Regeneração ambiental
MST faz semeadura aérea de palmeira juçara ameaçada de extinção na Mata Atlântica
Da Página do MST
Nos dias 6 e 7 de junho acontece a semeadura aérea da palmeira Juçara, fruto conhecido como o açaí da Mata Atlântica, espécie ameaçada de extinção por conta da extração ilegal do seu palmito. A ação acontece em Quedas do Iguaçu, na comunidade Dom Tomás Balduíno, região centro-sul do Paraná e está sendo organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em parceria com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA/PR), Policia Rodoviária Federal (PRF), Itaipu, Agroecology Fund (AEF), Laboratório Vivam de sistemas agroflorestais da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS/LS), Prefeitura e Câmara de Quedas do Iguaçu, e o Instituto Água e Terra (IAT/PR);
Serão lançadas quatro toneladas de sementes da planta numa área de 67 hectares de reserva legal do assentamento onde se encontra a comunidade Dom Tomás Balduíno e nas encostas do alagado do Rio Iguaçu, a área de alagado se estabeleceu após a construção da represa da Usina de Salto Osório.
Segundo Tarcísio Leopoldo, integrante da direção do MST, a área a ser semeada foi escolhida em um trabalho conjunto de mapeamento da região com a universidade. “É uma área que faz parte do Bioma Mata Atlântica e está neste processo de reserva legal há algumas décadas. Antes da comunidade, essa área era utilizada por uma empresa de monocultivo de pinus e eucalipto por muito tempo e já tinha sido degradada. Depois pelo processo de represagem da água, mudou a geografia e o ecossistema local”, explica.
As sementes da juçara têm um alto potencial de germinação se disseminadas em seu habitat natural. A ação visa “recolocar a espécie onde ela devia estar e proporcionar o acompanhamento da germinação da semente, tanto das famílias, quanto da universidade e instituições parceiras que estão organizando a ação e a pós ação”, afirma Tarcísio.
João Flávio Borba, integrante da direção do MST e coordenador do Plano Nacional Plantar Árvores e Produzir Alimentos Saudáveis, no Paraná, ressalta a importância da ação na localidade. “A região onde será semeada a palmeira juçara é zelada por famílias camponesas ligadas à luta pela terra e Reforma Agrária. As encostas que compõem os vales da bacia do Rio Iguaçu têm características de solo e clima adaptáveis ao desenvolvimento dessa espécie”.
O lançamento das sementes de forma aérea busca massificar a disseminação da planta nas áreas de reserva legal de todo o complexo de Reforma Agrária no município de Quedas do Iguaçu, tanto nos assentamentos como nas áreas em fase de regularização, onde vivem mais de 2.500 famílias. Um estudo básico feito entre as famílias da região, chegou a analisar uma média de 8 mil pés de juçara em uma faixa de mata nos arredores das áreas de assentamentos e acampamentos do município. Isso indica um potencial de aproximadamente 80 toneladas de sementes possíveis de serem utilizadas nesses objetivos do projeto.
Segundo, Everton Luiz da Costa Souza, Diretor Presidente do IAT, essa palmeira é de extrema importância para a conservação de florestas no bioma da Mata Atlântica, já que sua preservação assegura o papel ecológico que cumpre na regulação do fluxo dos mananciais, manutenção da fertilidade do solo, fixação de carbono, proteção das encostas das serras e alta variabilidade genética.
Agroecologia, produção de alimentos saudáveis e a Juçara
O acampamento Dom Tomás Balduíno, ainda em fase de regularização, é símbolo de resistência e produção agroecológica. Doze famílias camponesas da comunidade se auto organizam desde 2016 e compõem o Grupo de Produção Orgânica Produzindo Vidas.
Ao longo de seus sete anos de existência, o Grupo já chegou a ser formado por 48 famílias. Originado com o objetivo de viabilizar o processo de certificação orgânica, propiciar a troca de experiências e planejar o processo produtivo nas unidades de produção camponesas de forma agroecológica, atualmente o Grupo assume também outros objetivos mais ousados: a busca por recursos que promovam a preservação dos recursos naturais e a produção agroecológica dentro das áreas de Reforma Agrária no município.
