Despejo da maior ocupação vertical da América Latina é iminente

Rafael Sampaio
Agência Carta Maior

A maior ocupação vertical da América Latina está sob risco iminente de despejo. O edifício, localizado na avenida Prestes Maia, no centro de São Paulo, tem 22 andares e há dois anos abriga 468 famílias, que reúnem pouco mais de 2.000 pessoas.

A reintegração de posse, movida na Justiça pelo ex-candidato a vereador Jorge Hamuche (PHS), um dos proprietários do prédio, será executada até o dia 4 de março. “Em termos jurídicos não há mais nada a fazer”, lamenta o advogado dos sem-teto, Manoel Del Rio. Ele crê em somente uma solução para o problema: a intervenção política da prefeitura junto ao juiz que acompanha o caso.

Desde segunda-feira (5), 300 sem-teto montaram um acampamento diante do prédio da Prefeitura, e prometem sair apenas quando for apresentada uma solução para as famílias que habitam o prédio da Prestes Maia. O secretário municipal de Habitação, Orlando de Almeida Filho, não deu sinais de que receberá qualquer comissão dos acampados.

Ivonete Araújo, coordenadora do Movimento dos Sem-Teto do Centro (MSTC), reclama da omissão do poder público. “Faz dois anos que a prefeitura nos diz que não tem interesse em permitir que as famílias do Prestes Maia fiquem na rua. E agora eles deixam que o despejo aconteça, que todos nós sejamos jogados fora”, reclama.

Poucas saídas
Del Rio diz que o edifício está avaliado pela Caixa Econômica Federal em R$ 7 milhões, e que os proprietários – Jorge Hamuche e Eduardo Amorim – têm uma dívida de R$ 5,8 milhões acumulada com o município, devido ao não-pagamento de IPTU (Imposto Predial Territorial Urbano).

Em 2003, a gestão petista na Prefeitura, encabeçada por Marta Suplicy (PT-SP), se dispôs a pagar a diferença (R$ 1,2 milhão) para desapropriar o edifício. “Então se iniciou o processo de compra do prédio da ocupação”, lembra o advogado. Segundo o jornal Brasil de Fato, a Justiça exigiu que o valor da propriedade – R$ 7 milhões – fosse depositado integralmente pela prefeitura para que fosse feita a desapropriação. Como o poder público não pôde pagar, nada foi feito.

“A prefeitura não dá sinais de que intervirá a favor dos moradores do Prestes Maia. Gilberto Kassab entregou o caso para a Justiça”, reclama Del Rio. O MSTC entrou em contato com o Ministério das Cidades para pedir apoio político, mas o governo federal pode fazer pouco, neste caso. O advogado sugere que a Prefeitura poderia propor um projeto de lei na Câmara dos Vereadores para desapropriar o edifício, ou então retomar o acordo iniciado durante a gestão petista.

Osmar Silva Borges, coordenador da Frente de Luta por Moradia (FLM), informa que na quinta-feira (08) haverá uma reunião com o comando da Polícia Militar, para discutir sobre como será feita a reintegração. “A prefeitura tem que nos atender e dar um destino para as famílias”, diz ele. A FLM integra o acampamento erguido para pressionar o poder público a atender os moradores da ocupação Prestes Maia.

Carta dos moradores da ocupação Prestes Maia

“Olá, amigos!

Somos 1.630 seres humanos, 315 crianças, 380 adolescentes, 561 mulheres, 466 homens. Entre eles, gravidas e dezenas de idosos. São 468 famílias moradoras do prédio situado na AV: Preste Maia n:911 São Paulo Brasil. Fomos surpreendido pelo oficio de nº046/03/06 do 7ºBatalhão de Choque da Policia militar. Informa o comandante do batalhão, que obedecerá ordem judicial da 25ª vara cível de São Paulo, de nos colocar no olho da rua.

Estamos morando nesse imóvel há mais de 3 anos. O prédio estava abandonado há mais de 20 anos cheio de lixos, esgoto, ratos, baratas, mosca e de podridão que contaminava todo o entorno. Servia também como ponto de trafico de drogas. Os proprietários do edifício, Jorge Hamuche e Eduardo Amorim, que não possuem a escritura do imóvel, o abandonaram há duas décadas e devem quase cinco milhões de reais em IPTU aos cofres públicos.

Retiramos de lá mais de 200 caminhões de lixo e cerca de 1.500 metros cúbicos de esgoto de seu subsolo. Conferimos ao imóvel a função social que a constituição federal determina para todas as propriedades. O proprietário que o abandonou deve mais de 5.000.000,00 (cinco milhões de reais de imposto). É um sonegador.

Reza o artigo 1276 do código civil, parágrafo 2º: “PRESUMIR-SE-Á DE MODO ABSOLUTA A INTENÇÃO A QUE SE REFERE ESTE ARTIGO (abandonar) QUANDO, CESSADOS OS ATOS DE POSSE, DEIXAR O PROPRIETÁRIO DE SATISFAZER (pagar) OS ÔNUS FISCAIS”

Por isso não podemos concordar com a decisão do judiciário. Ninguém pode aceitar que o judiciário proteja um sonegador de impostos. Também não aceitamos a omissão da prefeitura frente à irresponsabilidade de um sonegador de imposto que procura a destruição de famílias, homens, mulheres, crianças e adolescente, apenas por serem pobres e sem-teto. Erra o judiciário quando pede à polícia que tire suas moradias à força, cidadãos trabalhadores indefesos. Ao judiciário não cabe incitar a violência policial. Estimula assim um ambiente desnecessário de confronto social. Nossa situação não é caso de policia, mas uma questão social. Cabe sim ao judiciário exigir que o Estado cumpra o que determina a Constituição Federal, ou seja: “Erradicar a pobreza e a marginalização”.

Lá não existem bandidos ou criminosos, mas pessoas que agem em busca de seus direitos consagrados em nosso ordenamento jurídico, o direito à moradia, artigo 6º da Constituição federal de 1988. Podemos resolver esta situação com diálogo, como gente civilizada.

Queremos o apoio de sociedade para uma solução justa e pacífica. Somos famílias pobres, não temos onde morar. Fora daqui, sem projeto dos poderes públicos, vamos morar na rua.

-Que esse imóvel seja transformado em moradia popular

-Que seja viabilizado o projeto de construção de 249 moradias popular

-Que o prefeito desaproprie ou decrete esse imóvel de interesse social

-Que as famílias sejam atendidas pelo programa Bolsa Aluguel da prefeitura enquanto o projeto estiver em andamento

-Que seja suspensa a liminar de reintegração de posse até que seja encontrada a solução definitiva

Assim, estaremos oferecendo a PAZ que necessitamos.”