eu acompanho desde 2010 a relação da Secretaria de Educação, da prefeitura, de diversas gestões do município em relação à escola do assentamento. […] Nós tivemos várias movimentações ao longo desses anos em relação à escola e acho importante trazer este histórico um pouco neste espaço e ver um pouco a contribuição dessa casa nesta luta pela escola. Nós já tivemos empenhos de recursos para a construção da escola do assentamento. Na gestão da Darcy Vera (ex-prefeita) teve uma movimentação com o INCRA pedindo a concessão de uso do espaço já definido pela comunidade a muitos anos atrás. O INCRA deu esse uso de concessão pelo uso de dez anos, a prefeitura pediu e disse que era muito pouco, pediu outro documento de 20 anos. Na gestão passada do Nogueira, quando a Suely Vilela era a Secretária da Educação, a Secretaria Municipal da Educação se comprometeu, a prefeitura se comprometeu a construir a escola e nada aconteceu”.
Aquino recordou que em reunião com o atual Secretário Municipal da Educação, Felipe Miguel, viu a escola do assentamento Mário Lago na lista de escolas que seriam construídas. Para a militante do MST, o poder público não quer a permanência das pessoas no território de reforma agrária.
“Eu tive reunião presencial com o Felipe Miguel. Ele já me mostrou a lista destas novas construções de escolas que estavam no projeto do município e a escola do assentamento Mário Lago estava lá. […] foi empenhado recurso dessa gestão. Só me resta entender que há uma falta de vontade política de não querer a permanência dessas pessoas lá, porque negar educação para as crianças é negar permanência no território”, encerrou.
*Editado por Fernanda Alcântara