Internacionalismo
Informe Conjuntura Internacional: O G20 passou. Mas o que ele deixou?
Por Setor de Internacionalismo
Da Página do MST
O barulho foi grande, as propostas foram muitas, mas a declaração final da Cúpula dos Líderes do G20, que se reuniu no Rio de Janeiro dias 18 e 19 de novembro, foi muito bem definida em matéria do Brasil de Fato: muita letra e pouca ação.
Um documento superficial, que não condena o genocídio em Gaza, não fala em cessar-fogo, não menciona os direitos da população LGBTQIA+, e traz recomendações gerais quem ninguém precisa seguir.
Na avaliação de Paulo Velasco, professor de política internacional da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), “documentos desse tipo carecem de aplicação prática. Talvez a única coisa mais prática de tudo seja a Aliança Global contra a Fome. Mas de resto, é um documento que não traz ônus para os Estados. Então, apoiar um compromisso geral superficial em transição energética e combate a mudanças climáticas é possível, mesmo que o país tenha um presidente negacionista”.
Nem genocídio, nem cessar-fogo… Apenas ‘preocupação’
Para o Instituto Palestinos para Diplomacia Pública (PIPD), a declaração final foi uma ‘grande decepção’, ao não responsabilizar o governo de Israel pelo genocídio em Gaza.
“O que está acontecendo em Gaza é um genocídio, não é apenas uma situação humanitária catastrófica, é a continuação de um projeto colonial israelense de 76 anos. Fechar os olhos para o efeito de um genocídio transmitido ao vivo terá resultados catastróficos para a nossa geração e para muitas outras que virão”, afirma nota da organização ao Brasil de Fato.
Apenas um dia depois de divulgada a declaração final do G20, os Estados Unidos vetaram mais um projeto de resolução do Conselho de Segurança da ONU para um cessar-fogo “imediato, incondicional e permanente” na Faixa de Gaza.
Pressão para ações concretas
Enquanto os governos seguem sem se comprometer em tomar medidas concretas contra Israel, os movimentos populares fortalecem a denúncia e a pressão. Israel foi condenado por genocídio no Tribunal Popular que julgou os crimes do capitalismo, durante as atividades da Cúpula Social do G20. E no sábado, 16 de novembro, milhares de pessoas integraram uma marcha pela orla de Copacabana no Rio de Janeiro (RJ) para pedir o fim do genocídio e o rompimento das relações com Israel.
Dois dias após o final da Cúpula do G20 e um dia depois do veto dos EUA por um cessar-fogo imediato, o Tribunal Penal Internacional fez o que os governos não tiveram coragem de fazer: condenou o governo de Israel e emitiu mandado de prisão contra o primeiro ministro israelense Benjamin Netanyahu seu ex-ministro da Defesa, Yoav Gallant, acusados de “crimes contra a humanidade e crimes de guerra cometidos de pelo menos 8 de outubro de 2023 até pelo menos 20 de maio de 2024”.
Segundo o Ministério da Saúde da Faixa de Gaza, 44.056 pessoas foram mortas e 104.268 estão feridas em função dos ataques de Israel desde 7 de outubro de 2023. A maior parte das vítimas é composta por mulheres e crianças. Mas esse número pode ser muito maior, porque milhares de pessoas estão desaparecidas e ainda há corpos que foram soterrados sob escombros ou áreas em que as equipes médicas não conseguem ter acesso.
O que será do mundo e dos Estados Unidos com Trump?
Com uma maioria conservadora no Congresso, no Senado e na Corte Suprema, Trump assume a presidência dos Estados Unidos com muito mais poder do que teve no seu mandato passado, o que lhe permitirá, em princípio, levar à frente, de forma rápida e imediata, a sua “agenda nacional”.
Para Branko Marcetic, escritor da redação da Jacobin, essa “agenda nacional” significa um programa para enriquecer ainda mais os bilionários e a austeridade para o resto da população. “Tudo o que estamos vendo sobre os planos do novo governo por meio de pessoas de dentro deixa bem claro que este será um governo de, por e para grandes empresas, com uma agenda favorável aos negócios de cortes de impostos, desregulamentação e expansão da produção de energia”.
