Venezuela: a potência energética independente

Evandro Bonfim, da Agência Adital*

A era dos combustíveis fósseis parece longe de acabar, apesar das demandas dos ecologistas. Os poucos resultados práticos da I Cúpula Mundial de Energia Renovável, realizada no último mês de junho na Alemanha, demonstram que fontes de energia como petróleo devem ditar os movimentos do xadrez geopolítico internacional. Segundo especialistas, os combustíveis fósseis representarão quase 90% do total do procura por energia nas próximas duas décadas.

As últimas investidas dos EUA possuem claramente esta orientação: tanto o Iraque como o Afeganistão estão entre os maiores produtores de óleo cru e gás natural, respectivamente. As demais reservas do Oriente Médio, também estão implicitamente à disposição do país, como evidencia as estreitas relações entre a família do presidente Bush e o clã real saudita e mesmo a família do terrorista Osama Bin Laden, conforme revela o documentário Fahrenheit 9/11, de Michael Moore.

Mas, e se o petróleo morar ao lado? De acordo com a empresa petrolífera estatal Petróleos de Venezuela (Pdvsa), o país governado por Hugo Chávez tem reservas de petróleo para mais de 285 anos ao ritmo da produção atual, ao passo que o resto da região, sem incluir o México, teria reservas para apenas mais oito anos. A Venezuela produz 14% do petróleo importado pelos EUA, ocupando a terceira posição entre os fornecedores do combustível ao país. Assim, não deve parecer estranho que as tentativas golpistas de 2002 tenham começado pelo setor petroleiro, e que o referendo popular que pode significar a saída do mandatário que aposta na integração energética pública dos países latino-americanos esteja sob os holofotes da imprensa e dos líderes políticos mundiais.

Com isto, Venezuela desponta como a principal potência energética mundial desvinculada do cartel das sete irmãs (oligopólio composto por empresas anglo-americanas de exploração de hidrocarbonetos), embora pertença ao oligopólio da Organização dos Países Produtores de Petróleo (Opep). O cenário mundial ressalta esta avaliação: estima-se que a demanda global de petróleo será incrementada em um ritmo anual de 2%, ou seja, de 81 milhões de barris diários em 2003 a 112 milhões de barris diários em 2025.

O que pode se alcançar com a independência energética?

Conforme postula o governo de Hugo Chávez, a questão energética pode ser o eixo de integração da América Latina. A proposta da Pdvsa consiste na implementação de zonas petrolíferas regionais (Petrosur, Petrocaribe e Petroandina) reunindo as petroleiras estatais que, em rede, formariam a Petroamérica. Os aportes das diversas nações seriam variados. Venezuela e Equador, por exemplo, contam com grandes reservas de petróleo. Bolívia as possui de gás. Brasil detém a tecnologia mais avançada de prospecção e exploração destes combustíveis, sobretudo em águas profundas.

Com isso, não apenas os países latino-americanos se poriam à parte das vicissitudes dos cartéis internacionais de petróleo, obtendo a independência energética da região, como também passaria a contar com uma moeda de peso nas negociações econômicas y políticas mundiais, para além do tradicional perfil agropecuário e extrativista usual. Os primeiros resultados desta política alternativa, que inclui além do petróleo outros setores produtivos, já podem ser vislumbrados através das ações do governo Hugo Chávez, reconhecidas inclusive pelos adversários.

Por exemplo, grande parte dos lucros com petróleo se transformam em investimentos para o social. Por recomendação do Banco Central (BCV), existe desde o último mês de maio o Fundo de Desenvolvimento Econômico Social País (Fdesp), com aporte inicial da Pdvsa de US$ 600 milhões de dólares, mas que, no momento, chegam a US$ 2 bilhões, provenientes de receitas petroleiras extraordinários e arrecadações do Serviço Nacional Integrado de Administração Aduaneira e Tributária (Seniat). Estes recursos estão sendo usados para expandir o setor produtivo e ampliar o número de postos de trabalho com o financiamento para a criação de novas indústrias, em projetos ambientais e de casa própria.

No entanto, na Venezuela, apesar de iniciativas como os mercados populares, projetos de alfabetização massiva e de saúde nos bairros, se encontra a mesma dificuldade dos demais países latino-americanos em converter cifras econômicas em pleno benefício social. Contudo, o referendo do dia 15 será a oportunidade dos venezuelanos avaliarem, além dos resultados cotidianos, o caminho escolhido pelo mandatário para conduzir o país, que ao menos no caso do petróleo, está significando o retorno para a própria nação das riquezas que emanam do território que ocupam.

* Evandro Bonfim é jornalista da Adital.