Assentados comemoram uma década de resistência no Paraná

As 1.500 famílias do MST dos assentamentos Ireno Alves e Marcos Freire, em Rio Bonito do Iguaçú, região central do Paraná, organizam uma grande festa para comemorar dez anos de ocupação e resistência. Na última segunda-feira, 17 de abril, dia dos dez anos do Massacre de Eldorados do Carajás (PA), os assentados da maior ocupação do sul do Brasil comemoraram uma década de resistência.

A festa teve início às 10h00 com uma mística, onde os assentados contaram a trajetória de luta da área. Em seguida houve uma celebração ecumênica com religiosos. Às 11h00 foi realizado o ato político com autoridades da região. Logo após, churrasco e moda de viola caipira com Zico e Zeca, Brasão e Brasãozinho e Gauchito do Acordeon. Além disso, os Sem Terra organizaram um torneio de futebol e apresentação de teatro.

O presidente da Central de Associações do Acampamento Ireno Alves (Acamf), Ênio Pasqualim comemorou a conquista afirmando que a ocupação da Giacomet marcou o início da história dos Sem Terra em Rio Bonito do Iguaçú. Pasquialim contou ainda que hoje os assentados são respeitados no município, mas quando ocuparam a área a situação era outra. “Quando chegamos aqui eramos considerados uma tropa de baderneiros, que estava sujando a imagem da região. Mas hoje estamos provando para a população, através do nosso trabalho e da produção, que estamos lutando pelo direito de produzir seu próprio sustento e por dignidade”, garantiu.

Segundo Pasqualim, atualmente a relação com o poder público da cidade é muito boa porque na última eleição, em 2005, os assentados apoiaram o atual prefeito, Joel Moreira (PT) e elegeram o primeiro vereador assentado também do PT, Danilo Ferreira de Almeida . “Foi a primeira vez na história do município que elegemos um prefeito que representa a classe trabalhadora”, afirmou.

Para o coordenador estadual do MST Laureci Leal, este é um momento muito importante para as famílias que estão comemorando dez anos de luta e conquista. Os assentamentos Ireno Alves e Marcos Freire geram juntos mais de 10 mil empregos direitos e indiretos na cidade. Segundo Leal, isso mostra que devemos acreditar na capacidade dos trabalhadores e trabalhadoras de resolver os problemas sociais.

Para o prefeito, o município é da Reforma Agrária e crescei graças à luta do povo trabalhador. “Para conseguirmos a Reforma Agrária no país e termos crédito voltado ao pequeno agricultor precisamos acreditar cada vez mais em nossa classe”, argumenta.

Já Danilo de Almeida destacou que todos esses anos de resitência têm um grande significado para os assentados. A Giacomet era um latifúndio perigoso, onde muitos trabalhadores foram mortos. Em 1997, os Sem Terra Vanderlei das Neves e José Alves dos Santos foram assassinatos pelos pistoleiros da fazenda em uma emboscada.

Um dos casais do assentamento Ireno Alves, Marlene Moíses e Antonio Maria Moíses, são filhos de assentados da região e acamparam na Giacomet porque não tinham como ficar no lote dos pais. Eles entram na fazenda com as mais de 3 mil famílias há dez anos. Segundo os assentados, as maiores dificuldades encontradas pelas famílias durante a ocupação falta de alimentos, trabalho e assistência à saúde e descaso do poder público.

“Há dez anos nós não tínhamos para onde ir. Hoje tenho meu terreno para morar e produzir o sustento da minha família. Esses dez anos significa um pedaço da minha vida”, argumenta Antonio Moíses.

Para Dioníso Vandressen, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), “antes essa fazenda era apenas uma terra de negócios, mas agora produz alimentos para as 1.500 famílias assentadas, que travaram uma enorme luta por dignidade nesse grande latifúndio”, garante

O prefeito do município decretou ponto facultativo na cidade e a partir de agora o dia 17 de abril será feriado municipal, para comemorar a vitória dos assentados e relembrar o Massacre de Eldorado dos Carajás.

Estiveram também presentes no ato político a deputada federal do PT, Selma Chons, o ex-secretário de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social do Paraná, Padre Roque Zimmermann, o superintendente regional do Incra do Paraná, Celso Lisboa de Lacerda, entre outros prefeitos e autoridades da região.

Durante a festa, os assentados homenagearam o lutador Ireno Alves Santos, que deu o nome ao assentamento e morreu em um acidente de carro no dia 25 de dezembro de 1996.

Educação e produção

Durante os dez anos os assentados conquistaram dez escolas de educação infantil e ensino médio, que funcionam dentro dos dois assentamentos. São seis escolas de municipais de 1ª a 4ª série, quatro escolas de ensino fundamental 5ª a 8ª série e duas escolas de ensino médio. Em uma delas funciona a Escola Base, das Escolas Itinerantes. Todos os filhos dos assentados estudam, somando cerca de 2.000 alunos.

A cada ano os dois assentamentos produzem em média 500 mil sacas de milho, 50 mil sacas de soja, 50 mil sacas de feijão, 10 mil sacas de arroz. Os trabalhadores criam em média 20 mil animais entre: suínos, bovinos e aves, para comercialização e consumo próprio. Já no leite, são 24 mil litros por dia, chegando a 880 mil litros por ano

Os assentados conquistaram créditos junto ao gorverno federal para investir nos lotes e estrutar os assentamentos. Mais de 2 milhões de reais de crédito fomento e alimentação, cerca de 4 milhões de reais de crédito habitação e aproximadamente 13 milhões de reais de Investimento do Procera (Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária) e Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Além de 28 milhões pelo PAC (Programa de Consolidação dos Assentamentos).

Segundo o prefeito, quando a fazenda era da Giacomet a arrecadação do município gerava em torno de 600 mil reais, mas hoje com os assentamentos a cidade arrecada em torno de 1 milhão e trezentos mil reais, uma diferença de 500 milhões de reais. Moreira salienta, que o comércio ganha com isso, aumentando a geração de empregos porque os assentados vendem e compram produtos no município.

Histórico

Na madrugada de 17 de abril de 1996, mais de 3 mil famílias do MST ocuparam o latifúndio da Fazenda Giacomet-Marodim, em Rio Bonito do Iguaçú. Era o início de uma luta de dois anos de acampamento até se tornarem assentados. A desapropriação dos 26 mil hectares da fazenda aconteceu em 1998, quando 1.500 famílias foram assentadas.

Os dois assentamentos são divídidos em 27 comunidades, com centros comunitários e espaço de lazer. Antes das famílias Sem Terra ocuparam a fazenda Giacomet, o município de Rio Bonito do Iguaçú tinha quatro mil habitantes. Hoje possiu cerca de 20 mil.

Além dos assentamentos Ireno Alves e Marcos Freire, na mesma fazenda cerca de 1.100 famílias Sem Terra serão assentadas no Assentamento Celso Furtado, antiga fazenda Araupel, de 25 mil hectares. Ao todo serão quase 3 mil famílias assentadas no antigo latifúndio da Giacomet-Marodim.

Durante a festa, os participantes também puderam visitar uma exposição de fotos na Escola Rural Municipal Chico Mendes, na Comunidade Arapongas. A exposição conta a trajetória de luta dos trabalhadores e trabalhadoras dos assentamentos da região.