ONU garante legitimidade das ocupações e condena criminalização dos movimentos

O relator especial da Comissão de Direitos Humanos da ONU para moradia digna, Miloon Kothari, afirmou, durante audiência com movimentos sociais em São Paulo, que as ocupações são legítimas e condizentes com a luta pelos direitos humanos. Ele também ressaltou que dará destaque à repressão e criminalização dos movimentos sociais no relatório que está preparando sobre os principais problemas vinculados à questão da habitação e políticas públicas para assegurar o direito à moradia adequada, tanto no campo, quanto nas áreas urbanas.

Kothari chegou ao Brasil a convite do governo federal, em 30 de maio e permanecerá no país até 13 de junho, numa jornada de visitas pelas cidades de Brasília, Rio de Janeiro, Fortaleza, Salvador, Recife, Alcântara (MA) e comunidades próximas às grandes capitais. O relator manterá encontros com representantes da sociedade e dos governos municipal, estadual e federal para avaliar o cumprimento, por parte do Estado brasileiro, da constituição nacional e dos tratados internacionais referentes aos direitos humanos da habitação.

O percurso começou pela cidade de São Paulo, onde cerca de 600 mil pessoas vivem em cortiços, 2 milhões em favelas e 3 milhões em moradias precárias. Em dois dias, Kothari visitou favelas, mutirões, ocupações, projetos de habitação e realizou reuniões com autoridades dos governos municipal e estadual.

Fechando sua visita ao estado, na noite de 31 de maio, ele participou de uma audiência pública com os movimentos de moradia que fizeram relatos de suas lutas e da criminalização que sofrem. O dirigente do MMC (Movimento de Moradia do Centro), Luiz Gonzaga da Silva, o Gegê, preso por 51 dias, relatou a ação violenta da polícia em despejos, as condições sub-humanas vividas por essa população, os projetos de mutirão popular, autogestão e outras propostas dos movimentos que poderiam ser transformadas em programas do governo.

Na audiência, o relator afimou que “o governo tem obrigação de atender às necessidades básicas da população, o que claramente não está acontecendo” e que falta uma melhor articulação entre as políticas em nível federal, estadual e municipal. Khotari, que participou da luta por moradia na Índia nos anos 80, reafirmou a importância dos movimentos sociais brasileiros e que sua “tremenda experiência, tem sido referência mundial”. Ele defendeu ainda a legitimidade das ocupações quando a população não tem outra opção e o Estado é negligente no atendimento às demandas de habitação.

O relatório final da visita será entregue junto com uma série de recomendações ao governo federal e apresentado à Comissão de Direitos Humanos da ONU, em março de 2005. O projeto abordará a propriedade e distribuição de terra, ameaças de mais deslocamento de população rural, as favelas e as moradias de risco nas cidades, a situação das populações quilombolas, indígenas e sem terra, o papel do Poder Judiciário em garantir o acesso à moradia e as soluções práticas e experiências positivas em relação a estes problemas.