São diversas as atividades produtivas desenvolvidas pelas famílias agricultoras do Grupo Produzindo Vidas, entre elas estão a produção de grãos, mel, leite, hortaliças, frutas nativas e exóticas. A produção de frutas tem se destacado dentro das unidades produtivas das famílias do Grupo, motivadas pela decisão coletiva em desenvolver esta cadeia de produção.
Josué Evaristo Gomes, integrante do MST, acampado no local e integrante do Grupo, conta que há umas cinco décadas atrás, na região onde sua família vive, a palmeira era muito abundante, mas por conta da extração ilegal do palmito-juçara, a espécie foi sofrendo uma redução drástica na região. Desde que ele e a família entraram no lote, a semeadura da juçara já é feita na comunidade. Este é o quarto ano seguido que a família está fazendo a colheita.
Os frutos da juçara, também conhecidos por “açaí da juçara” ou “açaí da Mata Atlântica”, possuem uma casca lisa, de cor violáceo-escura, com uma polpa fina que envolve a semente, semelhante ao açaí da Amazônia. Só na comunidade Dom Tomás Balduíno a produção e beneficiamento da polpa, já chegou a três toneladas de polpa por ano. Quando as famílias tiverem equipamentos de despolpamento e de armazenamento necessários, o potencial de produção será de cinco a seis toneladas.
Josué explica que o trabalho da família começa na coleta dos cachos, depois a retirada dos frutos que são transportados até a unidade de produção onde passam por um processo de seleção e retirada das impurezas. Neste local, a fruta é esterilizada, passa por um processo de amolecimento da polpa e, em seguida, vai para a despolpadeira que separa a polpa dos caroços. A polpa é envasada e congelada e, até o momento, comercializada pura, sem finalização.
Frutas da palmeira juçara coletadas e selecionadas na comunidade Dom Tomás Balduíno, que resulta na polpa e nas sementes que serão semeadas na ação. Foto: Tarcísio Leopoldo
A partir das experiências dessa atividade se constatou a alta concentração de sementes pós-processamento, que chega a ter, aproximadamente, o dobro do peso em sementes do que foi extraído de polpa. A cada 1kg de polpa produzida se acumula em média 2 kg de sementes, que têm destinação. “A semente é distribuída para as famílias que sempre manifestam interesse em semear, para viveiro de mudas aqui da região, grupos agroecológicos da região e, o que sobra, vai para alimentação dos animais”, conta Josué.
Rica em antioxidantes, a polpa representa um importante alimento para as comunidades tradicionais, mas também é utilizada na produção de sorvete, farinha, doces e sucos. Segundo Josué, o planejamento das famílias envolvidas na produção da juçara é avançar no beneficiamento do fruto e criar produtos como o Sorbet de açaí da Mata Atlântica, geléia e bala de banana com açaí. Já a longo prazo, “está sendo pensado para se produzir sorbet de outros sabores encontrados na Mata Atlântica como o da guabiroba”, conta animado.
O trabalho com as frutas nativas da Mata Atlântica já é feito conjuntamente com o projeto Sabores da Agrofloresta, desenvolvido pela Universidade Federal Fronteira Sul (UFFS). Formado por sete grupos de produção agroecológica da região, incluindo o Produzindo Vidas, o projeto trabalha com a coleta, produção, beneficiamento e comercialização de polpas e picolés feitos a partir de frutos como a guabiroba, a uvaia, o araçá, o jerivá, a cereja do mato, a jabuticaba, o morango silvestre, o ananás e o açaí da juçara.
Segundo João Flávio, o Plano Nacional Plantar Árvores Produzir Alimentos Saudáveis do MST enfatiza a importância de recuperar e preservar a Mata Atlântica, assim como todos os biomas brasileiros. “No interior do Paraná, essa floresta foi profundamente devastada nos últimos 50 a 70 anos. A espécie da palmeira juçara foi visada e veio a ser catalogada como espécie em extinção devido a extração do palmito. Preservar essa espécie e recuperá-la é uma ação chave para cumprir esses objetivos”, afirma.
*Editado por Solange Engelmann