As escolhas de Trump para liderar o governo dos Estados Unidos reflete essa agenda, com nomes de radicais, ultraconservadores, bilionários, xenófobos, sionistas e racistas. Mas todos com uma mesma característica: nenhum tem experiência de governo
Um apresentador de TV, supremacista branco e nacionalista cristão como Secretário da Defesa da maior força militar do planeta; um defensor da deportação em massa para cuidar das fronteiras; dois empresários bilionários, Elon Musk e Vivek Ramaswamy, como líderes do Departamento de Eficiência Governamental, um painel com ambições ousadas de cortar custos governamentais e reestruturar agências federais.
E um ultradireitista radical, favorável a exercer máxima pressão sobre a China, Irã, Venezuela e Cuba, e fervoroso defensor de Israel para secretário de Estado, cargo equivalente ao de ministro das Relações Exteriores.
Repetindo o slogan de “fazer a América grande de novo”, Trump deve reprisar seu primeiro governo, focando mais no que acontece dentro de suas fronteiras do que fora delas. As relações internacionais serão pautadas pelos interesses econômicos estadunidenses, utilizando-se da sua força bruta, financeira, tecnológica e militar para impor sua vontade onde considere que seja necessário. Com um apelo, só em última instância, ao recurso da guerra.
Para o professor José Luis Fiori, isso significa, entre outras coisas: um aumento da intensidade da competição e do atrito entre EUA e China, com uma aceleração sem precedentes da sua competição tecnológica e militar, com a universalização de sua “guerra comercial”, incluindo-se a possibilidade anunciada por Trump, de punição dos países que não utilizem o Dólar em suas transações internacionais, em particular no caso do grupo do BRICS.
No caso do Oriente Médio, Trump deve aumentar o apoio do governo norte-americano à Israel e às suas guerras em Gaza e no Líbano, além de aumentar a política de “pressão máxima” contra o Irã.
Com relação à guerra na Ucrânia, o mais provável é que que se iniciem de imediato as negociações de paz, com o reconhecimento implícito por parte dos EUA da vitória militar russa. Mas EUA e a Inglaterra, junto com seus aliados europeus, sigam se armando contra a Rússia, o grande “inimigo externo”. Por isto, se houver um acordo de paz na Ucrânia, o mais provável é que ele seja também o ponto de partida de uma nova corrida armamentista, cada vez mais intensa, dentro da própria Europa, e obviamente, entre os EUA e a Rússia, com repercussões em cadeia, em todas as direções e latitudes do Sistema Mundial.
Por fim, os países periféricos da América Latina e da África não têm a menor importância dentro do projeto internacional de Donald Trump, que supõe sua submissão pura e simples ao poderia monetário e econômico dos EUA.
A luta contra o neocolonialismo e o imperialismo na África
Mas que ninguém pense que não haverá resistência. Na África Ocidental, região conhecida como Sahel, os povos têm resistido e enfrentado a dominação colonial e o imperialismo.
Nos últimos anos, Mali, Niger e Burkina Faso viveram levantes militares com apoio popular que expulsaram tropas francesas e estadunidenses desses países e colocaram na agenda uma série de demandas populares que vinham sendo expressas nas ruas há décadas.
Para o jornalista e professor Alex Anfruns, essa “atual Revolução Pan-Africana introduz uma novidade em relação ao período de descolonização francesa e à geração de independências: não só identifica e denuncia as potências que desestabilizam o Sahel e são de fato inimigas da soberania africana, mas consegue derrotar suas estratégias de militarização, bloqueio, sanções e chantagem, impondo uma nova correlação de forças.”
A criação da Aliança dos Estados do Sahel (AES) retoma uma reivindicação fundamental do pan-africanismo revolucionário, formando uma Confederação que seria o embrião da unidade africana.
Já no Senegal, outro país da África Ocidental que elegeu recentemente um presidente progressista, conquista vitória progressista também nas eleições legislativas, resultado considerado conquista contra o neocolonialismo e caminho de ‘libertação nacional’
“Nós, o povo senegalês, queríamos uma ruptura, queríamos mudar de governança, para, enfim, estar no caminho da soberania nacional. É uma vitória contra as estruturas neocoloniais”, celebra Khady N’diaye, integrante da Organização dos Povos da África Ocidental (OPAO).
O socialismo africano
São muitos os líderes africanos que pensaram e implementaram políticas de cunho socialista nos primeiros governos nacionais pós lutas de libertação no continente. Kwame Nkrumah, em Gana; Samora Machel, em Moçambique; Thomas Sankara, na Burkina Faso; entre muitos outros.
Conheça um pouco da tentativa da Tanzânia de construir o socialismo com Julius Nyerere, no artigo “Visões do socialismo tanzaniano”, de Leander Schneider.