Reforma Agrária Popular

Comunidade Maila Sabrina: O que foi, o que é, e a potência do que se torna

Confira o artigo sobre a comunidade do MST no Paraná que vai receber o presidente Lula nesta quinta-feira (29)

Foto: Carolina Calixto

Por Carolina Calixto*
Da Página do MST

Ouso dizer que, em sonhos profundos da memória, eu soube e desejei escrever este artigo que escrevo hoje, para vocês. Para nós. Nós que também sonhamos com uma emancipação humana, da natureza e dos seres viventes que habitam esta Terra conosco.

Há quatro anos atrás, na minha condição de pesquisadora, eu entregava, com lágrimas nos olhos e acompanhada por muita gente boa e querida, o fruto do meu trabalho, obtendo assim o título de Mestre em Direitos Humanos. Mais do que isso, este trabalho marcou não só a mim, mas a toda uma comunidade, um Movimento. Eu falava, e ainda falo, do – agora, com tanto orgulho, assentamento –Maila Sabrina. Da força que este lugar possui, da beleza e especialmente, das pessoas que fazem o Maila ser o que é, o que foi e o que será.

Dizer a história do MST e do assentamento Maila Sabrina é também lembrar a memória viva e construir diariamente, em coletivo, as lutas pela efetivação dos direitos humanos fundamentais, previstos na Constituição Federal brasileira, sejam eles o de uma educação para todos, moradia digna e justa, comida saudável e livre de veneno, reforma agrária popular, fomento de uma economia solidária e outra lógica de mercado, menos excludente e desigual.

O legado acumulado do MST é anterior a sua formalização, naquela reunião em 1984, pois as demandas sociais e políticas já existiam e o clamor por justiça social, pela ocupação dos espaços pelo povo eram latentes. 

Foto: Carolina Calixto

A centralidade no ser humano, o cuidado com as pessoas e com a coletividade e o seu entorno (a preocupação com o meio-ambiente é uma das frentes do Movimento) se tornam o motivo pelo qual o MST não só prospera até os dias atuais, mas porque é um dos movimentos populares mais emblemáticos do mundo.

O antes acampamento, agora assentamento Maila Sabrina, é lar de mais de 370 famílias e conta com 23 anos de existência e resistência, no que antes era um dos maiores latifúndios do estado do Paraná, terra que era além de improdutiva, sofria com abusos de devastação ambiental, em descumprimento com a lei que estabelece a Reserva Legal. 

A comunidade que lá habita, criou seu mundo com cores e sabores, transformando o que era ganância em uma verdadeira comunhão: frequentemente realizavam doações de alimentos e outros bens a outras comunidades urbanas, participavam ativamente em prol da resolução das questões que atingiam a cidade de Ortigueira, onde o assentamento está localizado, e outras cidades próximas, como Faxinal. Quem tivesse olhos e bom senso era capaz de ver e sentir o bem sendo realizado por essas pessoas, onde quer que fosse. As bandeiras do MST de educação, igualdade de gênero, moradia, cooperativismo, reforma agrária, alimentação saudável, tudo isso estava e está sendo representado pelo assentamento Maila Sabrina.

Foto: Carolina Calixto

O que o futuro reserva para o MST e o Maila, então? O que se pode esperar? O que foi desenvolvido, construído no Maila Sabrina, não pode ser destruído e não tem reparação. Daqui para frente, só consigo enxergar um horizonte de, como me disse um grande amigo, certa vez: “repartir a terra, a comida, plantar a semente, encaixar-se nessa nova perspectiva.” É o que espero, por muitos e muitos anos, para todos aqueles que buscam um Brasil diferente. Um Brasil renascido. Sei que há tantos por aí para compartilhar deste sonho comigo e com essa gente forte e destemida do assentamento Maila Sabrina.

*Carolina Calixto é pesquisadora, Doutoranda em Ciência, Tecnologia e Sociedade pela UTFPR, Mestre em Direitos Humanos e Democracia pela UFPR e militante do MST.

**Editado por Fernanda Alcântara