Agroecologia é o Caminho!
Massificação da Agroecologia se torna prioridade do MST no próximo período
Com objetivo de ampliar a produção agroecológica nos territórios da Reforma Agrária, teve início nesta quarta (22), o Curso de Massificação em Agroecologia na região Nordeste, previsto para ocorrer nas demais regiões do país

Por Solange Engelmann
Da Página do MST
Desde os anos 2000, após vários debates coletivos, o MST dá uma guinada no modelo de agricultura camponesa e familiar dos assentamentos de Reforma Agrária, entendendo que o uso dos agrotóxicos e aditivos químicos destroem o meio ambiente, a saúde de todos os seres e colocam em risco o futuro da humanidade. A partir desse período, os Sem Terra iniciam um processo de transição do modelo de produção convencional para outro modelo, com a matriz de produção baseada na agroecologia e produção de alimentos saudáveis, em equilíbrio com a natureza.
Nos últimos anos, esse processo de transição para a agroecologia vem sendo gestado e enraizado nos territórios do MST, como assentamentos, acampamentos, escolas, centros de formação, cooperativas, entre outros. Porém, nesse momento esse processo entra em uma nova fase, em que o Movimento inicia uma nova etapa no projeto de Reforma Agrária Popular, com a massificação da agroecologia como estratégia central no enfrentamento ao modelo do agronegócio e na consolidação de práticas sustentáveis como processos de resistência e transformação social. Busca-se, assim, desencadear um processo de reterritorialização e reconstrução da vida nos assentamentos da Reforma Agrária.
“Os principais objetivos desse processo são a produção em larga escala de alimentos saudáveis e sustentáveis para a soberania alimentar; a recuperação e preservação ambiental; e a formação política pedagógica das famílias assentadas, para que a agroecologia seja o modelo produtivo dominante, a partir da integração de saberes tradicionais e científicos”, enfatiza a agricultora Joice Lopes, agrofloresteira, assentada da Reforma Agrária no assentamento Dandara, em Promissão, São Paulo, e integrante da coordenação nacional do MST.

Nesse contexto, a formação política e técnica em agroecologia assume papel estratégico nos territórios do MST, com a retomada de processos formativos junto às famílias assentadas e acampadas, para que estas sejam capazes de garantir a produção de alimentos saudáveis, a defesa dos territórios conquistados e a ressignificação da identidade camponesa, na construção sócio-política de um novo modelo de sociedade mais diverso e plural.
Cursos de formação política e técnica em agroecologia
Como uma das primeiras etapas da nova fase de massificação, o setor de Produção, Cooperação e Meio Ambiente do MST inicia a realização do Curso Nacional para Massificação da Agroecologia, previsto para ser realizado em todas as regiões do país, em centros e escolas de formação do Movimento.
“O Curso Nacional para Massificação da Agroecologia é uma iniciativa estratégica do MST para formar pessoas, consolidar territórios, qualificar a Reforma Agrária Popular e disputar, na prática e no debate das ideias, um novo projeto de sociedade a partir do campo e dos camponeses”, resume Clarice Rodrigues, do setor de Produção do MST no Nordeste.

Joice explica que o processo formativo pretende envolver as famílias nos territórios do MST para avançar na compreensão política e técnica sobre a agroecologia e alavancar experiências, por meio de cursos, oficinas e intercâmbios, em que as próprias comunidades funcionem como laboratórios e espaços de aprendizado. A intenção é aprofundar a compreensão teórica dos Sem Terra sobre esse modelo produtivo e aplicar a agroecologia em grande escala.
“A metodologia de “Camponês a Camponês”, com participação ativa das famílias, permite a troca de saberes e a construção de soluções agroecológicas adaptadas a cada realidade local, impulsionando a territorialização da agroecologia. Nosso foco será na autonomia e na cooperação: através da cooperação visamos fortalecer a autonomia das famílias para que possam produzir alimentos saudáveis, garantir o sustento e ter mais controle sobre seu trabalho. A cooperação também é vista como essencial para a produção em massa e o acesso a alimentos de qualidade para todos”, detalha Joice.
Entre o segundo semestre deste ano e 2026 serão realizados cursos de massificação da agroecologia em todas as regiões do país, iniciando com o Curso de Massificação da Agroecologia na região Nordeste, que teve início nesta quarta-feira (22) e vai até o próximo dia 11 de novembro, sendo realizado na área de Produção Agroecológica Ana Primavesi, no assentamento Bernardo Marim, em Russas (CE). Entre os dias 12 de novembro e 3 de dezembro, é vez da região Sul, que realiza o curso na Escola de Agroecologia Milton Santos, em Paiçandu (PR), nas demais regiões do país a previsão é que os cursos aconteçam em 2026.

Para avançar no processo formativo, na massificação e viabilidade tecnológica de um modelo de produção agroecológico, ao longo dos anos o setor de Produção do MST tem buscado parcerias na organização da produção e massificação da agroecologia, com entidades públicas e privadas, visando o fortalecimento da produção e comercialização, expansão de bioinsumos, plantio de árvores, a partir do Plano Nacional Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis, e fomento na educação e formação técnica e política.
A partir disso, Joice relata que no último período o Movimento define como foco central a necessidade de avançar na produção de alimentos saudáveis e recuperação do meio ambiente, a partir do fomento a experiências de produção com bioinsumos, para aumentar a produtividade sem depender de produtos químicos; aliado ao plantio de árvores, implantação de agroflorestas, coleta de sementes nativas e organização de viveiros para restauração ecológica.
O MST também tem intensificado os intercâmbios e parcerias, principalmente com a China para a mecanização do campo, a partir da necessidade de garantir tecnologias voltadas para a agricultura familiar e camponesa de pequeno e médio porte. “O Brasil tem um passivo de mecanização, que o modelo atual não dá conta de resolver, pois não é adaptado à realidade da agricultura de pequena escala, com máquinas de pequeno porte, a custo acessível. Para avançarmos na produção de alimentos com foco na agroecologia precisamos ter um movimento industrial no País para mecanizar a pequena agricultura com tecnologia adaptada para cada região do país”, evidencia Joice.
Outros desafios enfrentados pelos camponeses Sem Terra em todo país, se concentram na transição energético, com o uso de energias renováveis, de forma justa e sem destruir o meio ambiente e afetar negativamente os povos do campo, das água e das florestas, buscando a construção também de uma soberania hídrica e energética do povo; além da necessidade de produzir as próprias sementes agroecológicas, para produção de alimentos saudáveis nos assentamentos, pois a privatização das sementes tem se tornado outro entrave que prejudica a autonomia dos camponeses.
Curso de Massificação da Agroecologia no Nordeste
A intencionalidade do Curso de Massificação da Agroecologia no Nordeste é formar “sujeitos coletivos” que atuem como agentes multiplicadores da agroecologia nos territórios do MST, destaca Clarice Rodrigues. “Trata-se de uma formação estratégica para capacitar pessoas em práticas agroecológicas. A ‘massificação’ significa levar essa prática para o maior número de pessoas possível, tornando-a hegemônica nos nossos assentamentos e acampamentos”, projeta ela.
Os cursos ocorrem inicialmente nas cinco regiões do país para, em seguida, serem reproduzidos nos estados, regiões e localidades, funcionando como instrumentos de enraizamento e multiplicação de saberes e técnicas agroecológicas para estabelecer novos frutos na implantação de sistemas agroecológicos nos territórios de Reforma Agrária.

“A expectativa é aprofundar e unificar a compreensão política da agroecologia como elemento central do projeto do MST. Espera-se formar quadros que levem esse debate para as bases. No debate com a sociedade, esperamos que os formados atuem como embaixadores de um novo projeto para o campo brasileiro. O curso busca criar pontes e influenciar o debate público, posicionando a agroecologia e a Reforma Agrária Popular como soluções viáveis e necessárias para as crises alimentar, ambiental e social do país”, projeta Clarice.
Já na fase de implantação das experiências concretas ela acrescenta: “A expectativa é a transformação material dos territórios, com a multiplicação de experiências e que cada participante seja um agente de mudança em seu território, assentamento ou comunidade, implementando e difundindo técnicas e práticas agroecológicas”, recomenta.
O início dos cursos pela região Nordeste é crucial devido à importância estratégica da região para o MST, no avanço de práticas agroecológicas no semiárido nordestino, no fortalecimento desse sistema produtivo e na consolidação da Reforma Agrária Popular na região.
“O Nordeste é um polo significativo de assentamentos e acampamentos da Reforma Agrária Popular, com uma grande base social camponesa. Realizar esse curso aqui é uma forma de fortalecer diretamente esses territórios, que frequentemente enfrentam desafios como o clima semiárido, a pressão do agronegócio e a necessidade de consolidação de modelos agrícolas sustentáveis e resilientes”, finaliza Clarice.
Para o MST, no longo prazo, a previsão é que a experiência do Curso Nacional de Massificação da Agroecologia no Nordeste e nas demais regiões do país viabilize o crescimento no número de assentamentos com conhecimentos e práticas agroecológicas, demonstrando a viabilidade econômica, ambiental e social desse sistema. Além de fortalecer os circuitos locais e regionais de produção e consumo de alimentos saudáveis, avançando na geração da autonomia dos camponeses/as e na soberania alimentar em cada região do país.
*Editado por Fernanda Alcântara